Gestão neoliberal e prioridade equivocada agravam enchentes em SP

Às vésperas do carnaval, o auditório Prestes Maia da Câmara Municipal de São Paulo foi palco de rico debate sobre as causas e soluções das enchentes na cidade, proposto pelos vereadores Jamil Murad e Netinho de Paula, do PCdoB de São Paulo. Na ocasião, especialistas apontaram a responsabilidade do poder público municipal e estadual pelas conseqüências catastróficas provocadas pelas enchentes, e enumeraram medidas que podem contribuir para a superação do problema.

Foram convidados para o debate o engenheiro Murilo Celso de Campos Pinheiro, presidente do Sindicato dos Engenheiros de São Paulo; Sérgio Gonçalves, da Secretaria Nacional de Saneamento Ambiental do Ministério das Cidades; Delmar Mattes, Coordenador do plano diretor de drenagem da prefeitura de Guarulhos e a Livre Docente Odette Seabra, do Departamento de Geografia da USP.

O vereador Netinho de Paula conduziu o debate e iniciou a intervenção dizendo que os governantes participaram de um “cursinho rápido” sobre as enchentes em São Paulo que ensinou que a cidade é resultado de um desenvolvimento desordenado.

“Eles estão responsabilizando a população, chamando-a de “mal educada” e dizendo que a chuva desse ano “foi maior que a esperada”. O desenvolvimento ordenado depende somente da vontade política, e eles têm o poder para mudar essa situação”, destacou o vereador.

Jamil Murad afirmou que as causas dessa problemática são a falta de prioridade e de medidas preventivas do poder público na cidade e no estado de São Paulo. “Nós não concordamos que a culpa é da chuva, ou do povo que joga um papel na rua”, completou. Jamil também critica a conclusão do porta-voz do governo estadual e municipal de que não há solução para a enchente, ao contrário do que especialistas afirmaram no debate.

“Quer dizer que ano que vem vai ter novamente enchente, sofrimento, morte, doenças e desespero?”, questionou Jamil. Ele descarta o argumento de que há 50 anos existe enchente. “A engenharia e a tecnologia são muito desenvolvidas, por isso nós acreditamos que tem solução” completou.

SOLUÇÕES
Controlar a expansão urbana estimulando o ocupamento das áreas ociosas do centro da capital e tratar individualmente as bacias hidrográficas de São Paulo. Essas foram algumas sugestões apontadas, durante o debate, pelo geólogo Delmar Mattes, como caminho para prevenir a ação das enchentes.

“É necessário combinar alternativas para o combate às enchentes que nos últimos anos não foram resolvidas, mas apenas transportadas de local”, disse Delmar. Ele ressaltou que modelo de política urbana adotado em São Paulo está alinhado com os interesses do capital e do mercado imobiliário. “Nessa lógica a população mais pobre vai sendo expulsa para as regiões periféricas, onde não tem estrutura, hospital, educação e saneamento”, destacou.

Delmar também lembrou que na década de 90 a solução era a canalização e atualmente passa-se a idéia de que construir reservatório resolve o problema. “Definitivamente isso não é verdade porque não resolve o problema da impermeabilização do solo, do desmatamento e da expansão urbana periférica em áreas degradadas” defendeu Delmar Mattes,

Para Odete Seabra problemas históricos como atrelar a drenagem ao sistema elétrico de São Paulo contribui para intensificar os danos no período de cheias. “O espaço das várzeas que são espaços de circulação das águas foi o grande ganho das empresas de energia, a várzea é uma particularidade dos nossos rios, é sua superfície de inundação”, falou Odette Seabra.

“Ou se faz administração tecnológica dos rios e das várzeas que é uma mudança de concepção ou as enchentes acontecerão todos os anos. Os rios e as várzeas são um espaço tecnológico, pois se tornou um espaço produtivo destinado à circulação, ou seja não é mais um espaço natural. As enchentes são um fenômeno social”, sentenciou a geógrafa.

PLANEJAMENTO
Sérgio Gonçalves, Secretário de Saneamento Ambiental do Ministério das Cidades, disse que não podemos esquecer o Estatuto da cidade e o Plano Diretor que são instrumentos para traçar o crescimento das cidades.

“O setor de saneamento ficou sem planejamento por muitos anos e ainda vivemos sob o costume de que é preciso fazer ações muito rápidas e urgentes para concretizar um nome ou uma marca, quando a necessidade é debater com a sociedade e dialogar a partir de uma política séria, e não realizar a obra pela obra”, argumentou.

Para o engenheiro Murilo Celso de Campos Pinheiro, além de uma política séria o combate às enchentes em São Paulo precisa ser um fórum permanente de discussão. “Daqui há um mês estará fora de moda e o assunto será esquecido até o próximo ano”. Ele sugeriu a criação de um grupo de trabalho formado por intelectuais, engenheiros, lideranças populares, vereadores e deputados estaduais para se debruçar sobre o assunto.

INVESTIMENTO 
Segundo informações de Sérgio Gonçalves, São Paulo é o estado brasileiro que mais recebeu recursos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) do governo federal, que direcionou para a região sudeste 17 bilhões de reais. Desse total, quase 9 bilhões foram destinados ao estado de São Paulo, sendo 1 bilhão para obras de drenagem.

Compareçam ao debate os parlamentares do PCdoB Pedro Bigardi, deputado estadual em São Paulo, e Luiza Cordeiro, vereadora de Guarulhos; Os vereadores do PT, Zelão e Senival Moura; Alcides Amazonas, coordenador geral do escritório da ANP –SP; Nádia Campeão, presidente do PCdoB de São Paulo; Ana Martins, ex-deputada estadual pelo PCdoB; Biteli, representando a Federação Nacional dos Trabalhadores de Energia, Água e Meio-Ambiente (Fenatema) e Reinaldo Paul Pérez Machado, do departamento de geografia da Universidade de São Paulo.