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Como Israel ganhou mais uma vez a batalha dos assentamentos

Quando o Ministro das Relações Externas, David Miliband, proferiu algumas palavras sobre a ilegalidade dos assentamentos israelenses na Cisjordânia ocupada, muitos quiserem acreditar que Londres estaria a tomar uma dura atitude para com as contínuas violações do direito internacional por parte de Israel. Infelizmente, estavam errados.

Por Ramzy Baroud, para o blog Todos Por Gaza

O fato é que a declaração de Miliband, feita durante a conferência de imprensa que se seguiu às conversações com o rei da Jordânia, Abdullah II, em Amã, foram meramente táticas, dirigidas de forma a diminuir o impacto da fraca posição assumida por Washington sobre o mesmo assunto.

Isto foi o que Miliband disse: "Os assentamentos são ilegais do nosso ponto de vista, e um obstáculo ao estabelecimento da paz na Cisjordânia e em Jerusalém Oriental. Os assentamentos desafiam o coração de… um Estado palestino".

Mas depois, acrescentou: "É tão importante para aqueles que se interessam pela segurança e pela justiça social nesta região que as discussões sobre fronteiras e território recomecem de forma séria, porque se se conseguir fazer progressos sobre fronteiras e território, pode-se resolver o problema dos assentamentos".

Isto é clássico em Miliband. Embora as suas afirmações claras e decisivas acerca da ilegalidade dos assentamentos e o fato de estes constituírem um obstáculo à paz sejam bem-vindas, não é possível decifrar as declarações de um político por segmentos; para serem verdadeiramente apreciadas, têm de ser compreendidas como um todo.

O perigo reside na afirmação seguinte na qual ele mudou propositadamente a ordem da solução proposta para a crise do Oriente Médio para "discussões sobre fronteiras e território recomecem de forma séria", o que significa negociações sem condições, porque “o progresso” nessa vertente iria "resolver o problema dos assentamentos".

Mas não é precisamente este o tipo de diálogo em que Israel deseja tomar parte: conversações de paz sem condições, sem prazos, sem um fim determinado, enquanto persiste na construção de assentamentos ilegais em flagrante violação do direito internacional, sem esmorecer? Mais, não foi isto que os palestinos, todos os palestinos, rejeitaram veementemente?

A liderança palestina percebe que negociações incondicionais não trarão aos palestinos, a parte mais franca em qualquer negociação, nada a não ser mais humilhação, enquanto que a parte forte determinará a solução, qualquer solução, que achar adequada aos seus interesses. Tendo em conta que Israel não está sob uma pressão séria, apenas sob uns discursos verbais sobre o processo de paz proferidos ocasionalmente por Washington e Londres, o governo de direita de Benjamin Netanyahu não tem razão para parar ou até abrandar os seus projectos de assentamentos ilegais e a consequente limpeza étnica dos palestinos.

Miliband é um político esperto. Não obstante as suas palavras federem a contradições, estão dispostas de tal maneira que dão a impressão de que está a construir-se um mudança significativa nas políticas.

As declarações supostamente fortes de Miliband acerca dos assentamentos surgiram numa altura em que a política da administração Obama, uma pequena tentativa de se apresentar como a antítese do legado odiado de George Bush, está a desfazer-se.

Em maio, em seguida ao primeiro encontro entre Obama e Netanyahu, a secretária de Estado dos Estados Unidos, Hillary Clinton, não quis deixar dúvidas sobre as novas políticas americanas acerca dos assentamentos. Os EUA "querem que os assentamentos parem – não alguns assentamentos, nem postos avançados, nem exceções de crescimento natural".

Isto soa muito bem, melhor que as afirmações de Miliband. Mas, desde então, a administração Obama obviamente descobriu os limites da “audácia da esperança”: um lóbi israelense forte, unido; um governo de direita israelense decisivo; países árabes e muçulmanos fragmentados e tudo o resto.

Portanto, não foi uma surpresa ver a senhora Clinton, durante a sua recente visita ao Oriente Médio, retroceder em todas as promessas que o seu governo fez. Segundo o Times (de 1 de novembro), ela "alegou que a construção de assentamentos nunca foi uma pré-condição para retomar as conversações".

Pior, não apenas fracassou em convencer Netanyahu da posição dos EUA, que era mais ou menos consistente com o direito internacional, como elogiou-o por fracassar na concretização daquilo que foi considerado como uma forte exigência estadunidense.

A mudança aconteceu durante a sua visita de um dia a Jerusalém. "Aquilo que o primeiro-ministro [de Israel] tem oferecido em termos de restrições às políticas dos assentamentos… não tem precedentes", disse ela sobre a promessa de Netanyahu para abrandar a expansão de assentamentos na Cisjordânia.

Há mais de 500 mil colonos judeus na Cisjordânia e Jerusalém ocupados que vivem em vários assentamentos que são considerados ilegais de acordo com a 4ª Convenção de Genebra e numerosas resoluções das Nações Unidas.

Para acrescentar o insulto à injúria, a senhora Clinton continuou, em cada paragem, a exigir aos árabes e aos muçulmanos que estendam a sua mão e Israel. Que é que este fez para merecer uma normalização com os árabes e muçulmanos, mercados abertos e o estabelecimento de relações diplomáticas? Por que é que Israel deve ser compensado pelos seus massacres em Gaza, pela sua ocupação militar da Cisjordânia e Jerusalém Oriental, pelos contínuos ataques à Mesquita al-Aqsa e outras?

Simultaneamente, a Autoridade Palestina estará talvez a aperceber-se do erro que cometeu ao confiar que a determinação da administração Obama prevaleceria sobre a obstinação de Israel.

O alto representante da AP, Nablil Abu Rudienah, afirmou que "as negociações estão num estado de paralisia", culpando tanto "a intransigência israelense como o retrocesso americano".

"Não há esperança para futuras negociações", acrescentou Abu Rudienah.

Contudo, as palavras do chefe das negociações palestino, Saeb Erekat, na conferência de imprensa em Ramalá no dia 4 de novembro, foram ainda mais pessimistas. Talvez seja a altura de o presidente palestino Mahmud Abbas "dizer ao seu povo a verdade de que, devido à continuação da expansão dos assentamentos, a solução de dois Estados já não é uma opção", disse ele.

Ele disse o que muitos não querem ouvir, incluindo o próprio Miliband, que insiste em manter viva uma “solução” expirada, enquanto nada faz para a tornar realidade.

"É importante que não percamos de vista a importância da solução de dois Estados para todos os povos da região. Penso que as alternativas são escuras e mal-vindas por todas as partes", declarou Miliband.

Todavia, ele fracassou em demonstrar-nos como é que a sua solução “brilhante e bem-vinda” vai ser concretizada à medida que Israel continua a capturar Jerusalém e a Cisjordânia centímetro por centímetro e casa por casa, à vista dos meios de comunicação internacionais e com o conhecimento e com o acordo tácito dos políticos que regridem, incluindo a senhora Clinton e ele próprio.

Fonte: Informação Alternativa