Piedad pede apoio dos refugiados na luta pela paz na Colômbia
A sala da Universidade de Genebra estava cheia para escutar a senadora colombiana Piedad Córdoba. Os presentes a receberam com um forte aplauso de boas vindas. O prefeito da cidade de Genebra, Remy Pagani, deu-lhe as boas vindas, em nome do poder executivo da cidade. A senadora surpreendeu-se de ver na sala alguns sobreviventes da União Patriótica (UP), que estiveram juntos com ela no parlamento e nas ações pela paz na Colômbia.
Publicado 15/04/2010 13:54
"Gostaríamos que vocês estivessem conosco", disse, dirigindo-se aos presentes, muitos refugiados, imigrantes colombianos e suíços, no meio da multidão. Córdoba reconheceu o ex-senador da UP, Hernán Motta, a ex-presidente da UP, Ainda Avella, e outros tantos rostos familiares da luta na Colômbia – “pode parecer repetitivo, mas devo lhes dizer que a situação da Colômbia piorou, em relação a como vocês a deixaram quando partiram”.
A senadora fez um apanhado, passando pelos assassinatos a sangue frio, os mal chamados “falsos positivos”, os grampos do DAS, a infiltração paramilitar nas instituições, o êxodo forçado, o financiamento mafioso das campanhas políticas. Ao ouví-la, as imagens e as más recordações invadiram os que ali estavam, e muitos na sala não puderam evitar as lágrimas. Veja abaixo trechos de sua fala:
O que é um falso positivo
Consciente de que muitos europeus na sala necessitavam de uma explicação sobre esta modalidade de execuções extrajudiciais, a senadora ilustrou como funciona a política de recompensas e promoções na cúpula militar, que o governo Uribe criou e Juan Manuel Santos, atual candidato do regime e ex-ministro da guerra de Uribe, promoveu entre militares, para mostrar resultados vitoriosos da política estatal.
Ela explicou que a política, na realidade, se constitui na implementação sistemática de assassinatos contra jovens pobres de Soacha e outras regiões, que foram assassinados e apresentados como guerrilheiros mortos em combate. Para os presentes, ficou claro que as famosas cifras de guerrilheiros mortos em combate foram insufladas em detrimento da vida de jovens pobres assassinados pela política estatal.
A negativa do conflito
“Nessa negativa do conflito colombiano por parte do governo, nasce a organização Colombianos e Colombianas pela Paz, que considera que a solução do conflito colombiano passa pelo reconhecimento do mesmo. Empenham-se em negar a existência do conflito social, político e armado apesar das cifras e dos horrores que temos escutado. Na Colômbia, escandalizam-se quando falo dos fornos crematórios com que os paramilitares fazem desaparecer suas vitimas”, disse a senadora.
Piedad mostrou para o auditório os diversos testemunhos de paramilitares, aos quais teve acesso. É importante lembrar que a senadora visitou, nas prisões, os chefes paramilitares extraditados aos EUA e na Colômbia.
“Por exemplo, o paramilitar conhecido por o ‘Iguano’, contou-nos na prisão de Cúcuta, antes de ser extraditado, como funcionam os fornos crematórios. A própria revista Semana revelou uma foto deles. Os fornos foram construídos no Norte de Santander, ali teve gente cremada viva, e isso foi comprovado e ninguém pode negar", afirmou.
Piedad compeltou: "O ‘Iguano’ é um homem pobre, que participou com tal maestria no genocídio cometido em Urabá, que foi enviado ao Norte de Santander, desta vez como chefe. Seu testemunho é indescritível e não dá para explicar como chegamos a tanto horror, como utilizar os famosos lagos com crocodilos para fazer desaparecer as pessoas. O “Iguano” informou que somente ele havia matado 5.900 e até agora só pode confessar 132. Nestes números aparecem sindicalistas, intelectuais, defensores dos direitos humanos, opositores políticos, e todo aquele que seja acusado de pertencer à guerrilha”.
Segundo ela, com estes depoimentos, ela teve acesso à informação privilegiada sobre quem está por trás dos paramilitares, "quem são os seis patriotas de quem fala Castaño, quem são os financiadores e instigadores do paramilitarismo. O relato de o “Iguano” tem somente quatro meses, assim, estou falando do presente na Colômbia".
"Os Colombianos e Colombianas pela Paz, desde o intercâmbio epistolar com as FARC-EP e ELN, temos nos comprometido com o intercâmbio humanitário e na busca de caminhos para a solução política. Dois momentos foram muito difíceis, o bombardeio no Equador, e a operação Xeque, que poderiam ter feito perder a confiança da insurgência nas gestões pela libertação dos prisioneiros de guerra, principalmente no ambiente do predomínio do resgate militar, e a forma como a mídia informa parcialmente ao país, escondendo deliberadamente a realidade”.
"Depois da marchas organizadas pelo governo contra o sequestro, iniciou-se uma guerra contra nós, onde nos insultaram e intimidaram, mas com tudo isso, a paz na Colômbia não tem volta, custe o que custar. Em Colombianos e Colombianas pela Paz somos conscientes de que na Colômbia há partidários das libertações sem contraparte, e outro setor que apóia o intercâmbio humanitário", adicionou.
Segundo ela, a entidade se pronuncia contra o sequestro, tem enviado cartas à insurgência sobre isso e contribuído para o esclarecimento dos números. “País Livre (Vice-presidente F. Santos/Salud Hernández) e outras instâncias que trabalham o assunto falavam de mais de 3 mil sequestrados, na realidade o número baixou a 132. Nós descobrimos que muitas fundações que tratam deste assunto recebiam dinheiro em proporção direta ao número insuflado dos supostos seqüestrados. O fenômeno existe, mas não na magnitude que apregoam certas organizações na Colômbia".
A lei de justiça e paz
“Eu tenho sido uma opositora desta lei, mas temos que reconhecer que é através dela que temos conhecido certas confissões e testemunhos que demonstraram os laços com o Estado”, declarou a senadora, para quem, contudo, o "governo se assustou com estes testemunhos e, por isso, extraditou os paramilitares para os EUA, o que na realidade significa extraditar a verdade".
"O relatório que estamos preparando para ser apresentado ao congresso conterá informação importante que revelará informação que até agora era desconhecida, por isso necessitamos construir uma comissão que busque a verdade na Colômbia", defendeu.
O preço da verdade
"Numa das visitas que fiz a Mancuso, o pessoal do consulado da Colômbia nos EUA mandou me prender para evitar que tivéssemos acesso aos depoimentos. O que temos passado por encontrar e preservar a verdade do horror paramilitar não tem nome", disse Piedad Córdoba, citando inclusive o desaparecimento da sua filha.
Ela destacou que, em depoimentos, tronou-se público que as principais terras expropriadas dos 5 milhões de deslocados ana Colômbia agora estão nas mãos de políticos e apoiadores dos paramilitares. "Apesar dos obstáculos e dificuldades, temos avançado, poderíamos tornar a guerra mais fácil ao juntar-nos ao coro dos cultuadores da guerra, como o fazem muitos oportunistas, mas não, nós acreditamos nestes gestos das libertações, que abrem portas para a negociação política", falou.
Um dia antes de viajar a Genebra, um novo processo foi protocalo contra a senadora, por suposta ligação com as Farc. "Acreditamos que a paz é possível na Colômbia, apesar da tentativas de nos processar. Colombianos e Colombianas pela Paz, comprometidos como estamos com a solução política, venceremos todos esses obstáculos. Não podemos observar o conflito das nossas casas, nós somos membros da sociedade colombiana, e temos o direito e a obrigação de lutar para viver em paz e com justiça social".
Suíça como mediadora
"Já pedimos ao governo suíço ajuda para a solução política do conflito, pois é um país que dá seriedade e segurança às partes, sobretudo para criar um ambiente propício de confiança para se sentar a conversar. Mas, é claro, esperamos que o governo colombiano aceite a mediação e a intervenção internacional"
Colombianos no exterior
Piedad Córdoba fez uma convocação aos colombianos que vivem no exterior: "Nós gostaríamos que voltassem para lutar juntos pela paz. E se o retorno não é possível, onde estejamos, devemos lutar pela paz. Atualmente o paramilitarismo está mais vivo do que nunca, elegeu parte do novo congresso, não podemos perder de perspectiva o país de onde viemos e o compromisso diante dele. Estamos armados de vontade e da palavra para continuar lutando pela solução política", encerrou.
Com Agência de Notícias Nova Colômbia