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Corbo: 2º turno do Uruguai é confronto de modelos e resultados

Uma semana após o 1º turno das eleição uruguaias, Rony Corbo, membro do Comitê de Relações Internacionais da Frente Ampla, avalia que a segunda etapa da disputa será um confronto “de modelos e resultados”. Nesse embate, ele assegura que não há dúvidas da vitória de seu candidato, o ex-guerrilheiro José Mujica. Para Corbo, Mujica deverá aprofundar mudanças, mas deixando uma marca de compromisso com um país produtivo, a integração regional e com setores do campo e do movimento sindical.

Em entrevista por e-mail ao Vermelho, Corbo – que representa o Partido Comunista do Uruguai na coligação – avaliou que a conquista da maioria parlamentar e a ampla diferença de votos de Mujica em relação ao segundo colocado posicionam a coligação governista com excelentes perspectivas de vitória no segundo turno.

Destacando a consolidação da Frente Ampla como a principal força política do país, ele criticou o sistema eleitoral, no qual é perciso alcançar 50% mais um do total de votos não apenas válidos, mas incluindo os nulos e brancos.

Ele falou ainda sobre a aliança da “oposição neoliberal” para o segundo turno – que classificou como uma “troca de favores” -, o desempenho do Partido Comunista e a correlação de forças no parlamento e dentro da própria Frente Ampla. Corbo lamentou, ainda, o resultado dos plebiscitos, nos quais não se conseguiu anular a lei de anistia, nem aprovar o voto epistolar. Veja abaixo:

Como o senhor avalia os resultados das eleições uruguaias realizadas no domingo passado (25)?

Positivas, apesar de (a Frente Ampla, cujo candidato presidencial é José Mujica) não haver alcançado a vitória no primeiro turno. Conquistamos a maioria absoluta em ambas as câmaras, o que nos deixa com excelentes perspectivas para ganhar o segundo turno em 29 de novembro.

Aqui há um absurdo e irracional sistema de segundo turno, antidemocrático. Em outros países, se alcança a vitória com 40% dos votos válidos (como é o lógico), e/ou com uma vantagem de 10% sobre o segundo colocado. Aqui, se requer 50% mais um do total de votos emitidos, nos quais estão incluídos os votos em branco, o caudal dos observados, os nulos e outros mais. Devemos ir a um segundo turno ultrapassando o partido seguinte (blanco) por quase 20 pontos de diferença. É insólito.

Desejo destacar que a Frente Ampla (FA) se transformou na principal força política também no interior do país, além de confirmar com crescimento sua maioria absoluta em Montevidéu. Faz três eleições que a Frente Ampla se transformou na primeira força política do país.

Já foi assim na eleição de 1999, em que conquistou cerca de 40% dos votos, mas perdeu o segundo turno (que para isso foi inventado); em maio seguinte, a Frente Ampla novamente venceu a prefeitura de Montevidéu. Em 2004, a Frente venceu o primeiro turno com 50,45% de todos os votos emitidos, e, em maio seguinte, agregou a prefeitura de Montevidéu e outras sete do interior: Canelones, Salto, Paysandu, Flórida, Maldonado, Rocha e Treinta Três, um fato absolutamente inédito e prenhe de significado.

Agora, a Frente passou a ser a primeira força em 11 departamentos: Montevidéu e dez no interior. Isto dá uma perspectiva esperançosa para as próximas eleições municipais de maio.

O que significa a aliança entre blancos e colorados para o segundo turno?

O Partido Nacional teve uma péssima votação; a Frente o venceu por quase 20 pontos: 48,16% a 28,90%. Essa é a base para o segundo turno. Em Montevidéu, a Frente venceu por 56,31% a 21,69%; em Canelones (o segundo maior departamento), de 51% a 28%; e em todo o interior, excluindo Canelones, ganhou por 39,9% a 35,7 %.

Notemos que tanto em Montevidéu quanto em Canelones, fundamentais para o resultado eleitoral global, a Frente ganhou com a maioria absoluta dos votos. Isto se produziu com base em outro fato essencial: o Partido Nacional perdeu votos e percentuais em absolutamente todas os 19 departamentos.

A aliança com o Partido Colorado é razoável, já que os dois partidos representam a restauração do neoliberalismo no Uruguai, a direita. Há anos conformam uma coalizão; em 1999, o Partido Nacional deu a vitória ao presidente Jorge Batlle sobre Tabaré; agora, os colorados devolvem favores, porém, desta vez, a história será diferente. Como aconteceu com Lula nas últimas eleições, Pepe Mujica ganhará no segundo turno, não há dúvidas sobre isso.

Qual deve ser a estratégia para o segundo turno?

A estratégia continuará sendo a comparação de gestões da Frente Ampla com o governo de Luís Alberto Lacalle, amigo de Menem e Fernando Collor de Melo, que destruíram os nossos países aplicando receitas neoliberais. Será o confronto de modelos e resultados. Estamos mais que otimistas, o povo vai eleger o melhor.

Qual é o novo equilíbrio de forças no parlamento?

A Frente Ampla tem a maioria em ambas as câmaras – Senado e de Deputados – o que significa que o segundo governo da FA também contará com as maiorias parlamentares para as transformações de fundo que o país necessita para seguir aprofundando as mudanças iniciadas com Tabaré Vázquez.

E no que isso ajuda numa eleição de Mujica?

Sem dúvidas ajuda, será determinante, anda que a direita aposte em um “equilíbrio de governo”, uma tese absurda pela qual se defende que fortalece a democracia que uma força domine o Parlamento e outra o Executivo. Um verdadeiro absurdo. O fato é que não se pode governar o pais sem acordos com a Frente Ampla; o povo uruguaio assim decidiu.

E dentro da Frente Ampla como está a correlação de forças?

É uma correlação de forças que reflete a diversidade de nossa força política, que conta com uma coalizão de quase 30 organizações. Temos um programa comum que assegura a unidade de nossa bancada. O MPP (ex-Tupamaros) se mantém como a força mais importante. Em aliança com o Partido Comunista do Uruguai, forma uma bancada muito forte, de defesa dos interesses populares. Em síntese, há um saudável equilíbrio que garante a unidade da força política em sua ação de governo.

O que se espera de um governo de Mujica, em comparação com a gestão de Tabaré? O que deve diferenciar os dois?

Será um governo de aprofundamento das mudanças inciadas no primeiro governo; o programa comum de governo assegura esse aprofundamento. Pessoalmente, penso que a marca de Mujica também trará mudanças de fundo; na questão de compromisso com um país produtivo, com setores do campo, do movimento sindical.

Internacionalmente, o fortalecimento do Mercosul e uma maior diversificação do comércio internacional; aqui as mudanças serão mais relevantes. Formar um grande bloco de países da América Latina, avançando em nossa integração.

Há um forte compromisso com um país inteligente, democratizando o acesso ao ensino superior e universitário. No Uruguai, 85% das matrículas no ensino superior são públicas; a universidade é gratuita. Este governo deu 4,5% do PIB para a educação pública, e temos dque continuar avançando na proposta de um país inteligente, com qualidade, excelência. Nossa condição de país pequeno não nos deixa outra opção.

Qual foi o desempenho do Partido Comunista nas eleições?

O Partido Comunista do Uruguai obteve uma votação em torno de 7%. Nossos objetivos se cumpriram parcialmente. Temos, na lista 1001 Democracia Avançada, um senador e um deputado (Montevidéu), mais quatro deputados suplentes no interior do país.

A bancada eleita, se bem não reflete o que o PCU significa na política uruguaia, será decisiva. Para os comunistas, o plano da competição eleitoral não é fácil. Mesmo assim, nossa influência sobre o próximo governo da FA será maior que no presente, estou convencido.

Juntamente com as tarefas do governo, as nossas ações no movimento popular, na central única dos trabalhadores a qual conduzimos, PIT-CNT, no movimento estudantil e cooperativo, serão como no primeiro governo, de mobilização popular para apoiar as mudanças.

Em resumo, este continuará sendo um governo em disputa, entre o bloco democrático radical das mudanças e o bloco de poder, no nosso caso, com o socialismo como horizonte.

O que significa o resultado negativo dos plebiscitos?

No caso do plebiscito para anular a lei da caducidade, significa um derrota, em primeiro lugar, do movimento popular em geral, e de nosso partido em particular. De todas as maneiras, seguimos buscando a verdade e a justiça. Nossos mártires e desaparecidos nos conduzem nesse caminho. Se abre, na Justiça, um novo cenário de luta e, mais cedo ou mais tarde, os culpados pagarão por seus pecados, como já estão fazendo alguns.

No caso do plebiscito pelo voto epistolar, foi um assunto não compreendido pela população, uma verdadeira injustiça. De qualquer maneira, nós estivemos muito próximos. A história vai nos dar novas chances porque temos razão. Somos revolucionariamente otimistas com o nosso futuro e o dos demais povos do continente.

Da Redação,
Por Joana Rozowykwiat

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