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Paul Krugman: Austeridade contraproducente

O blog de economia do WSJ traz um artigo interessante mostrando como a restrição dos benefícios aos desempregados pode na verdade acabar aumentando o déficit no longo prazo, ao fazer com que trabalhadores perto da idade de aposentadoria se vejam obrigados a recorrer a programas de aposentadoria por invalidez. Mas a questão vai muito além disto.

Paul Krugman

Há uma argumentação bastante razoável segundo a qual medidas de austeridade no contexto de uma economia em depressão equivalem, literalmente, a uma falsa poupança – no longo prazo, os problemas orçamentários são agravados.

Pessoas como eu têm hesitado em expor tal argumentação em voz alta, por medo de sermos tachados de versão esquerdista de Arthur Laffer – mas que se dane a cautela, vou explicar do que se trata.

Funciona mais ou menos assim. Imaginemos um corte nos gastos equivalente a 1% do PIB. Isso tem a aparência de uma redução no orçamento, certo? Mas se o fizermos no caso de uma economia que se depara com o limite inferior zero, de modo que o Fed se veja impossibilitado de compensar os efeitos sobre a demanda com juros mais baixos, o resultado será um encolhimento da economia. Usemos um multiplicador de 1,4; os números podem ser ajustados a gosto.

Sabemos que uma economia mais fraca significa uma arrecadação menor. Suponhamos que cada dólar somado ou subtraído ao PIB represente US$ 0,25 em arrecadação, uma estimativa conservadora. Então a austeridade fiscal reduz a arrecadação em 0,35% do PIB; a proporção realmente poupada é de apenas 0,65%.

O governo precisa captar estes fundos por meio de empréstimos; digamos que os juros reais sejam de 3% (no momento eles são muito mais baixos do que isto.) No longo prazo, o impacto da austeridade sobre a posição fiscal será uma redução de 0,0195% do PIB no pagamento dos juros reais.

Espere: e se houver efeitos negativos de longo prazo decorrentes de um declínio mais profundo na economia? O artigo do WSJ mostrou um exemplo: trabalhadores excluídos permanentemente da força de trabalho. Há também o efeito negativo de uma economia em depressão que incide sobre o investimento privado. Temos os talentos desperdiçados porque os jovens têm suas carreiras prejudicadas pelo resto da vida. E assim por diante. E aí é que está o problema: se a economia se mostrar mais fraca no longo prazo, isso significa uma arrecadação menor, o que anula a quantia poupada pela austeridade inicial.

Qual deve ser a dimensão destes efeitos negativos para que a austeridade seja transformada numa perda líquida para o equilíbrio orçamentário? Não precisa ser grande demais. No meu exemplo, a quantia poupada no pagamento de juros reais proporcionada por medidas de austeridade equivalentes a 1% do PIB é inferior a 0,2% do PIB; se a proporção do PIB convertida em arrecadação for de 25%, isto significa que uma redução adicional no PIB da ordem de 0,8% seria suficiente para anular os supostos benefícios fiscais. Não é nada difícil imaginar a ocorrência de algo do tipo.

Em resumo, é fácil perceber que implementar medidas de austeridade agora é uma má ideia, não apenas por causa do seu impacto sobre a economia e os desempregados; pode ser que isso fracasse até na tentativa de ajudar a equilibrar o orçamento.

É importante perceber que não estou dizendo que os gastos governamentais sempre valem a pena, e nem que poupar dinheiro seja necessariamente contraproducente. Os efeitos que analisamos condizem com uma situação de armadilha de liquidez. Mas é esta a situação em que nos encontramos.