Conferência nos EUA exige fim das armas atômicas
A ativista Socorro Gomes, presidente do Conselho Mundial da Paz e do Centro Brasileiro de Solidariedade aos Povos e Luta pela Paz (Cebrapaz), discursou na noite deste sábado (1/5) em Nova York na Conferência "Desarmamento Agora", realizada às vésperas da revisão do Tratado de Não Proliferação Nuclear.
Publicado 02/05/2010 02:27
Socorro falou logo após a intervenção do secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, abordando o tema das ameaças à paz e a revisão do TNP. Iniciando seu discurso com o poema Rosa de Hiroxima, de Vinícius de Morais, a brasileira exigiu, em nome dos povos de todo o planeta, o fim das armas atômicas.
Milhares de ativistas se reuniram neste fim de semana em Nova York para acompanhar a conferência, que também contou com o prefeito de Hiroxima, Tadatoshi Akiba, cidade marcada pelo fato de ter sido o primeiro alvo de uma bomba atômica, lançada pelos Estados Unidos.
Às 15h30 locais (17h de Brasília) deste domingo (2), os participantes da conferência se reunirão com milhares de manifestantes, que marcharam da rua 42 até a frente do edifício das Nações Unidas, onde serão feitos alguns discursos e, em seguida, seguirão até a Dag Hammarskjold Plaza, onde será realizado uma apresentação musical que encerrará a conferência.
Em seu discurso, Socorro destacou a conferência revisora do Tratado de Não-Proliferação, afirmando que o Conselho Mundial da Paz fará das suas deliberações objeto de debate com os movimentos pacifistas e os movimentos sociais.
"O Conselho Mundial da Paz participa da iniciativa Disarm Now convicto de que as discussões aqui realizadas podem contribuir, ao lado de tantas outras, para reforçar o movimento pela paz, pelo desarmamento e pela eliminação de todas as armas nucleares da face da terra", destacou Socorro em seu discurso.
"Há seis décadas e meia, quando estreavam na cena mundial como superpotência com pretensões de dominar o mundo e ordená-lo segundo os seus interesses, os Estados Unidos desferiram um ataque nuclear contra as cidades japonesas de Hiroxima e Nagasaki, provocando a morte de mais de 200 mil pessoas e incontáveis destruições. Um crime inominável de lesa-humanidade, pelo qual nunca foram punidos" disse.
Leia abaixo a íntegra do discurso, proferida no sábado (1/5), em Nova York.
Mudas telepáticas
Pensem nas meninas
Cegas inexatas
Pensem nas mulheres
Rotas alteradas
Pensem nas feridas
Como rosas cálidas
Mas, oh, não se esqueçam
Da rosa da rosa
Da rosa de Hiroxima
A rosa hereditária
A rosa radioativa
Estúpida e inválida
A rosa com cirrose
A anti-rosa atômica
Sem cor sem perfume
Sem rosa sem nada.
(Rosa de Hiroxima, de Vinícius de Moraes, poeta brasileiro)
Senhoras e senhores,
Companheiras e companheiros,
É da maior importância a mobilização que centenas de organizações sociais do movimento pela paz e de solidariedade internacional em todo o mundo fazem diante da questão das armas nucleares. O Conselho Mundial da Paz participa da iniciativa Disarm Now convicto de que as discussões aqui realizadas podem contribuir, ao lado de tantas outras, para reforçar o movimento pela paz, pelo desarmamento e pela eliminação de todas as armas nucleares da face da terra. É com este mesmo espírito que o Conselho Mundial da Paz, na condição de membro do ECOSOC da ONU, acompanhará toda a conferência revisora do Tratado de Não-Proliferação e fará das suas deliberações objeto de debate com os movimentos pacifistas, os movimentos sociais, as organizações não-governamentais, personalidades, instituições políticas, culturais e acadêmicas. É indispensável e inadiável formar uma consciência coletiva sobre as ameaças que pairam sobre os direitos dos povos, a soberania das nações e a paz mundial. Somos uma organização que há 60 anos luta pela paz e pela abolição das armas nucleares.
Associamo-nos a todos aqueles que lutam por uma nova ordem internacional, pela solução pacífica das controvérsias e conflitos. Como uma das expressões legítimas da sociedade civil, consideramos nosso dever precípuo reforçar a cooperação internacional, cujos pressupostos são a igualdade de direitos, a autodeterminação dos povos, a igualdade soberana dos Estados nacionais e a boa fé no cumprimento das obrigações internacionais, que deve estar na base de todos os governos e organismos multilaterais.
Estes princípios, consagrados pelo direito internacional, formam a coluna mestra das Nações Unidas e têm por finalidade a manutenção da paz e da segurança internacional. São, contudo, flagrantemente desrespeitados pelas potências imperialistas, que usam seu desmedido poder para promover a chantagem nuclear, perpetrar guerras, intervenções militares, ameaçar os países mais fracos e impor resoluções e tratados em cuja elaboração não são levados em conta os consagrados critérios do equilíbrio e da igualdade. Compreendendo que para ser vitoriosa esta luta tem caráter essencialmente anti-imperialista, pois parte da concepção de que o sistema de opressão de povos e nações soberanas é o principal causador das guerras e o principal fomentador da militarização do planeta e das corridas armamentistas.
O Tratado de Não Proliferação Nuclear é um destes acordos internacionais marcados pelo desequilíbrio, desigualdade e assimetria.
Como movimento pacifista, sempre saudamos com entusiasmo as iniciativas visando ao desarmamento, à redução das armas nucleares e à não-proliferação. Nossa posição de princípios é pela eliminação de todas as armas nucleares. Há 60 anos o Conselho Mundial da Paz lançava o Apelo de Estocolmo, que guarda impressionante atualidade. O documento, que se tornou célebre porque percorreu o mundo e recolheu a assinatura de seiscentos milhões de pessoas, dizia com simplicidade e clareza:
“Exigimos a proibição absoluta da arma atômica, arma de agressão e de exterminação em massa das populações.
Exigimos o estabelecimento de um rigoroso controle internacional para assegurar a aplicação desta proibição.
Consideramos que o primeiro governo que utilizar a arma atômica, não importa contra qual país, cometerá um crime contra a humanidade e deveria ser tratado como criminoso de guerra.
Apelamos a todas as pessoas de boa vontade no mundo a assinarem este apelo”.
O Tratado de Não Proliferação Nuclear, em vigor desde 1970, foi ratificado por 188 países, um dos quais – a República Popular Democrática da Coreia – posteriormente se retirou. Apenas três países – Israel, Índia e Paquistão não o ratificaram. Este Tratado poderia, em certa medida, constituir um passo para a paz, não fossem algumas flagrantes contradições em sua própria concepção e os condicionamentos políticos a que sua aplicação está submetida.
As críticas ao TNP, no momento em que as Nações Unidas realizam mais uma conferência revisora desse Tratado, dizem respeito ao seu caráter assimétrico.
Em tese, o TNP se basearia em três eixos – a não proliferação, o desarmamento e a utilização pacífica da energia nuclear. Em essência, porém, e para todos os efeitos práticos, é um tratado apenas de não proliferação, em que o desarmamento e a utilização pacífica da energia nuclear são aspectos meramente acessórios. Os países não possuidores de armas nucleares se comprometem a não importar, fabricar nem adquirir armas nucleares e os possuidores assumem o dever de não transferir armas nucleares aos países não possuidores. Aqui reside o principal aspecto negativo do TNP: congela-se o monopólio das armas nucleares e aborda-se de maneira apenas formal as questões do desarmamento e do uso de energia nuclear para fins pacíficos.
O Artigo Seis do TNP refere-se a que todos os estados-partes se obrigam a empreender de boa fé negociações sobre medidas eficazes relativas à cessação da corrida armamentista nuclear e ao desarmamento nuclear. Comprometem-se igualmente a concluir um tratado sobre o desarmamento generalizado sob controle internacional estrito e eficaz. Aqui são patentes a generalidade, a retórica e a contradição com os fatos.
O mundo necessita do desarmamento e da eliminação de todas as armas nucleares, não apenas da não proliferação, não de vagos apelos à boa fé dos possuidores dessas armas para que estabeleçam acordos, segundo apenas as suas conveniências e necessidades, sobre a redução dos seus arsenais.
A Conferência Revisora do TNP do ano 2000 acendeu as esperanças no sentido do desarmamento ao adotar os 13 passos, que previam medidas verificáveis e irreversíveis de desarmamento e de redução do papel das armas nucleares nas estratégias de defesa das grandes potências. Esses 13 passos também previam a implementação do Tratado de Proibição de Testes Nucleares. Infelizmente, porém, foram baldados estes esforços em que estiveram empenhados os países da Coalizão para a Nova Agenda, entre eles os países não Alinhados.
O abandono dos compromissos assumidos na Conferência Revisora do TNP do ano 2000, a ênfase exclusiva na não proliferação, a prioridade às armas nucleares nas estratégias de defesa, a ineficácia e pouca transparência dos acordos de redução das armas estratégicas e a insistência dos Estados Unidos em criar escudos defensivos, assim como a recusa ao compromisso de não ser o primeiro a usar as armas atômicas, são reveladores de que as grandes potências possuidoras de armas nucleares e em primeiro lugar os Estados Unidos não estão dispostas a dar passos significativos no sentido do desarmamento. A partir de 2001 cresceu a chantagem nuclear, quando os Estados Unidos, ao anunciar a sua nova doutrina de segurança nacional baseada na guerra preventiva, reafirmaram seu direito a recorrer a todas as armas, inclusive as nucleares. As nossas principais preocupações voltam-se para este aspecto. O TNP não ensejou passos concretos significativos no sentido do desarmamento e da abolição das armas nucleares.
A ênfase na não proliferação conduz a outra grave distorção, que se traduz em pressões para que os países adiram ao protocolo adicional e renunciem ao inalienável direito de desenvolver a tecnologia nuclear com fins pacíficos, direito formalmente reconhecido pelo TNP. Esta disposição do TNP, baseado na qual as nações não nuclearizadas entre elas principalmente os países não desenvolvidos e os países em desenvolvimento concordaram em aderir, está sendo flagrantemente violada, a julgar pela tentativa que hoje se faz de sancionar e ameaçar países que estão em busca do desenvolvimento da energia nuclear para fins pacíficos.
Senhoras e senhores. Companheiras e companheiros.
Às vésperas de mais uma conferência revisora do Tratado de Não Proliferação Nuclear, os movimentos pacifistas levantam justas preocupações quanto à manutenção de grandes arsenais de armas nucleares. Os presidentes dos Estados Unidos e da Rússia acabam de anunciar um acordo bilateral de redução de armas estratégicas, que é considerado o mais significativo nos últimos 20 anos, pelo qual se comprometem a reduzir no prazo de sete anos a 1.550 o número de ogivas estratégicas. O acordo tem valor meramente simbólico, ligado ao papel das relações bilaterais entre esses dois países no quadro geopolítico, nada significando em termos de redução do perigo de destruir o mundo.
Como demonstração de que a anunciada redução das ogivas nada tem a ver com esforços pela paz, anunciou-se nos últimos dias o desenvolvimento do projeto “Prompt Global Strike”, nova arma a ser montada em míssil de longo alcance, capaz de percorrer a atmosfera em velocidade diversas vezes superior à do som, capaz, portanto de atingir qualquer lugar do planeta, lançada do solo dos Estados Unidos, em menos de uma hora. A justificativa é manter o chamado poder de dissuasão, mesmo com a redução do arsenal nuclear.
A maior potência nuclear do planeta acaba de anunciar a sua nova estratégia de defesa e há poucas semanas organizou em Washington uma conferência internacional sobre a segurança nuclear com o proclamado objetivo de combater o “terrorismo nuclear” e impedir que as redes terroristas adquiram capacidade de produção e manuseio da bomba atômica.
Em meio à retórica sobre o desarmamento, os Estados Unidos proclamam mais uma vez que se arrogam o direito de usar armas nucleares em circunstâncias que classificar como “extremas”, para “defender os interesses vitais norte-americanos ou dos seus aliados”. E mais uma vez a superpotência recusou-se a declarar que não será o primeiro a usar armamentos nucleares. Em tais circunstâncias que valor podem ter os discursos em favor da não proliferação? Diante de semelhantes ameaças, como devem se comportar os governos dos países nuclearmente desarmados? Sucumbir a pressões e chantagens ou afirmar sua soberania e seus direitos exigindo tratados internacionais em que a palavra-chave seja igualdade e os compromissos valham para todos?!
Como movimento pacifista e de solidariedade a países e povos agredidos e sob ameaça de agressão, não podemos silenciar diante da evidência que, tanto no ato de lançamento da nova política de defesa como na conferência sobre a segurança nuclear, dois países foram colocados sob a suspeita internacional e ameaçados de guerra, caso não se submetam aos desígnios imperiais.
Há seis décadas e meia, quando estreavam na cena mundial como superpotência com pretensões de dominar o mundo e ordená-lo segundo os seus interesses, os Estados Unidos desferiram um ataque nuclear contra as cidades japonesas de Hiroxima e Nagasaki, provocando a morte de mais de 200 mil pessoas e incontáveis destruições. Um crime inominável de lesa-humanidade, pelo qual nunca foram punidos. Hoje, este mesmo império faz ameaças de usar novamente seus artefatos nucleares contra países que considera “violadores” das leis internacionais e não aceitam as suas imposições. Com um arsenal infinitamente maior, que preço semelhantes ameaças, se concretizadas, poderiam cobrar aos povos e nações? A inquietação se justifica porquanto, como ressaltamos, no momento em que lançaram a sua nova política de defesa, semanas atrás, os Estados Unidos mais uma vez se recusaram a comprometer-se a não ser o primeiro país a lançar mão da arma atômica.
O desenvolvimento da situação internacional está marcado por ações de guerra e impregnado de novas ameaças. Não faz muito tempo, sob o pretexto de impedir um país de utilizar armas de destruição em massa, ao arrepio do direito internacional e a despeito de não ter autorização do Conselho de Segurança das Nações Unidas, os Estados Unidos iniciaram uma guerra de ocupação que, logo se viu, tinha objetivos distintos dos proclamados. As próprias forças de ocupação acabaram admitindo que o Iraque não possuía armas de destruição em massa. Na Ásia Central, a pretexto de caçar terroristas e de impedir que uma força fundamentalista retorne ao poder, prossegue outra guerra, que cobra alto preço em termos de vidas humanas e bens materiais. Na Palestina, um país possuidor de armas nucleares, embora não o admita, submete o povo a inominável martírio. No Líbano, durante os bombardeios da aviação israelense, há três anos e meio, a então secretária de Estado da potência aliada de Israel declarava que estavam a se fazer sentir “as dores do parto do novo Oriente Médio”. Hoje a humanidade escuta frases de efeito sobre a paz e o desarmamento, mas até agora os anúncios de um mundo sem guerras e sem armas nucleares são peças de retórica ou a manifestação de um vago ideal. Na prática ainda prevalecem as chantagens e as ameaças, o que nos impõe o dever da vigilância e da luta.
Companheiras e companheiros, o desenvolvimento da situação na América Latina é hoje uma das preocupações centrais do movimento pela paz e das organizações de solidariedade internacional, como o CMP.
Há dois anos, foi reativada a Quarta Frota da Marinha de Guerra dos Estados Unidos para os mares da América Latina e Caribe.
Já é colossal a presença militar norte-americana na região. Com a Quarta Frota essa presença aumenta significativamente. Em primeiro lugar, destaca-se a existência de bases militares: sete bases militares foram recentemente instaladas na Colômbia, uma decisão que provocou instabilidade e crises políticas, agravando os problemas envolvendo a própria Colômbia, a Venezuela e o Equador. Iquitos (Peru), Rainha Beatriz (Aruba), Hato (Curaçao), Comalpa (El Salvador), Guantânamo (Cuba), Soto Cano (Honduras) e as novas bases no Panamá são outras instalações militares estadunidenses na região. Agregue-se a isto que já foram anunciados planos para reabrir a base de Vieques, em Porto Rico, fechada em 2004 depois de uma luta heróica do movimento independentista, e para abrir uma base na Terra do Fogo, na Argentina. São também intensas as pressões no sentido de transformar o aeroporto militar de Marechal Estigarribia, no Paraguai, numa base aérea militar. E recorde-se que não faz muito tempo, nos anos 1990, houve tentativas de transformar a base de lançamento de satélites do Brasil, em Alcântara, no Maranhão, numa base militar encravada em território brasileiro. Além das bases, os Estados Unidos exercem sua presença militar através dos exercícios Cabanas, Aguila, Unitas, Céu Central, Novos Horizontes e outras. É motivo de preocupação também para o movimento pela paz a militarização das Ilhas Malvinas, pela Grã-Bretanha, assim como a tendência a renovar acordos militares entre governos, do que é exemplo nefasto a assinatura de um acordo militar entre os Estados Unidos e o Brasil, em abril último.
A existência da Quarta Frota guarda relação direta com o novo quadro político na América Latina, que desde a primeira eleição do presidente Hugo Chávez, em 1998 e do presidente Lula, em 2002, transformou-se num “continente rebelde”,onde se processa a ascensão de forças democráticas e progressistas aos governos nacionais de vários países. De norte a sul da América Latina, vigoram governos democráticos e populares. Na Venezuela está em curso uma revolução de caráter popular e patriótico, que proclama o socialismo como meta. Cuba segue resistindo, desafiando e derrotando desígnios imperialistas. Na Bolívia, no Equador e na Nicarágua, estão em curso processos políticos que tendem a consolidar as novas experiências de governos populares. No Brasil, no Paraguai, no Uruguai, na Argentina, em El Salvador, forças progressistas seguem em frente e avançam no sentido de afiançar a luta pela ampliação e aprofundamento da democracia, por soberania nacional e justiça social.
A militarização da região pelos Estados Unidos tem objetivo claro: conter os avanços dos países e povos do continente na conquista de democracia, soberania nacional e progresso social, o controle das fontes de recursos naturais, como a biodiversidade da Amazônia, as fontes de água, como o aquífero guarani, as grandes jazidas minerais e o petróleo. Tudo isso somado com o controle dos mercados e da geopolítica regional.
O intervencionismo é um traço permanente na política dos Estados Unidos em relação à América Latina desde finais do século 19 até os nossos dias. Do intervencionismo duro da época do “big stick” de Theodore Roosevelt, passou-se a um período em que, embora tenham diminuído as intervenções diretas, as grandes empresas adquiriram um predomínio decisivo sobre o Departamento de Estado. O século 20 conheceu também a “diplomacia missioneira”, de Woodrod Wilson, a formação do sistema panamericano, a “diplomacia do dólar”, a política da “boa vizinhança”, implementada por Franklin Delano Roosevelt, a “doutrina de segurança nacional” na segunda metade do século 20 e finalmente, com o pós-Guerra Fria, a política da “segurança hemisférica”. Todas essas políticas e fases tinham um denominador comum – o intervencionismo, a tutela e a submissão da América Latina e do Caribe aos interesses estratégicos do imperialismo estadunidense – e nenhuma delas excluía em princípio a opção militar.
As primeiras vítimas do intervencionismo militarista estadunidense na América Latina e Caribe foram Cuba e Porto Rico, sob o pretexto de lutar contra a Espanha, no ocaso da época colonial.
Outro alvo precoce do intervencionismo norte-americano foi o Panamá, em 1903. Os marines norte-americanos ingressaram em território panamenho em diferentes ocasiões no início do século 20 – 1917, 1918 e 1925. Mais recentemente invadiram outra vez o país, em 1989.
Entre 1915 e 1934 os Estados Unidos enviaram seus marines ao Haiti.
A vizinha República Dominicana, que compartilha a mesma ilha com o Haiti, foi outro país caribenho a sofrer a intervenção militar dos Estados Unidos, que ali permaneceram entre 1916 e 1924. A partir de 1930, os Estados Unidos patrocinaram uma das ditaduras mais cruéis, duradouras e corruptas ditaduras do século 20 na América Latina.
De 1912 a 1926 milhares de marines ocuparam a Nicarágua, contra os quais lutou Augusto Cesar Sandino, o “general de homens livres”.
O México, que teve boa parte do seu território roubado durante o processo de formação e expansão territorial dos Estados Unidos da América ao longo do século 19, também sofreu múltiplas intervenções dos Estados Unidos entre a primeira e a segunda décadas do século 20.
O pós-Segunda Guerra Mundial é um período em que os Estados Unidos voltam a intervir na América Latina e no Caribe para impor-se como potência dominante. Em 1947, em aliança com setores entreguistas das Forças Armadas, derrubam o governo venezuelano de Rômulo Gallegos. Em 1954, reagem à eleição de Jacobo Arbenz na Guatemala com um golpe de Estado. Em 1961 invadem Cuba, sendo rechaçados pelos revolucionários comandados por Fidel em Playa Girón. Em 1965, invadem a República Dominicana contando com o apoio da ditadura militar brasileira.
Entre 1964 e meados dos anos 1980, a começar pelo golpe militar no Brasil, os Estados Unidos fomentam, apoiam e financiam golpes de Estado e ditaduras cruéis como a de Pinochet, no Chile, e as dos generais fascistas argentinos, uruguaios e brasileiros. Nesse período têm lugar também as guerras contra-revolucionárias na América Central e a invasão de Granada.
Este histórico de intervenções indica a permanência do intervencionismo estadunidense na América Latina, que ganha novos contornos no atual momento, com a Quarta Frota e as bases militares.
Senhoras e senhores, companheiras e companheiros,
A gravidade com que encaramos a experiência histórica e os perigos e ameaças que pesam sobre os povos não estão desligadas das nossas convicções de que a paz e o desarmamento são possíveis. Estas nossas convicções remontam às origens do Conselho Mundial da Paz e ao seu documento fundamental lançado há 60 anos, o Apelo de Estocolmo, que além de demandar a abolição das armas nucleares, condena como autor de crime de lesa humanidade o país ou países que delas lançarem mão.
A causa da paz, do desarmamento e da abolição das armas nucleares é antes de tudo uma questão dos povos e das nações que lutam pela consolidação da sua soberania e pelo desenvolvimento, luta que requer consciência coletiva, unidade, e ampla mobilização social. É uma luta de toda a humanidade.
Muito Obrigada,
Socorro Gomes,
Presidente do Conselho Mundial da Paz