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Plebiscito popular debate limite da propriedade de terra

O Brasil é o segundo maior concentrador de terras do mundo. Uma desigualdade histórica, que se expressa no fato de as unidades de produção com menos de dez hectares ocuparem somente 2,36% de área do território nacional, mesmo sendo a imensa maioria numérica. Este cenário motivou o Fórum Nacional pela Reforma Agrária (FNRA) a propor um plebiscito popular pelo limite da propriedade da terra. A população é chamada a organizar, entre os dias 1º e 7 de setembro, uma urna e participar do debate. 

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Medida indicada em uma série de países, o limite jurídico da propriedade da terra inexiste no Brasil. O Fórum propõe um máximo de 35 módulos fiscais como a área que um proprietário possa ter em mãos. Propriedades superiores a essa medida seriam incorporadas à reforma agrária pelo poder público.

O módulo fiscal varia de região para região, definido para cada município de acordo com critérios, tais como: proximidade da capital e infra-estrutura urbana, qualidade do solo, relevo e condições de acesso. No Paraná, por exemplo, o enquadramento de 35 módulos fiscais equivale a uma média de 1035 hectares. Já no Amazonas, a área torna-se mais extensa e atinge 3500 hectares.

O Fórum Nacional pela Reforma Agrária e Justiça no Campo é composto por 54 entidades. Somam-se ao plebiscito a Coordenação dos Movimentos Sociais (CMS), a Assembléia Popular (AP) e o Grito dos Excluídos, entre outros movimentos sociais. Entidades como a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e o Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil (Conic) apóiam a iniciativa. A população é também chamada a participar de uma coleta de assinaturas para um projeto de emenda constitucional (PEC) para seja inserido um quinto inciso no artigo 186 da Constituição, no que se refere ao cumprimento da função social da propriedade rural. De acordo com os organizadores do plebiscito, o voto e o abaixo-assinado são complementares.

Contexto do debate

Para o jornalista Altamiro Borges, "nas vésperas da sucessão presidencial, o plebiscito se reveste ainda de forte caráter político. Visa forçar os candidatos a debaterem este tema estratégico e serve como justa pressão para viabilizar a reforma agrária".

Dom Ladislau Biernarski, presidente nacional da Comissão Pastoral da Terra (CPT), afirma que o plebiscito dialoga com o tema central da Campanha da Fraternidade de 2010, que toca na desigualdade do capitalismo, com o “Fraternidade e Economia – Vocês não podem servir a Deus e ao dinheiro", e tem o seu desfecho com o “Grito dos Excluídos”, realizado na Semana da Pátria, também de 1º a 7 de setembro.

De acordo com a proposta do plebiscito, apenas cerca de 50 mil proprietários teriam sua propriedade limitada, o que ao mesmo tempo liberaria uma área de 200 milhões de hectares para a reforma agrária. “É vantajoso para um país que deixemos de ter quatro milhões de sem terra, onde 2% dos proprietários possuem mais de metade das terras”, coloca Biernarski.

O artigo 184 da Constituição Brasileira se refere à função social da propriedade e impõe que o Estado cumpra a reforma agrária. No entanto, logo depois, o mesmo documento também estabelece o direito à propriedade privada e define que a reforma agrária não toque na média propriedade e naquela definida como produtiva.

A proposta do plebiscito busca inserir o limite da propriedade da terra no artigo 186 na forma de um quinto inciso, somado aos atuais quatro incisos que definem a função social da propriedade. No entanto, para atingir na prática a função social da terra, como afirma Biernarski, “será necessário pressão das organizações sociais”.

A questão do elevado consumo de agrotóxicos, o controle das transnacionais sobre a terra e a água são diferentes debates que atravessam a atual conjuntura e devem estar presentes no trabalho de conscientização que antecede os dias de votação do plebiscito. “Temos que trabalhar a reforma agrária abrangente, que cuide de fato da alimentação da população, sem veneno, em que haja o confisco das terras onde há trabalho escravo”, defende Biernarski. No que se refere ao uso do trabalho escravo pelos grandes proprietários, dados recentes da CPT apontam que, em 25 anos, 2.438 ocorrências de trabalho escravo foram registradas, com 163 mil trabalhadores.

Falar na propriedade da terra é tocar no assunto da terra em mãos estrangeiras. O Sistema Nacional de Cadastro Rural do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) elaborou um mapa da distribuição de terras brasileiras compradas por estrangeiros. São 4,3 milhões de hectares distribuídos em 3.694 municípios. “A questão da terra é fundamental para a identidade nacional. O limite da propriedade da terra existe em quase todos os países, a terra não pode nunca perder sua importância, seu significado de ser a primeira referência de um país, quando olhamos sua geografia e sua história”, comenta o bispo de Jales e presidente da Cáritas brasileira, dom Demétrio Valentini.

Conheça as perguntas que estarão na cédula de votação durante o Plebiscito Popular pelo Limite da Propriedade da Terra:

"1 – Você concorda que as grandes propriedades de terra no Brasil devem ter um limite máximo de tamanho?

2 – Você concorda que o limite das grandes propriedades de terra no Brasil possibilita aumentar a produção de alimentos saudáveis e melhorar as condições de vida no campo e na cidade?"

Da redação, Luana Bonone, com Brasil de Fato e CTB