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Mexicanos se preocupam com possível intervenção dos EUA

  A chefe da diplomacia e o secretário de Defesa dos Estados Unidos, Hillary Clinton e Robert Gates, respectivamente, se reunirão nesta terça-feira (23) com autoridades mexicanas para discutir possíveis alterações no plano de combate ao narcotráfico no país. No entanto, um ponto de preocupação levantado por senadores e analistas mexicanos surge novamente em meio às discussões sobre os rumos da Iniciativa Mérida: uma ingerência militar ou policial direta dos EUA no México.

O tema não é novo e após críticas feitas pela secretária de Segurança norte-americana, Janet Napolitano, de que a estratégia do presidente Felipe Calderón de levar o exército aos locais de maior criminalidade "não teve qualquer efeito no combate à violência", preocupações do lado mexicano surgiram. As palavras de Napolitano vieram três dias após o assassinato de três funcionários do consulado dos EUA em Ciudad Juárez, no dia 13 de março.

“Com uma intervenção militar os EUA certamente teriam maior ingerência no México, mas acredito que não se atreverão”, afirmou o senador do PT (Partido do Trabalho), Ricardo Monreal. “Eles sabem que existem duas alternativas: invadir ou aumentar a presença no país e ambas são indesejáveis”, concluiu.

“A atuação de agentes de segurança norte-americanos em território mexicano fere leis mexicanas”, disse Pedro Vázquez, deputado federal pelo PT. “Jamais permitiremos que desempenhem tarefas da alçada do Ministério Público. A investigação do narcotráfico é tarefa das nossas autoridades”, pontuou.

Em artigo publicado no jornal mexicano La Jornada, o professor de Direito da UNAM, John M. Ackerman, disse que o fracasso da atuação do governo contra o narcotráfico poderia justificar o intervencionismo norte-americano. Segundo ele, após Calderón “usar seu último cartucho”, ao enviar militares às ruas e colocando o estado em uma condição de vulnerabilidade, Washington poderia tirar proveito da situação.

Segundo José Carrillo, professor de Sociologia da UNAM (Universidade Nacional Autônoma do México) e especialista em segurança, “a possibilidade de os EUA investigarem e atuarem unilateralmente no país representaria uma mudança muito radical e atrapalharia a gestão do governo.”

Para Carrillo, seria “acima de tudo uma evidente admissão de incapacidade para lidar com um tema nacional e a cessão da soberania”, afirmou ao Opera Mundi.

Mudanças na Iniciativa Mérida

A Iniciativa Mérida, projeto de segurança cujo orçamento conta com mais de um bilhão de dólares aprovados pelo Congresso norte-americano até este ano, é destinada a lutar contra o crime organizado com apoio material, pessoal e treinamento das forças de segurança no México, América Central e Caribe. Para 2011, o governo do presidente Barack Obama já solicitou mais 310 milhões de dólares para o plano.

De acordo com fontes da Secretaria de Governo do México, o montante que o Congresso aprovou deveria ser destinado à compra de helicópteros e aviões, treinamento especial e tecnologia.

Segundo a Secretaria, porém, estaria nos planos de Washington cancelar o envio de mais equipamentos e o reforço no treinamento de técnicas avançadas de inteligência. Um indício de que a estratégia de Washington poderia estar sendo executada é o atraso na entrega de helicópteros e aviões, que conforme o calendário da Iniciativa, já deveriam ter chegado ao México.

O Escritório Binacional de Inteligência (OBI, na sigla em espanhol), com sede na Cidade do México, que já atua como uma entidade de inteligência desde o mandato de George W. Bush, se integraria com a DEA (Força Administrativa de Narcóticos, na sigla em inglês), FBI e CIA, sem a participação das autoridades mexicanas.Ou seja, em vez de operações conjuntas, o narcotráfico seria investigado e combatido somente por funcionários norte-americanos.

“Uma vez que o OBI funcione com toda a capacidade, tanto a DEA, FBI, Pentágono e a CIA buscarão dar outro rumo ao combate ao narcotráfico”, explicou Carrillo.

Para Ackerman, “a solução para esse grave problema não virá de estratégias midiáticas fáceis, "internacionalistas", ou militares, muito menos sacrificando nossa soberania, mas sim a partir de uma renovada vontade política, que recupere o melhor de nossa extensa tradição de luta cidadã e que deve partir das atuais exigência de transparência, prestação de contas e um compromisso irrestrito com os direitos humanos e o estado de direito”.

Fonte: Opera Mundi