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PIB versus Selic: Debate começa a pegar fogo

Guido mantega, Paulo Bernardo e o setor industrial traçam perfil otimista para a economia em 2010. Mas há a ameaça do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) de iniciar um novo ciclo de alta da taxa básica de juros, a selic, que deve incendiar o debate econômico.

O ministro da Fazenda, Guido Mantega, disse que estão sendo desativados os estímulos fiscais, como as reduções de Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) concedidas a produtos de linha branca de eletrodomésticos, que terminam neste fim de semana, e ao setor automobilístico, que vai até o fim de março. "Nós não achamos que a economia precisa mais da ajuda do Estado", afirmou o ministro.

Ele citou números da economia para defender a ideia de que o país está na rota de uma "retomada gradual" e de um "crescimento sustentável". A indústria, que se retraiu cerca de 20% no primeiro trimestre, se recuperou ao longo de 2009 e deve encerrar o ano com queda de 5% e capacidade ociosa. "Em 2010 certamente crescerá, por conta da base deprimida", acrescentou. Apesar do dinamismo econômico, Mantega diz que não há razão para crer em uma "bolha" de crescimento. "Esses são prognósticos que eu chamaria de apressados", disse. "O País está recuperando o que perdeu", completou.

O ministro disse também que não espera nenhuma volatilidade econômica neste ano por ocasião das eleições de outubro. "Eu não espero nenhuma volatilidade no Brasil, porque o Brasil está muito sólido e deverá seguir na trilha que já foi aberta", destacou."Seria irracional de algum governo jogar fora aquilo em que avançamos, as conquistas que obtivemos e uma estratégia vencedora", afirmou. Ele disse que está "pagando para ver" algum dos principais pré-candidatos que hoje se oferecem para o eleitorado propor mudanças profundas no rumo da economia.

"Eu quero ver quem é o candidato que vai mudar, que vai dizer, 'vou acabar com o Bolsa Família, baixar o salário mínimo, para de estimular o investimento, deixar de estimular a indústria naval, construção civil, desativar o Minha Casa, Minha Vida'. Eu acho muito temerário. Eu duvido, faço uma aposta com vocês. Tô pagando pra ver.Você só explora a questão econômica quando está dando errado. Mas quando o resultado é bom, quando a discussão é se o crescimento vai ser 6% ou 6% (embora o ministro diga que, pessoalmente, acredite em uma alta do PIB de 5% a 5,5% em 2010), o que é que você vai criticar?"

Políticas eficientes

Para Mantega, a crise "comprovou que as políticas econômicas brasileiras eram eficientes". O ministro citou uma melhora nas projeções do FMI para o crescimento mundial (crescimento de 3,9% neste ano), puxado pelas economias emergentes mais dinâmicas, como a Índia, a China e o Brasil. Em uma prévia da compilação de dados que entregaria aos líderes empresariais em Davos, Mantega citou uma série de estatísticas das contas do governo para mostrar a saúde do Estado pós-crise.

Disse que, nos EUA, o déficit público será de 9% do PIB. No Brasil, comparou, o déficit público nominal, de 3,3%, "vai voltar a cair no próximo ano". "Não é um dos maiores, e com a economia voltando a crescer, a relação dívida-PIB volta a cair. Então nós estamos em uma situação fiscal melhor."

Comparados com países que precisaram gastar bilhões para salvar seus bancos, o Brasil sai do pior em melhor estado, porque, na opinião de Mantega, "a intervenção do Estado foi mais precisa e menos dispendiosa". O Ministério anunciou nesta semana que o superávit primário de 2009 foi 2,5% e a previsão é de que o excedente chegue a 3,3% em 2010.

Além disso, o ministro citou números da economia para defender a ideia de que o país está na rota de uma "retomada gradual" e de um "crescimento sustentável". A indústria, que se retraiu cerca de 20% no primeiro trimestre do ano, se recuperou ao longo de 2009 e deve encerrar o ano com queda de 5% e capacidade ociosa, ele disse. "Em 2010 certamente crescerá, por conta da base deprimida", acrescentou.

Controle dos bancos

Ele afirmou ainda que "emprego não será um problema". "Criamos um milhão de empregos em um ano de crise. Em 2010 criaremos mais que isso (a previsão do governo é 1,6 milhão). Em alguns setores há escassez de mão-de-obra, como na construção civil."
O ministro disse que, com a retomada, os estímulos fiscais estão sendo desativados, a exemplo das isenções concedidas a produtos de linha branca de eletrodomésticos (que terminam neste fim de semana) e ao setor automobilístico (cujo prazo vai até o fim de março).

"Nós não achamos que a economia precisa mais da ajuda do Estado. Cabendo ressaltar que nós só chegamos aqui com a ajuda do Estado", afirmou o ministro. Apesar do dinamismo econômico, Mantega diz que não há razão para crer em uma "bolha" de crescimento. "Esses são prognósticos que eu chamaria de apressados", disse. "Peraí, o País está recuperando o que perdeu."

Outro assunto abordado por Mantega foi o controle dos bancos. Segundo ele, "ainda há condições políticas" de impor controles mundiais para frear as atividades financeiras de alto risco e reduzir a vulnerabilidade do sistema econômico."Eles (os bancos) não gostam disso, é claro que cada um quer fazer o que bem entende. Mas ficou provado que assim não funciona. O setor financeiro, por sua natureza, precisa ser regulamentado", disse.

O tema está suscitando uma divisão em meio aos participantes do Fórum, entre os que apóiam planos de impor restrições aos bancos — incluindo o pacote recém-anunciado pelo presidente dos Estados Unidos, Barack Obama — e os que acham que uma maior regulação poderia interromper a já lenta recuperação econômica.

Bolhas menores

Para o ministro brasileiro, a melhora na economia global pode reduzir o "empenho" por reformas no sistema, mas o tempo para essa tarefa ainda não foi perdido."O ferro se malha enquanto está quente. Se esfria, fica mais dificil. Quente é quando todo mundo está desesperado, e daí fica todo mundo mais ousado. Quando as coisas se normalizam, o pessoal perde um pouco o empenho", afirmou.

"Mas se você olha para Europa e os Estados Unidos, não se pode dizer que as coisas estão mais satifatórias. Pode estar melhor para os bancos, mas não para o resto da população, o que causa conflitos políticos." "Então ainda existem condições políticas para impor ao sistema financeiro condições de maior regulação", completou.

Mantega concordou com o raciocínio do megainvestidor George Soros, para quem a mais recente crise econômica foi a culminação de "bolhas menores", causadas por 25 anos de crédito demasiadamente fácil e negócios arriscados. "Com amenização da crise, houve uma recomposição dos capitais dos bancos e eles voltaram a operar. Mas voltaram aos velhos hábitos e operações, inclusive de risco, olhando sobretudo os lucros e bonus, e olhando menos a reativação da economia com créditos", disse.

"Tanto que o crédito continua escasso, tanto para setor privado e consumidores no mundo. Falta crédito, mas os bancos voltaram a ter lucros e distribuir bônus extraordinários."
Brasil Porém o ministro fez questão de dizer que "esta situação não vale para o Brasil". Se o crédito no país crescia a um ritmo de 32% ao ano em 2008 — "e eu dizia na época que era demais", afirma Mantega, esse ano deve crescer por volta de 20%, patamar que o ministro considera apropriado.

Volume de capital

"No ano passado, cresceu uns 14%, o que foi pouco", disse Mantega. "Agora está muito equilibrado, muito tranquilo, o processo brasileiro", avaliou. No mercado financeiro, que já tocou os patamares do início da crise e voltou a cair, o ministro também não vê possibilidade de uma bolha. "No Brasil, nós acabamos com a festa quando colocamos o IOF (Imposto sobre Operações Financeiras, que taxou em 2% o capital externo na bolsa). Isto segurou a enxurrada. Essa enxurrada de capital não houve."

Para Mantega, colocar em prática mecanismos de controle de risco passam por limitar o volume de capital para operações deste tipo, impor um teto de alavancagem e aumantar controle sobre fundos de hedge e derivativos. "Isso já se faz no Brasil. Apertamos o cerco. Falta fazer no exterior, onde não podemos controlar. Mas temos de regulamentar."

A polêmmica sobre os incentivos fiscais também mereceu comnentários do ministro do Planejamento, Paulo Bernardo. Segundo ele, o governo avaliará a redução de IPI), mas na opinião dele, as desonerações podem ser revogadas."Se houver alguma coisa comprovando que é necessário manter, certamente o governo vai ter sensibilidade. Eu, particularmente, acho que não precisa", disse o ministro. "Em princípio, acho que não (precisa). A economia está boa, as vendas estão boas."

Razão a Bernardo

Alguns dados dão razão a Bernardo. A pesquisa semestral divulgada ontem, no Rio de janeiro, pela Associação Brasileira das Companhias Abertas (Abrasca) revela que o empresariado está otimista em relação ao desempenho da economia nacional em 2010. Nenhuma companhia trabalha com a perspectiva de desaceleração do Produto Interno Bruto (PIB), que é a soma das riquezas produzidas no país.

Cerca de 69,7% das empresas consultadas apostam que haverá um crescimento do PIB nos seis primeiros meses do ano. A expectativa é de aumento de 5% do PIB em 2010. A pesquisa apurou que 75,76% dos entrevistados preveem que o número de empregos será maior no primeiro semestre de 2010, em comparação ao último semestre do ano passado.

O nível de emprego não será menor para nenhuma empresa consultada, diz a sondagem. “É uma coisa impressionante porque nenhuma empresa acusou redução do nível de empregos, do volume de vendas ou viu possibilidade de queda do crescimento do PIB”, afirmou o presidente da Abrasca, Antonio Castro. Quase 70% das companhias abertas planejam aumentar seus investimentos este ano, contra apenas 4% no início de 2009. “O retrato de um ano atrás era de certa forma caótico”, analisou Castro.

Ele disse que o otimismo pode estar ligado a política monetária bem sucedida do governo para o enfrentamento da crise financeira internacional. “O Brasil reagiu muito bem à crise. E sem dúvida, a administração do Banco Central foi muito hábil em termos de disponibilização de crédito, entre outros fatores. A política monetária pesou muito, não há a menor dúvida com relação a isso”, externou.

A demanda doméstica, que deverá crescer para 84,85% das companhias, gera ainda uma expectativa favorável para as vendas neste início de ano: 81,8% das empresas entrevistadas esperam volume maior de vendas no primeiro semestre deste ano em relação ao semestre anterior.

A ameça do Copom

O otimismo contrasta com a política monetária ditada pelo Banco Central (BC). O diretor do Departamento de Pesquisas e Estudos Econômicos da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Paulo Francini, advertiu que uma nova escalada da taxa básica de juros (Selic) este ano será "muito danosa para a recuperação em curso da atividade industrial brasileira" e para a formação bruta de capital fixo (FBCF), leia-se, investimentos.

Segundo ele, não há nenhuma evidência de que o Comitê de Política Monetária (Copom) do BC precise elevar os juros no curto e médio prazos, especialmente porque os índices de inflação estão bem comportados, o nível de utilização da capacidade instalada das indústrias apresenta folga e não há nenhum choque externo ou interno de oferta e demanda que requeira forte desaceleração do nível de atividade nos próximos meses.

"Não há riscos que possam elevar os índices de preços. Um ciclo de aumento de juros na atual conjuntura pode provocar um aborto do processo de expansão dos investimentos. Um aborto só ocorre quando há risco de saúde. Ninguém o faz apenas com medo de que algo ocorra (no futuro)."

Francini disse que os empresários em geral são como animais cujo espírito empreendedor é movido pela evolução da demanda do crescimento do país. A afirmação foi uma alusão ao economista John Maynard Keynes, que cunhou a expressão "espírito animal".

Para Keynes, os empresários não investem apenas pela perspectiva de lucro e avanço do consumo dos produtos que fabricam, mas também pela expectativa favorável de que o mercado venha a se tornar alvissareiro. Com isso, investe para maximizar suas vendas e lucros alguns meses adiante. "Fazemos parte de um tipo de matilha que conhece muito mais de investimento do que o outro lado, que está interessado por obter alta rentabilidade com juros elevados", observa Francini.

Economia mundial

A Fiesp estima que o superávit da balança comercial deve cair 78,4% em 2010, para a marca de US$ 5,5 bilhões, ante US$ 25,4 bilhões, em 2009. De acordo com a Fiesp, as exportações devem subir de US$ 153 bilhões para US$ 177,8 bilhões este ano. Contudo, a recuperação do nível de atividade, que deve gerar evolução do PIB, contra queda de 0,4%, em 2009, para alta de 6% em 2010, levará a uma retomada veloz das importações, pois a entidade estima que elas subirão de US$ 127,6 bilhões em 2009 para US$ 172,3 bilhões neste ano, contra US$ 173 bilhões registrados, em 2008.

O saldo projetado para 2010 considera um câmbio médio de R$ 1,75. Na avaliação do diretor do Departamento de Pesquisas e Estudos Econômicos da Fiesp, Paulo Francini, é possível que a redução da apreciação do câmbio ocorrida nas últimas semanas melhore o saldo comercial este ano: "Porém, é muito incerto prever a cotação do real ante o dólar para os próximos dois meses", ressalvou.

Outro fator que não deve incrementar de forma expressiva as exportações é a modesta recuperação da economia mundial: "O nível de atividade industrial do Estado foi afetado em boa parte, porque a crise abalou o mundo e isso reduziu as nossas importações, sobretudo de manufaturados", afirmou Francini.

Emprego na indústria

A Sondagem Industrial da Confederação Nacional da Indústria (CNI) mostra que o nível de capacidade ociosa do setor subiu de 56,6 pontos, no terceiro trimestre, para 58,1 pontos no quarto trimestre. A pesquisa usa uma escala de 0 a 100, na qual valores superiores a 50 indicam crescimento. A pesquisa mostrou ainda que, no quarto trimestre de 2009, a indústria brasileira operava, em média, a 77% de sua capacidade instalada ante os 73% do trimestre anterior.

Apesar da evolução, a CNI ressalta, no entanto, que o índice ainda não alcançou os 80% do quarto trimestre de 2007. Segundo a Sondagem, o índice que mede a expectativa para a demanda evoluiu de 59,9 pontos no terceiro trimestre de 2009, para 62,9 pontos no último trimestre do ano passado.

A expectativa para exportações subiu de 45,4 pontos no terceiro trimestre, para 47,8 pontos no quarto trimestre. Apesar da evolução, o índice continua abaixo dos 50 pontos. Ou seja, ainda não atingiu patamar que indique crescimento. Já o índice que mede o emprego na indústria subiu de 53,6 pontos no terceiro trimestre, para 55,1 no quarto trimestre de 2009. O indicador que mede a expectativa de compra de matérias-primas, foi de 57,9 pontos para 59,8 pontos no mesmo período de comparação.

Política monetária

Na política montaria, apesar das maeças do copom, as previsões também são otimistas. O chefe do Departamento Econômico do BC, Altamir Lopes, previu que a despesa do setor público com juros, em 2010, será da ordem de 4,2% do Produto Interno Bruto (PIB). Segundo ele, o efeito da redução de cinco pontos percentuais da Selic (a taxa básica de juros da economia) no ano passado começará a ser sentido mais claramente a partir de agora.

Altamir mencionou, por exemplo, que a Selic média em 12 meses passou de 10,4% em novembro para 9,9% em dezembro de 2009. Em 2008, ela ficou em 12,5%. O técnico explicou que o processo de renovação dos títulos da dívida pública ao longo do tempo faz com que a redução da despesa com juros não seja tão rápida quanto foi a queda na taxa Selic. O cenário de gastos com juros para 2010 leva em conta a taxa de câmbio prevista pelo mercado, de R$ 1,75.

Para ele, a perspectiva de cumprimento da meta fiscal em 2010, correspondente a 3,3% do PIB, vai contribuir para que a dívida em relação ao PIB recue para 40% no fim do ano.
“Isso demonstra que, do ponto de vista de solvência, não há por que se preocupar”, disse Altamir. “A dinâmica de dívida se mostra benigna, evidentemente, com o cumprimento da meta de primário estabelecida”, acrescentou.

Fechamento de janeiro

O comportamento do câmbio é decisivo para a relação entre o tamanho da dívida líquida como proporção do PIB. Isso porque, quando o dólar se desvaloriza frente ao real, os ativos em moeda estrangeira — como as reservas internacionais — perdem valor, elevando a relação entre endividamento e produção de riquezas, que são calculados em reais.

Em 2008, quando o dólar teve uma valorização de 32% frente ao real, reflexo do agravamento da crise no último trimestre daquele ano, a dívida líquida do setor público atingiu o patamar de 37,3% do PIB. “Em 2009, o câmbio atuou em sentido contrário”, disse Altamir. “Tivemos uma apreciação cambial expressiva, que chegou a 26%, portanto, o efeito foi contrário”, explicou.

Mas o crescimento de 5,7 pontos porcentuais entre 2008 e 2009 também foi influenciado por outros elementos. Segundo Altamir, o déficit nominal mais acentuado e a queda nas receitas contribuíram para essa piora. A retomada da trajetória cadente da relação dívida/PIB já foi verificada no início de 2010. Segundo Altamir, dados preliminares indicam que o endividamento líquido do setor público deve ter atingido o equivalente a 42% do PIB no fechamento de janeiro.

Com agências