“Vitória de Dilma e Eduardo é decisiva para as mudanças”

Às vésperas das eleições que decidirão os novos rumos de Pernambuco e do Brasil, Luciano Siqueira, vereador do Recife, dirigente do PCdoB e candidato a deputado estadual, faz uma análise lúcida sobre o quadro político do Estado e do País e as perspectivas de crescimento do partido na fase pós-eleitoral.

QUADRO POLÍTICO NO PÓS-ELEIÇÃO

"A vitória de Dilma será um passo decisivo para a continuidade do ciclo de transformação que se iniciou com a eleição de Lula para a Presidência da República. Agora, essa reta final das campanhas sinaliza para a continuidade da luta da direita para desestabilizar o governo de Dilma. Não tenho dúvidas de que, proclamados os resultados, a mídia, sobretudo, que é o principal partido de oposição hoje, continuará imediatamente o fogo cerrado contra seu governo.

Como instrumento dos partidos de oposição, a grande mídia não deu tréguas a Lula durante oito anos. Pode ser até que, em alguns momentos, tenha subestimado a capacidade política do presidente. Mas, não só a organização do governo, mas a enorme capacidade, a habilidade política do presidente, com o seu carisma e a sua liderança o tornaram de uns dois, três anos para cá quase que infenso a qualquer ataque. Tanto é que ele não parou de crescer em popularidade.

Eu acho que a direita no Brasil, instrumentalizada pela grande mídia, tem consciência de que, para Dilma, governar o País será um enorme desafio, não só do ponto de vista político e administrativo convencional, mas um desafio pessoal em razão de que este será o primeiro cargo público eletivo que ela assumirá. Creio que será um resultado de grande significado estratégico até do ponto de vista do médio prazo, mas vai representar também uma contra-atuação muito feroz de setores da classe dominante que nunca aceitaram Lula e demonstram uma dificuldade enorme de aceitar Dilma.

Em Pernambuco, assistiremos a uma vitória acachapante de Eduardo. Aqui nós precisamos também examinar melhor, prestar muita atenção ao período pós-eleitoral porque o resultado das eleições tem, evidentemente, um significado político importante. Do ponto de vista tático, ele reflete uma correlação de forças extremamente favorável à Frente Popular construída com muita habilidade, muita amplitude e firmeza pelo próprio governador, e o enfraquecimento surpreendente das forças de oposição, que terminarão o pleito com sua principal liderança, Jarbas Vasconcelos, muito fragilizada, com as forças divididas, aprofundados as divergências e os conflitos entre Democratas e PSDB e um PPS praticamente inexistente, sem deputado estadual e sem deputado federal.

Alguns meses depois, começará na oposição a reciclagem, a tentativa de se reorganizar. Da parte do governo, Eduardo tem consciência de que no segundo governo não apenas terá de trabalhar duro para realizar as metas propostas, como cada dia que passa é um dia a menos de governo e, portanto, um passo a mais nos preparativos para que ele deixe o poder do Estado. Isso tem reflexos no comportamento, na atitude da diversidade das forças que o apoiam.

Administrar a vitória nunca foi simples, inclusive do ponto de vista revolucionário. A clássica afirmação de Lênin é que “mais difícil do que conquistar o poder é mantê-lo”. Guardadas as diferenças de um processo revolucionário para uma batalha político-eleitoral das dimensões da que acontece em Pernambuco e no Brasil, administrar a vitória com o espaço do novo governo será um enorme desafio também para Eduardo.

Agora, o mais importante da vitória de Dilma e de Eduardo são os benefícios para o povo brasileiro e pernambucano porque não há nenhum sinal de que os rumos traçados até agora e perseguidos sob a liderança de Lula sejam alterados. Ao contrário, particularmente, se no cômputo geral das eleições no País Dilma eleger-se com uma sólida maioria de senadores e deputados federais conforme prevê a revista Isto É na edição desta semana, na reportagem “A onda vermelha toma conta do País”. Em tese ela estará politicamente mais calçada no Parlamento do que Lula esteve e, portanto, em condições de dar passos adiantes em relação ao que foi feito até agora.

Eu sinto também que existe outra variável, que no governo Lula esteve presente em um papel secundário e de maneira muitas vezes pontual até porque os movimentos sociais demoraram a compreender, do ponto de vista tático, a nova conjuntura de que se tinha no governo federal um aliado, um presidente oriundo de seu seio. Hora não tinha discurso sustentado contra o governo, como na conjuntura anterior quando Fernando Henrique era governo. Hora abriu mão, não sei se de maneira consciente, de afirmar uma conduta propositiva, porém independente do governo.

Agora, eu quero crer que a vida se encarregará por voltar o movimento sindical, o movimento estudantil, o movimento popular em geral para assumir uma nova postura no governo Dilma. Talvez o fato de não se ter na Presidência da República uma liderança da dimensão de Lula, do ponto de vista objetivo e subjetivo se alarga o espaço para o co-protagonismo dos movimentos sociais.

E isso é um bom sinal de que, pelo menos no âmbito nacional, nesta campanha tem havido um posicionamento afirmativo, propositivo, por parte das centrais sindicais, da UNE, da UBES, das organizações do movimento de massas mais gerais, restando saber qual é a capacidade que o movimento tem de transformar isso em ação pela base, em um movimento concreto em cada cidade, em cada Estado."

PCdoB E O RESULTADO DAS ELEIÇÕES

"Eu penso que o PCdoB terá um resultado muito positivo, embora aquém dos desafios postos na ordem do dia. Isso é um paradoxo. Nós teremos, acredito, muito o que comemorar e, ao mesmo tempo, seremos chamados a uma consciência mais exata do alcance real da vitória do Partido. O paradoxo se esclarece, se nós considerarmos uma variável que para um partido como o nosso pesa muito como limitante das possibilidades de alcançarmos grandes bancadas, que é a legislação eleitoral em vigor.

Ou muda a lei eleitoral ou um partido como o PCdoB terá sempre dificuldades de eleger grandes bancadas. Particularmente, o mecanismo de financiamento das campanhas eleitorais limita muito, muito mesmo. Creio também que se viéssemos a adotar para as campanhas proporcionais o sistema de listas dos candidatos pré-estabelecidos pelo partido, isso significaria que o eleitor será induzido a procurar os partidos e seus programas, embora não deixe de considerar as individualidades, o prestígio, a credibilidade dos militantes indicados nas listas.

"Essa eleição é a ante-sala de outro resultado que o PCdoB alcançará nas eleições municipais. Isso é importantíssimo, mesmo para um partido que tem a consciência revolucionária como o nosso e persegue objetivos estratégicos que dependem de múltiplas formas de luta, de diversas formas de luta que não exclusivamente a disputa eleitoral."


"Eu penso que essas duas coisas, listas partidárias e mais atenção aos programas e financiamento público de campanha abrirão uma perspectiva bem mais ampla para partidos como o nosso. Antes disso o jogo é pesado, o jogo é muito desigual.

Mas, nós temos chances reais de eleger dois ou três senadores que somados a Inácio Arruda comporão uma bancada, talvez, de quatro senadores: no Amazonas, a Vanessa já passou o Arthur Virgílio; em São Paulo, Netinho ameaça ser o primeiro colocado; no Acre, nós devemos eleger Edvaldo Magalhães. Há chances reais de nós elegermos senadores. Assim como, temos a possibilidade real de a eleição ir para o segundo turno no Maranhão e se Flávio Dino vai ao segundo turno pode até não vencer em razão da correlação de forças do Maranhão, porém, dará um passo significativo para se tornar o próximo prefeito da capital, São Luís.

É por isso que, conforme o calendário no Brasil, as eleições se engatam uma na outra. Eu penso que essa eleição, de certa maneira, é a ante-sala de outro resultado que o PCdoB alcançará nas eleições municipais. Aí eu acho que nós vamos fazer mais prefeitos nas capitais e em cidades importantes e vamos acumular forças para na eleição seguinte não só conquistarmos o governo do Estado, como também ampliar as nossas bancadas nas Assembleias Legislativas e no Congresso Nacional. Isso é importantíssimo, mesmo para um partido que tem a consciência revolucionária como o nosso e persegue objetivos estratégicos que dependem de múltiplas formas de luta, de diversas formas de luta que não exclusivamente a disputa eleitoral.

Mas, no atual estágio da luta política do Brasil a batalha eleitoral institucional é hoje decisiva e vai permanecer decisiva por algum tempo ainda. Então, acumular forças e ampliar as conquistas nesse terreno é muito importante se nós soubermos traduzir, na prática, no dia a dia, uma das diretrizes mais caras do PCdoB, que é combinar três frentes de lutas, que são permanentes e que não podem caminhar separadas: a luta institucional, ocupação de cargos nos poderes Executivo e Legislativo, o debate de ideias com a sociedade e a luta social."

"É possível colocar o mandato à disposição do movimento social, da construção do partido, do fortalecimento das organizações sociais em conjunto com o governo do Estado."

"Um exemplo pontual, localizado. Se eu for eleito deputado estadual terei outro esquema de trabalho, completamente distinto do atual trabalho de vereador do Recife. Eu penso que pode vir a ser um mandato conscientemente posto à disposição tanto da sociedade e dos movimentos sociais, como do Partido para contribuir na integração dessas três vertentes da luta de classes, da luta política, no País: a luta de idéias, a luta social e a luta institucional.

Eu sei que a conjuntura atual, pelo menos em Pernambuco, é bastante distinta da conjuntura em que fui deputado em 1982. Mas, eu fui um deputado da rua, da greve, da porta de fábrica, do piquete, do debate com grevistas. Eu fiz inúmeras palestras em campanhas salariais convocado pelos sindicatos, pelo movimento social, participei de inúmeras ocupações de terrenos do movimento que não tinha essa denominação de sem-teto, pois não estava tão organizado assim.

A conjuntura é outra. No entanto, é possível colocar o mandato à disposição do movimento social, da construção do partido, do fortalecimento das organizações sociais em conjunto com o governo do Estado. Aí eu acho que é outra agenda de trabalho, outro planejamento, algo completamente diferente, que nem cabe pensar agora porque o mais importante hoje é chegar no dia 03 de outubro com os votos conquistados."

Do Recife,
Audicéa Rodrigues e Inamara Mélo.