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Eduardo Guimarães: Depois de Honduras

É incrível como certos fatos vão se transformando naquilo que parecia que poderiam se transformar. Uma grave ameaça paira sobre as Américas e seus autores são os mesmos setores exíguos dessas sociedades que sempre se beneficiaram da fantástica concentração de renda por aqui vigente.

Por Eduardo Guimarães, em Cidadania.com

Refiro-me a setores aos quais parte das Forças Armadas de vários países da América Latina se submete. Nesses países, foram implantadas ditaduras militares durante o século passado e estes militares até hoje mantêm uma postura de mera “tolerância” a governos com os quais não se alinham ideologicamente.

Não é o caso de países como Equador, Bolívia, Colômbia ou Venezuela, nos quais, à diferença de Argentina, Brasil, Chile, Paraguai, Peru e Uruguai, as forças armadas são legalistas – ou, ao menos, foram durante a década que se encerra.

O levante recente das mesmas forças políticas que se engajaram no golpe de 1964 (empresariado, imprensa e militares) ao atacarem quem deseja que o país repare moralmente (sem punições e outras penalidades) os crimes da ditadura, coaduna-se com outros eventos recentes em outros países da região em que os militares continuam a ser um problema.

Hoje (11), o jornal O Estado de São Paulo reproduz denúncia do ex-presidente argentino Néstor Kirchner de que há uma conspiração em seu país para derrubar a presidente Cristina De Kirchner.

Voltemos um pouco no tempo, até o auge da crise hondurenha e das análises de Globos, Folhas, Vejas e Estadões sobre o golpe militar naquele país, justificando-o e pregando sua aceitação. Depois, o encolhimento de Barack Obama diante da grita conservadora, nos EUA, pró-golpe em Honduras.

No Paraguai está acontecendo a mesma coisa. Estão pregando abertamente a derrubada do presidente Fernando Lugo com ações semelhantes às empreendidas por Honduras contra Manuel Zelaya recentemente, e defendendo medidas econômicas como as tomadas por FHC (Brasil), Alberto Fujimori (Peru) e Carlos Menem (Argentina) no fim do século XX.

A explicação para a grande grita internacional – e, sobretudo, do presidente Lula – diante do golpe militar em Honduras, vai ganhando contornos cada vez mais nítidos. Junte-se a essa grita as medidas de rearmamento na região, com destaque para Venezuela, Colômbia e Brasil, e se tem a equação montada.

Acredito que, intimamente, todos sabíamos que, depois de Honduras, se não se conseguisse penalizar aquele golpe de Estado ele poderia se converter apenas no primeiro de uma série de outros que começariam a ser tentados nos anos seguintes nesta parte do mundo.

Penso, contudo, que ainda é tempo de se tomar atitudes mais contundentes na defesa intransigente da democracia nas Américas – e falo em Américas e não em América Latina, pois esse processo que vislumbro não pouparia nem a Barack Obama.

Mas se alguém quiser agir, se a Unasul quiser se reunir com urgência e convocar o Conselho de Segurança do Cone Sul – ou seja lá como forem chamá-lo – , acho que a hora é já, pois as sombras do passado se levantam sobre as três Américas.