Sem Lula e Hartung em 2010

Em 2002 os capixabas e os brasileiros elegeram Paulo Hartung (PMDB) e Lula (PT) e, em 2006, reelegeram a ambos. Não foi só uma coincidência. A decisão do tinha um sentido: manter harmonizados os governos estadual e federal.

Jornalista e Vereador Namy Chequer

No Espírito Santo, Hartung tratou de aprofundar a política de harmonia, estendendo-a aos municípios – num processo que contou com mediações diversas. Nos últimos oito anos, quase não se viu conflitos importantes entre prefeitos e o governador. Lula, por sua vez, tratou de sintonizar o Brasil com as aspirações e projetos dos demais países emergentes, buscando uma nova ordem mundial, na qual tivessem vez os latino-americanos, os africanos e os asiáticos.

Nos dois casos, do Brasil e do Espírito Santo, o sentido do movimento em curso é o de ficar cada vez mais distante da velha e falida ordem neoliberal de empobrecimento e submissão. Também nos dois casos, o instrumento para operar a ação foi o mesmo: a política. E este instrumento, obviamente, tem que contar com o personagem chave que é o povo. Pode-se dizer, portanto, que tudo, no Espírito Santo e no Brasil, se fez com a participação insubstituível do povo. Descobrimos que no regime democrático é possível colher importantes vitórias.

Vem aí uma nova eleição, mas sem as candidaturas de Hartung e Lula. Porém, os dois tem seus respectivos candidatos. Lula considera que Dilma Roussef (PT) é o nome mais preparado para dar continuidade de fazer avançar o atual projeto brasileiro. No nosso Estado, Renato Casagrande (PSB) é o nome definido pelas forças capixabas mais avançadas para manter a política de harmonia experimentada nos últimos anos. E é o povo o juiz de todo o processo.

Toda eleição é diferente uma da outra. Todas possuem peculiaridades próprias do seu tempo e ambiente. Talvez a maior diferença da eleição de 2010 para as anteriores resida no fato de que desta vez o povo tem muito a perder se tomar a posição errada. Nas eleições realizadas nos período de terras-arrasadas, por exemplo, é comum o povo decidir sob critérios duvidosos. Caso típico do final de governo de Sarney, em 1989, quando a inflação mensal era superior a 40 por cento e o nível de corrupção no País já havia superado o absurdo. Conclusão: deu Collor na cabeça. O povo não tinha nada a perder. Vimos aqui no Espírito Santo coisa parecida no final do governo de Albuíno Azeredo, quando o Cabo Camata quase venceu a eleição.

A conjuntura agora é bem outra. No Brasil o povo sabe que tem muito a perder se houver descontinuidade do governo de Lula. No Espírito Santo certamente também o povo estará interessado em preservar o padrão de harmonia respeitabilidade adquirida. Só que todos sabemos que o avanço não se dá de forma linear, sem percalços. A sociedade brasileira não é homogênea. Ao contrário, nela estão as classes com interesses muitas vezes antagônicos. Tanto isto é verdade que os programas de governo são elaborados em cima de pontos que possam unificar os interesses. Não é por acaso que Dilma destaca a necessidade de manter e ampliar o ritmo de “crescimento, mas com distribuição da renda”. O crescimento alcança o interesse empresarial e a distribuição atende aos trabalhadores. É, portanto, um ponto de interesse comum.

Casagrande fala num encontro com o futuro, pois sabe que lá reside a maior expectativa dos capixabas, confiantes na riqueza extraída com o pré-sal. Acenando para um futuro relativamente próximo, Casagrande ganha tempo para reduzir o custo ambiental – matéria na qual é um especialista – causado pela nossa industrialização que, por ter vindo tardiamente, se fez de forma acelerada e predatória. O futuro é algo intimamente ligado à ciência e tecnologia – área do domínio tanto de Casagrande como de Luiz Paulo (PSDB). Daí ambos tenderem a colocar o tema no centro do debate. Quanto à segurança e a qualidade dos serviços públicos disponíveis para a população capixaba, os dois candidatos sabem que será possível um atendimento mais do que satisfatório, logo que o crescimento do Espírito Santo for confrontado com uma população relativamente pequena e com a renda per capta bem superior à média nacional. Os debates vão acentuar as diferenças entre os projetos nacionais aos quais os candidatos daqui estão vinculados, com vantagem para Casagrande.

Mas a eleição de 2010 não é só para presidente e governador. O povo é chamado a eleger dois senadores por estado. Aqui o confronto principal para o Senado envolve três candidaturas. Do lado de Casagrande estão Ricardo Ferraço (PMDB) e Magno Malta (PR), ficando Rita Camata (PSDB) na chapa de Luiz Paulo. Como o eleitor poderá dar dois votos em dois candidatos ao Senado, dificilmente os três concorrentes se permitirão amarrar-se às respectivas coligações por laços de fidelidade. O imponderável, neste caso, tem mais peso do que o script programado.

Para deputado federal, as dez vagas deverão sofrer mudanças irrelevantes. Os candidatos que disputam para valer não passam de uma dúzia. É a disputa com resultado mais previsível de 2010. Nossa bancada federal é diminuta em função do número de eleitores e só com muito talento ela poderia fazer a diferença em Brasília. A dura realidade da sua fragilidade pôde ser constatada recentemente na derrota sofrida na votação do projeto de mudança nas regras do petróleo. Num regime democrático, no qual as maiorias se impõem, a tendência é de que bancadas pequenas só apresentem resultado se tiverem muita qualidade.

Quanto à Assembléia Legislativa, a coisa muda de figura. A atual composição não é a de Casagrande e nem de Luiz Paulo. Serviu bem como base de Paulo Hartung, mas atuou oito anos presa às cordas, sem chance nem para respirar. Afinal, o governador sabia que o legislativo capixaba era, antes dele, o centro do que se convencionou chamar de Mal. Dali partia todo confronto com as forças do Bem. A política da harmonização, legado político de Hartung tão disputado pelos candidatos a sua sucessão, vai depender enormemente dos deputados estaduais. Por isto mesmo, os candidatos apostam numa renovação acentuada. Serão os futuros deputados estaduais os grandes mediadores do governador junto aos municípios e a sociedade civil, num outro patamar. Casagrande, por exemplo, possui larga experiência parlamentar e nada neste universo lhe é estranho. Esta é a razão pela qual sabe que o sucesso do seu governo está ligado a uma renovação qualitativa da Assembléia Legislativa.

Namy Chequer