Sem categoria

Lula condena mas tenta ser diplomático ao comentar reajuste

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi extremamente diplomático ao comentar nesta quarta-feira (5) a decisão da Câmara dos Deputados em conceder um reajuste de 7,7% aos aposentados e pensionistas que ganham acima de um salário mínimo. Em suas declarações à imprensa, Lula não disse se vai vetar o reajuste, mas, nas entrelinhas, condenou a decisão da Câmara. Para o presidente, é preciso aguardar o Senado e depois avaliar com calma o que fazer.

O presidente afirmou não enxergar necessidade de “fazer qualquer loucura” para atrapalhar o ciclo de desenvolvimento do país. Evitando polemizar com o Congresso, o presidente disse que iria analisar a proposta aprovada pelos deputados, que também acabou com o fator previdenciário, só depois que a matéria for analisada pelo Senado. Ao ser questionado se a aprovação do aumento maior do que o proposto – 6,14% – inicialmente pelo governo teria conotações eleitorais, Lula foi direto: “Todo mundo tem apreço pelos aposentados. E no ano eleitoral aumenta o apreço de forma extraordinária.”

A diplomacia do presidente para tratar da questão contrasta com o tom belicoso adotado por outros membros de seu governo, que condenaram fortemente o reajuste concedido pelos deputados. Isso pode ser um sinal de que o governo está decidido a vetar o reajuste, mas quer preservar o presidente Lula de desgastes neste momento. A matéria ainda percorrerá um longo caminho no legislativo até chegar às mãos do presidente. Até lá, é possível que o governo promova manobras para derrubar a conquista dos aposentados sem que seja necessário o veto.

O presidente disse que iria conversar com o ministro da Fazenda, Guido Mantega, para analisar a proposta aprovada pelo Legislativo. “Vou discutir com o ministro Guido (Mantega). Vamos tentar ver, porque tudo que nós queremos fazer é melhorar a vida do povo trabalhador desse país. Agora, só é possível melhorar a vida do povo se houver compatibilidade entre a necessidade do reajuste e a receita que nós temos. De forma que, com muita tranquilidade vou conversar com o ministro da Fazenda só depois que o Senado tomar a decisão final”, relatou.

Mais cedo, no entanto, o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, classificou de “decisão demagógica” e “irresponsável” a aprovação do reajuste e o fim do fator previdenciário. Para Bernardo, interesses eleitorais fizeram com que a matéria fosse avalizada pelo Legislativo: “Você simplesmente tomar decisões em um momento de calor, onde as pessoas estão preocupadas com a eleição, estão preocupadas se vão ser reeleitas, se vão conseguir alguns votos a mais, e tomar decisão baseada em princípios demagógicos, eu acho irresponsável, acho errado e nós não deveríamos compactuar com isso.”

Mais realista que o rei, ele admitiu que irá aconselhar o presidente Lula a vetar tanto o aumento quanto o fim do fator previdenciário. “Sinceramente, vou levar para o presidente Lula a opinião de que nós deveríamos vetar isso. Vetar os dois (fator e reajuste). O governo deixou claro que nós temos uma preocupação com a sustentabilidade da Previdência”, justificou Bernardo. “O veto é uma decisão impopular. É uma coisa muito complicada. Agora. Nós temos que ter clareza de que a vida não se resume a eleições. Qualquer que seja o governo que venha assumir em 2011, vai ter que enfrentar esse problema. Pode ser a candidata do governo, pode ser o candidato da oposição e tem outra candidata da oposição”, complementou.

Ainda que possa refletir uma posição do núcleo do governo, a opinião Bernardo não encontra respaldo nem dentro de seu próprio partido. A maioria dos integrantes da base do governo no Congresso, inclusive muitos petistas, votaram a favor de reajuste e do fim do fator previdenciário. 

Oposição também foi derrotada

A decisão da Câmara dos Deputados de acabar com o fator previdenciário e conceder reajuste de 7,7% pode ser interpretada como uma vitória do sindicalismo e uma derrota não só da ala financista do governo, representada por Paulo Bernardo, mas também como uma derrota da oposição de direita. DEM, PSDB e PPS tentaram, demagogicamente, emplacar um reajuste de 8,77%. Foram derrotados pela maioria dos deputados, que também não seguiram a recomendação do líder do governo de conceder um reajuste de 7%.

O fim do fator previdenciário, antiga bandeira do movimento sindical, também pode ser contabilizado como uma grave derrota da direita, já que o fator foi instituído pelo governo Fernando Henrique Cardoso que, na época, fez grande estardalhaço em torno deste tema. Criado com o objetivo de reduzir os benefícios de quem se aposenta antes das idades mínimas ou obrigar o empregado a trabalhar mais tempo, o fator previdenciário leva em conta quatro elementos para o cálculo do benefício: alíquota de contribuição, idade do trabalhador, tempo de contribuição à Previdência Social e expectativa de vida.

Senado deve manter reajuste

Por conta do ano eleitoral, dificilmente os senadores farão qualquer mudança na medida provisória aprovada pela Câmara. A avaliação é do presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP). A palavra final sobre os dois assuntos, então, caberia ao presidente Lula.

"Eu não conheço os números do orçamento do governo, mas acho que, politicamente, é muito difícil que haja qualquer modificação aqui no Senado até mesmo porque há, aqui, uma grande simpatia com os aposentados", afirmou Sarney.

O prazo de validade da MP é 1º de junho. Se até lá não for votada pelo Senado (e novamente pela Câmara, em caso de nova alteração feita pelo relator designado pela presidência da casa), a medida provisória perderá efeito. Nesse caso, terá de ser editado um decreto legislativo para que os aposentados não sejam obrigados a devolver os valores já recebidos por conta do reajuste determinado pela MP.

Pela convenção, há um rodízio na relatoria, embora a prerrogativa na designação do relator seja da presidência do Senado. Para o aumento de 7,72% para as aposentadorias da Previdência Social já havia um acordo entre os senadores, mas não se conhece a posição dos parlamentares em relação do fim do fator previdenciário.

Se houver, por exemplo, alteração no percentual de aumento ou mudança nas normas para aposentadoria, como a retomada do fator previdenciário, a MP terá de voltar à Câmara para nova votação.

Com agências