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Krugman adverte para excesso de euforia com Brasil

A economia brasileira reagiu bem à crise e se encontra num momento favorável, mas é preciso tomar cuidado com o excesso de euforia em relação ao país, que tem levado a uma exagerada e preocupante valorização do câmbio, advertiu ontem o economista Paul Krugman, Nobel de Economia em 2008.

Por Sergio Lamucci, no jornal Valor Econômico

“O Brasil está indo bem, mas isso não quer dizer que vá se tornar uma superpotência econômica no ano que vem. Os mercados, porém, estão agindo como se isso fosse ocorrer.” O professor da Universidade de Princeton disse que o país ainda não conseguiu demonstrar que será realmente uma economia de crescimento elevado, alertando para os riscos de se tornar o “queridinho” dos investidores. Um deles é ter uma moeda que caminha para níveis extremamente apreciados, que não “fazem sentido”.

Krugman afirmou deter alguns investimentos em ativos brasileiros, mas que estava pensando em sair deles, não por antever uma crise, mas por causa do excesso de euforia dos mercados em relação ao país. O economista falou ontem à imprensa em São Paulo, onde fez a palestra de encerramento da ExpoManagement 2009.

Krugman lembrou de vários países que se transformaram nos preferidos dos investidores, receberam muito capital externo e depois enfrentaram crises gravíssimas. Citou o México, que quebrou em 1994, a Argentina, que deu calote em 2001, e países do Leste Europeu, incensados antes da crise e hoje amargando tempos difíceis. “A história sugere que você não deve querer ser a bola da vez.”

Krugman disse que, ao analisar a taxa de câmbio brasileira em relação a uma cesta de moedas, a divisa do país parece muito valorizada. Segundo ele, ela só está próxima dos níveis observados no começo de 2008, quando os preços das commodities, dos quais o Brasil é um grande exportador, estavam em patamares recordes. Hoje, com as cotações desses produtos bem mais baixas, não faria sentido um real tão apreciado.

Para Krugman, a trajetória do câmbio é um problema real, que deve ser enfrentado. Um dos instrumentos para isso é impor controles de capitais e taxas, que parecem não estar funcionando muito, mas podem ser adequados. Outra estratégia é intervir no mercado, acumulando ainda mais reservas, “mesmo que vocês não queiram isso”, disse Krugman. Para ele, embora seja difícil para autoridades como o presidente e o comandante do Banco Central criticarem o próprio país, talvez seja o momento de eles dizerem ao mercado: “Nós estamos melhores do que antes, mas não tão bem. Não nos amem demais”, brincou o Nobel, influente colunista do “New York Times”.

Para Krugman, o Brasil se saiu bem da crise por estar com um perfil financeiro muito melhor do que em turbulências anteriores, além de ser pouco dependente das exportações. Quando a crise eclodiu, o país tinha pouca dívida de curto prazo e em moeda estrangeira, os bancos estavam razoavelmente saudáveis e a inflação estava sob controle. O governo pôde então adotar políticas contracíclicas, reduzindo os juros e afrouxando a política fiscal. Isso fez com que o Brasil emergisse de uma crise global melhor que a maior parte do mundo, algo que Krugman disse nunca ter visto “em toda a sua vida profissional”.

“É uma história feliz”, segundo ele, que explica a atração que o país exerce sobre os capitais externos, num momento em que há investidores “desesperados” por retornos positivos, dado o nível baixíssimo dos juros nos países desenvolvidos.

Esse bom desempenho do país, porém, não justifica os níveis que o real vem alcançando, reiterou ele. “Os mercados estão perdendo o contato com a realidade.” A taxa de câmbio, segundo ele, está sendo empurrada para um território “sem precedentes”, que tende a afetar as exportações e pode prejudicar a própria recuperação da economia. Krugman alertou também para o risco de os fluxos exagerados de capitais estrangeiros alimentarem a formação de “bolhas domésticas”. Nos EUA, parte da bolha imobiliária se deveu às fortes entradas de recursos externos, lembrou ele.

Krugman também manifestou reservas em relação à possibilidade de o país manter déficits em conta corrente elevados, na casa de 4% a 4,5% do PIB, por vários anos, seguindo o modelo da Austrália. Para ele, é melhor ser cauteloso quanto a isso, mantendo rombos mais moderados nas transações comerciais, de serviços e rendas com o exterior, na casa de 2% a 3% do PIB. Alguns analistas acreditam que o país entrará na trajetória de déficit superiores a 4% do PIB nos próximos anos, dada a combinação de crescimento mais forte e câmbio valorizado.

Ao falar das perspectivas para a economia americana, Krugman traçou um quadro moderadamente pessimista. Para ele, o atual crescimento tem sido puxado pelos estímulos fiscais e pela reação ao fim do ajuste de estoques, fatores que perderão fôlego ao longo dos próximos meses. O problema é que não parecem existir outras forças capazes de substituir essas duas, já que não há sinais de recuperação da demanda privada. Embora tenha ressaltado não ser um especialista em previsões de curto prazo, Krugman considera possível uma expansão de 2% para o Produto Interno Bruto (PIB) dos EUA em 2010, um nível abaixo do crescimento potencial (aquele que não causa aceleração da inflação) e uma taxa de desemprego de 10% no fim de 2010.

Nesse cenário de expansão fraca da atividade no ano que vem, os juros devem continuar baixos por um longo período. Com isso, muitos investidores continuarão “desesperados” por retornos mais atraentes, como os oferecidos por ativos brasileiros, o que torna mais elevado o risco de uma bolha brasileira, afirmou Krugman.