Entrevista com Luciano Siqueira

A atuação na Câmara do Recife, o mandato de vereador, a política local e os novos rumos do PCdoB a partir do 12º Congresso Nacional são alguns dos temas abordados pelo vereador Luciano Siqueira nessa entrevista. A conversa, que será publicada em duas partes, abre a série de entrevistas com parlamentares, dirigentes partidários, líderes sindicais, representantes de movimentos sociais e intelectuais a ser publicada nesse espaço a partir de janeiro de 2010.

luciano siqueira

Qual a avaliação que o senhor faz de seu primeiro ano de mandato como vereador do Recife?

LUCIANO SIQUEIRA – Nós fazemos um balanço muito positivo, porque os objetivos a que nos propusemos, no fundamental, foram alcançados. Ou seja, nós nos empenhamos, em primeiro lugar, em cumprir os compromissos assumidos perante a população da cidade. Que compromissos? O compromisso de lutar efetivamente por uma cidade mais humana, ferindo alguns problemas emergentes ou de natureza estratégica para a vida da cidade, com base na orientação construída no próprio curso da campanha, que denominamos de eixos temáticos. Isso foi possível não apenas através dos pronunciamentos e dos debates no plenário da Câmara Municipal, mas, sobretudo, por meio das audiências públicas promovidas pela Comissão de Desenvolvimento Econômico, da qual sou presidente, do diálogo constante com instituições vivas da sociedade, no esforço de mediar pleitos coletivos junto ao Poder Executivo Municipal e mesmo, em certa medida, por meio dos nossos artigos semanais.

Esse esforço resultou não apenas em trazer à luz o debate de questões candentes, mas também em consequências práticas. Nossa atividade em relação ao centenário de Burle Marx resultou em um projeto de lei já sancionado pelo prefeito João da Costa instituindo a Semana Burle Marx, a ser realizada anualmente como forma de mobilizar a sociedade em prol da valorização dos nossos parques e jardins. Uma iniciativa que deve ter como desdobramento a criação de um movimento permanente em defesa do verde e dos parques e jardins públicos do Recife, envolvendo crianças e adolescentes.

Esse movimento nós estamos construindo pacientemente junto a escolas, igrejas, para que possa surgir o ano que vem como manifestação coletiva e plural e não propriamente como uma iniciativa do mandato, da Câmara Municipal ou da Prefeitura do Recife, para que, dessa forma, possa ter efetivamente uma dimensão ampla, consistente, e seja algo duradouro. Outro exemplo dos desdobramentos práticos da nossa ação parlamentar é a aprovação da chamada lei do livro e da leitura, que está para ser sancionada pelo prefeito João da Costa.

A discussão que abrimos na Comissão de Desenvolvimento Econômico em torno da política fiscal da Prefeitura do Recife como instrumento de indução das atividades econômicas no território da cidade é outro exemplo do exercício efetivo do nosso compromisso com a cidade.

O debate sobre o tema ajudou a sensibilizar a Câmara Municipal do Recife para uma iniciativa nossa de atender pleito dos laboratórios de análises clínicas, um importante segmento da economia local, que haviam firmado acordo com a gestão do prefeito João Paulo no sentido de flexibilização da alíquota do ISS, bem como a negociação mutuamente proveitosa em relação a passivo tributário, que estava impedida de prosperar por causa de uma imprecisão da lei que deu base ao acordo, havendo resistência da Câmara em mudar essa lei.

A audiência pública sobre o assunto ajudou a aprovar no plenário da Câmara, por unanimidade, a nova redação de um dos artigos da lei, alteração essa proposta pelo prefeito João da Costa, uma vez que, por se tratar de matéria tributária, embora articulada pelo vereador a iniciativa da proposição cabe ao Poder Executivo. A nova redação tornou absolutamente claro o artigo que gerava dúvida na esfera da Procuradoria de Execuções Fiscais da cidade e imobilizava o uso do mecanismo constituído pela lei.

A audiência pública de iniciativa nossa sobre mobilidade urbana, uma das questões centrais da vida da cidade, quando tivemos a oportunidade de debater a revisão da chamada lei das calçadas, também teve conseqüência imediata: o grupo constituído meses antes pelo prefeito João da Costa para tratar do assunto, que vinha carecendo de dinamismo, a partir dessa provocação avançou no seu trabalho, inclusive com a participação da arquiteta Márcia Branco, uma de nossas assessoras, que foi convidada e passou a integrar o grupo.
Dessa forma, do ponto de vista da ação parlamentar mais focada nos problemas da cidade, o balanço que nós fazemos desse primeiro ano de mandato é positivo.

Que contribuição sua experiência como vice-prefeito do Recife durante oito anos trouxe para o exercício do mandato de vereador?

LS – Certamente ajuda muito. Em que dimensão ainda não está muito claro, mas, como fui um vice-prefeito útil, a quem o prefeito recorria para dividir muitos dos problemas da gestão, seja na relação com a sociedade, seja internamente para construir soluções para a ação de governo em torno de problemas importantes, que exigiam pactos no próprio interior do governo, de articular áreas diferentes, além do fato de ter assumido vinte e tantas vezes, por períodos curtos, porém ativos, a chefia do governo, é evidente que isso ajuda muito a ação parlamentar.

Principalmente na hora de debater os problemas da cidade em plenário ou nas audiências públicas. Isso porque, frequentemente representantes da sociedade civil apresentam suas inquietações, suas queixas, suas reivindicações, que são legítimas e em geral justas, mas desconectadas da realidade concreta da gestão pública, de seus limites e possibilidades. Muitas vezes as pessoas se queixam ou reivindicam soluções que são ideais, mas que não são possíveis nas condições concretas do Recife. Isso ocorre, inclusive, nos pronunciamentos de alguns vereadores.

Talvez a melhor contribuição da experiência de oito anos como vice-prefeito para o meu mandato de vereador seja no olhar sobre a cidade. No governo, eu aprendi a olhar os problemas da cidade com uma visão de conjunto, com uma visão holística da cidade, a semelhança do bom médico diante do paciente, que sempre se recusará a tratar um incômodo no aparelho digestivo sem ver o todo. Eu acho que isso ajuda muito e contribui até para a compreensão mais serena, mais realista, dos problemas da cidade e suas soluções.

Apesar das adversidades as gestões de João Paulo e Luciano Siqueira colecionaram uma série de êxitos. Como o senhor avalia o primeiro ano da gestão de João da Costa. Ela mantém a cidade no mesmo ritmo e o resultado pode ser considerado exitoso?

LS – Eu creio que sim. É notório que os seis primeiros meses da gestão do prefeito João da Costa foram, de certa maneira, atribulados, porque veio à tona com muita força a chamada “crise do recolhimento do lixo”, da limpeza da cidade, fruto de contradições de ordem técnica e jurídica, a propósito da renovação temporária do contrato de prestação de serviços e do próprio edital destinado a nova licitação. Isso foi uma marca importante.

Mas, o balanço é positivo, considerando que é um governo novo, que embora guarde uma identidade política com o governo anterior é constituído por uma equipe majoritariamente nova, e – isso eu aprendi também na prefeitura – que todo governo, independentemente da vontade do governante conhece basicamente três tempos: o primeiro de implantação, que dura em média oito meses; o segundo, que dura cerca de um ano, um ano e meio, de consolidação do governo, no qual são constituídas as equipes e onde ocorre a formatação e maturação de projetos, programas e iniciativas; e o terceiro tempo, que acontece no último ano e meio de governo, onde começam a aparecer os resultados mais consistentes das ações.

Assim sendo, quatro anos é um tempo curto para se governar uma cidade, um Estado ou um país?

LS – Eu creio que sim e uma das razões é essa que acabei de citar: os tempos de governo. A outra razão é a fragilidade das instituições estatais brasileiras. Ao contrário de Estados modernos, porém já consolidados ao longo de séculos, como os Estados europeus, por exemplo, em que existe a carreira do funcionário público, onde a mudança de governo mudam apenas as equipes de comando e uma nesga de assessores, mantendo-se a massa de técnicos de carreira, que por ser permanente dá certa estabilidade ao governo, tendo em vista a continuidade das ações que estavam em curso, o que não acontece no Brasil.

O que é que nós temos no Brasil em nossas prefeituras, por exemplo? Uma massa de funcionários que até a Constituição de 1988 ingressou no serviço público por indicação política – só a partir da Constituição de 1988 é que surgiu a obrigatoriedade do concurso público -, mal remunerada, uma boa parte desajustada em relação às tarefas que tem a cumprir, que, em geral, não são submetidos a treinamento ou reciclagem, sem perspectiva de ascensão funcional, se mostrando, portanto, desmotivados. Não estou com isso generalizando, nem expondo juízo de valor negativo sobre o funcionalismo público municipal, mas essa é a realidade.

Então, por isso, o governante quando assume tem a necessidade de incluir os chamados cargos comissionados para compor as equipes que vão conduzir a gestão, no pressuposto de que poderá contar com um corpo de técnicos e de gestores presumivelmente motivados e politicamente orientados no sentido de dar dinamismo à gestão pública.

Assim sendo, desse ponto de vista, quatro anos é um tempo curto, com uma agravante: a cada dois anos tem eleições no Brasil. No caso do Recife isso significa que, embora o prefeito João da Costa não dispute eleições em 2010, pois as eleições são gerais excluindo as eleições municipais, no ano que vem a gestão dele será duramente cobrada. É como se existisse uma cobrança antecipada pelo fato eleitoral que se soma a uma expectativa espontânea da população imediatista, de esperar resultados consistentes e importantes em um curto prazo.

Entretanto, apesar das atribulações dos seis primeiros meses, percebo que o governo do prefeito João da Costa vai ganhando corpo, produzindo resultados, dá continuidade, agora em um novo patamar, a projetos importantes iniciados na gestão anterior, como o Capibaribe Melhor, por exemplo, tem viabilizado financiamentos para intervenções muito importantes na cidade, algumas delas destinadas à redução do déficit habitacional e melhoria das condições de habitabilidade de populações sujeitas a condições de vida precárias. Então, o balanço do governo João da Costa é positivo.

Fonte: Site do Vereador Luciano Siqueira