Messias Pontes – Mais uma inaceitável inversão de valores

A inversão de valores, no Brasil, deixou de ser exceção e virou regra. A sociedade assiste estupefata a perseguição àqueles que simplesmente cumprem com o seu dever. A defesa de bandidos de colarinho branco está extrapolando os limites da ficção. Pior, os que buscam a verdade e a justiça são ferozmente perseguidos, desqualificados, ameaçados e até punidos.

As forças do atraso e sua mídia conservadora, venal e golpista fabricam crises incessantemente porque não se conformam em perder uma nesga sequer dos seculares privilégios. Para tanto encetam campanhas contra quem se põe no seu caminho. Quando é conveniente, atacam violentamente o parlamento, colocando no mesmo saco os bons e os maus políticos. O Executivo, quando olha com bons olhos para os excluídos é bombardeado com violência irracional como aconteceu em 1964.

Mas nunca se viu fazer o mesmo com o Poder Judiciário. A indústria de liminares é intocável, a venda de sentenças é denunciada até mesmo por magistrados, mas não se vê os (ir)responsáveis na cadeia ou mesmo perdendo o cargo. Quando muito, são aposentados proporcionalmente. Isto tem sido regra no Brasil, notadamente nos últimos anos.

O que está sendo feito com o juiz Fausto De Sanctis, da 6ª Vara Criminal Federal de São Paulo, é inaceitável, é irracional, é um crime. Tudo porque ele, corajosamente, tem cumprido à risca com o seu dever de magistrado. Seu “erro” é insistir em botar na cadeia bandidos de colarinho branco, gente poderosa como o banqueiro Daniel Dantas, do Opportunity, e os diretores da construtora Camargo Corrêa, flagrados com a mão na massa da corrupção, da lavagem de dinheiro e evasão de divisas.

A ira do presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Gilmar Mendes (ou Gilmar Dantas, conforme o jornalista Ricardo Noblat), tornou-se patológica. Ele não se conforma com a decisão de De Sanctis de mandar duas vezes para a cadeia o seu protegido Daniel Dantas. Contra o dono do Opportunity não existem só evidências, mas provas concretas de banditismo, contudo com a proteção do Supremo ele continua lépido e fagueiro aprontando as suas.

A mesma ira o ministro nutre com relação ao também correto delegado federal Protógenes Queiroz, comandante da Operação Satiagraha, responsável por desvendar a bandidagem de Daniel Dantas. Protógenes Queiroz e o delegado Paulo Lacerda, ex-diretor-geral da Abin foram afastados dos seus cargos, punidos por cumprir o dever. Tudo com a conivência do quinta-coluna Nelson Jobim, ministro emplumado da Defesa.

Sem medo de errar, pode-se dizer que o banqueiro Daniel Dantas é o homem mais poderoso deste País. Graças aos tribunais superiores ele é intocável. O absurdo jurídico chegou a tal ponto que o ministro Eros Graus, do STF, requisitou todas as provas da Operação Satiagraha e trancou-as em uma sala.

Agora, noutra inversão de valores, o presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), César Asfor Rocha, decide suspender todas as ações do juiz Fausto De Sanctis. E o que é pior, sem ao menos observar o processo, conforme denunciou a procuradora regional da República Janice Ascari. “É uma decisão que caminha para as raias do absurdo. O ministro (Asfor) não avaliou certas peças processuais. Se tivesse, teria constatado que a intercepção telefônica solicitada não foi baseada numa denúncia anônima. Já havia a delação premiada e outros elementos de investigação…” Simplesmente lamentável.

As pseudo-crises não surtiram o efeito desejado. Contudo outras serão fabricadas com o objetivo de desgastar o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Pelo que já disse o jurista Dalmo de Abreu Dallari, o presidente da Suprema Corte brasileira é capaz de tudo, sem a menos cerimônia, para satisfazer o Coisa Ruim que o indicou para o STF. Ele está lá para agradar o Coisa Ruim e o baronato da mídia.

A farsa do grampo telefônico envolvendo Gilmar Mendes e o senador Demóstenes Torres, do Demo de Goiás, cujo áudio nunca apareceu, é fichinha diante do que virá até outubro próximo. A última do presidente do STF foi suspender a demarcação de mais de 90% da reserva indígena Arroio-Korá, em Mato Grosso do Sul, e 5% da reserva indígena Anaro, em Roraima. Gilmar Mendes simplesmente atendeu o pedido dos que se dizem proprietários da terra.

Tudo isso faz parte da investida da direita na América Latina de mudar a correlação de forças na região. Se não for dado um chega pra lá nos tribunais superiores, enquadrando-os nos limites da sua competência, a democracia corre sérios perigos. Não é sem razão que o bandido banqueiro Daniel Dantas afirmou que o problema dele eram os juízes de primeira instância, porque nos tribunais superiores ele resolvia.

E é o que está acontecendo, vergonhosamente. Simplesmente lamentável!

Messias Pontes é jornalista e colaborador do Vermelho/CE

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