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Aldo Arantes: “Seminário sobre mudanças climáticas será um marco”

A Fundação Maurício Grabois, em parceria com o Instituto Nacional de Pesquisas e Defesa do Meio Ambiente (INMA), promove em Brasília, nos dias 11 e 12 de novembro, o Seminário Internacional Mudanças Climáticas. O coordenador do seminário, Aldo Arantes, falou ao site Grabois.org sobre os objetivos do evento, que antecede a 16º Conferência das Partes da Convenção das Nações Unidas sobre Mudança Climática (COP-16), a ser realizada entre os dias 29/11 e 10/12 na cidade de Cancun, México.

Grabois.org – Mediante o impasse que se estabeleceu ano passado na Conferência de Copenhague (COP-15), quais as expectativas para esta rodada de Cancun?

Aldo Arantes – O impasse está relacionado às questões que opõem os países desenvolvidos aos países em desenvolvimento. As nações do chamado “primeiro mundo” queriam impor metas obrigatórias aos países em desenvolvimento, e estes não aceitaram. Queriam metas mais amplas e mais categóricas de redução dos gases de efeito estufa. Em função disso não se chegou praticamente a acordo nenhum. A discussão foi jogada para frente, e – pelas informações que tive a oportunidade de obter do Ministério das Relações Exteriores e do Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas, reunido há poucos dias com a presença do presidente Lula – dificilmente chegaremos a uma conclusão na Conferência de Cancun, exatamente porque não houve nenhuma evolução no sentido de definir com mais precisão os objetivos.

Na verdade o que se discute é o pós-Kyoto. A Conferência de Kyoto delineou objetivos muito precisos e estabeleceu o conceito de responsabilidades históricas e diferenciadas. Os países desenvolvidos querem acabar com esse conceito porque acham que deve recair sobre países como Índia, China, Brasil e África do Sul a responsabilidade maior. E, evidentemente, esses países não aceitam. Argumentam que os países desenvolvidos são os maiores emissores de gases poluentes, atual e historicamente, e que têm um poder aquisitivo muito grande, cabendo a eles a parte principal dessa responsabilidade pelo combate ao aquecimento global. É preciso considerar que os países em desenvolvimento, além de não serem os maiores responsáveis pelas emissões, têm a necessidade de se desenvolver para resolver seus problemas sociais, para criar condições de resolver o problema da fome, da distribuição da renda. Eles não podem tomar medidas que impliquem a contenção de seu desenvolvimento.

Grabois.org – Recentemente alcançou-se na cidade de Nagoya, no Japão, acordo em torno da Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB) da ONU. Isso não cria um clima de otimismo em relação a Cancun? Ou se trata de coisas diferentes?

Aldo Arantes – São coisas diferentes. É evidente que a Convenção sobre Biodiversidade está relacionada ao tema das mudanças climáticas, mas ela lida com fatores que não são os determinantes. No caso das mudanças climáticas o problema é a emissão de gases poluentes, que tem a ver com o uso de energia e, em particular, com fontes como o petróleo. E isso aí, com a crise mundial que persiste, sobretudo nos Estados Unidos (EUA) – que não aceitam tomar medidas restritivas com relação a seu desenvolvimento – passa a ser a questão-chave de qualquer negociação. Tanto que lá em Copenhague a responsabilidade maior pelo fracasso (fato denunciado pelo próprio presidente Lula) foi dos EUA. Eles não aceitaram nenhum tipo de negociação que estabelecesse metas mais claras para os países desenvolvidos. E ainda exigiam, juntamente com os países europeus, metas para os países em desenvolvimento.

Penso portanto que, embora sejam assuntos correlatos, há uma diferença crucial: a redução dos gases poluentes incide diretamente nos ritmos de desenvolvimento dos diversos países. E, com esta crise mundial que está aí, ninguém aceita tomar qualquer medida restritiva do ponto de vista econômico. Os grandes grupos econômicos que estão sediados nos países desenvolvidos não aceitam medidas desse tipo. Prova disso é a argumentação desenvolvida pelo governo Obama em Copenhague. Ele afirmou que não aceitaria a imposição de metas mais ambiciosas porque os setores produtivos dos EUA não acatariam, e o Congresso americano não aprovaria tais normas.

Grabois.org – Que razões motivaram a realização do Seminário Internacional Mudanças Climáticas?

Aldo Arantes – Esse seminário é uma iniciativa muito importante adotada pela Fundação Maurício Grabois, ligada ao Partido Comunista doBrasil (PCdoB). Nosso partido adotou, a partir de seu 11º Congresso e, particularmente, no 12º Congresso, uma decisão firme no sentido de colocar a questão ambiental como parte de um novo projeto nacional de desenvolvimento. O socialismo, em uma perspectiva contemporânea – o chamado “socialismo do século 21” –, deve incorporar a bandeira da luta ambiental na mesma medida em que incorpora as bandeiras da igualdade racial e da igualdade de gênero. Em função disso nosso partido resolveu criar uma Secretaria Nacional de Meio Ambiente, e essa secretaria realizou uma série de eventos, como o Seminário Nacional de Meio Ambiente e o Seminário sobre a Amazônia, além de seminários sobre o Centro-Oeste, sobre as cidades e sobre a nova proposta de Código Florestal.

Houve um conjunto de iniciativas que nos levaram, por assim dizer, a duas conclusões. A primeira é concernente à necessidade de aprofundar o entendimento sobre a relação entre meio ambiente e desenvolvimento, entre preservação ambiental e ampliação das conquistas sociais. Esse tripé – meio ambiente, desenvolvimento e conquistas sociais – precisava ser melhor compreendido, e essa questão sempre foi pouco pesquisada e trabalhada na esquerda. Havia uma posição unilateral de defesa do meio ambiente em contradição com um projeto mais abrangente, capaz de incorporar a questão do desenvolvimento. Ou, no extremo oposto, uma visão desenvolvimentista predatória. Para estudar melhor essas questões resolvemos criar o Instituto Nacional de Pesquisas e Defesa do Meio Ambiente (INMA), que já está estruturado e será lançado publicamente ao final do Seminário.

Outra grande conclusão a que chegamos diz respeito à preocupação com as mudanças climáticas, questão que tem sido levantada com muita força. Há uma série de documentos da China em que eles levantam essa questão como fator de risco para o futuro da humanidade. Os chineses estão estudando de forma muito séria essa questão. Há dois ou três anos atrás eles tiraram uma resolução de governo que propugna um maior investimento em pesquisas sobre mudanças climáticas. E você sabe: chinês não brinca em serviço! Então hoje eles já lograram obter um acúmulo muito grande. Além disso, vários líderes mundiais, como o Fidel Castro, têm enfatizado essa questão das mudanças climáticas e do aquecimento global como algo que preocupa o conjunto da humanidade. Com isso, colocou-se também para nós a necessidade de aprofundamento dessa questão, o que temos procurado fazer em parceria com os outros partidos e suas fundações, bem como com os movimentos sociais. Buscamos uma posição mais sólida, para além dos argumentos superficiais que às vezes são levantados.

Grabois.org – Qual o temário do evento?

Aldo Arantes – O Seminário tem basicamente três vertentes: uma relacionada aos estudos científicos, aos fundamentos científicos das mudanças climáticas. Para tratar desse tema resolvemos investir pesado. Conseguimos financiamento da Petrobrás Biocombustível, da Agência Nacional do Petróleo (ANP) e do Ministério do Meio Ambiente e estamos trazendo um cientista da China, o Prof. Dr. Jiang Tong (do Centro Nacional de Mudanças Climáticas e da administração meteorológica da China), que está sintonizado com os avanços empreendidos pelo Governo chinês. Estamos trazendo também o Dr. Bilal Haq, maior especialista mundial no estudo da influência dos oceanos sobre as mudanças climáticas. Contaremos ainda com o professor Carlos Nobre, coordenador da Rede Brasileira de Pesquisas das Mudanças Climáticas e presidente do Painel Brasileiro de Mudanças Climáticas. O professor Nobre é, no Brasil, uma das pessoas mais destacadas no estudo dessa questão.

Em um outro painel teremos cientistas como Luis Fernandes (presidente da Finep) e Luiz Carlos Molion (membro do Grupo Gestor da Comissão de Climatologia da Organização Meteorológica Mundial), representando a América do Sul.

Estamos trazendo ao debate uma vertente política, para ver como essa questão repercute nos diversos países e nas instituições brasileiras. Teremos um painel sobre políticas públicas para as mudanças climáticas, com o professor Luiz Pinguelli Rosa (Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas), o Miguel Rossetto (Petrobras Biocombustível), o Allan Kardec Duailibe (Diretor da ANP), o Marcos Aurélio Vasconcelos de Freitas (Rede Brasileira de Pesquisas das Mudanças Climáticas) e o Carlos Alberto Muniz (Secretaria de Meio Ambiente do Rio de Janeiro).

Em um outro momento contaremos com representantes dos ministérios afins à questão, como o da Ciência e Tecnologia, cujo secretário executivo, Luiz Antonio Elias (um dos criadores do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo – MDL), está confirmado. Para a mesa de abertura teremos as presenças do ministro da Secretaria de Assuntos Estratégicos, da ministra do Meio Ambiente e do embaixador Figueiredo, representando o Ministério das Relações Exteriores. Figueiredo é um negociador do tema, na verdade o coordenador das negociações em Copenhague. Uma pessoa altamente destacada, de expressão internacional, que desde o início se interessou não apenas pelo Seminário como também pelo Instituto.

Um outro painel lidará com as políticas governamentais voltadas à COP-16. Nela teremos a presença de representantes de Cuba, China, Índia e Brasil, nesse último caso uma indicação da Casa Civil. Será uma mesa mais focada na posição dos governos com relação à COP-16.

Haverá, por último, uma mesa sobre a visão dos movimentos sociais. Aí teremos representantes de entidades como CUT, CTB, UNE, Conan e MST. E, ao final, faremos o lançamento do INMA, que será um fator de aglutinação, com caráter suprapartidário. Buscaremos incorporar pessoas que estão preocupadas com essa luta e esse compromisso. Farão parte do Conselho do Instituto pessoas como o Luiz Pinguelli Rosa, o embaixador Luiz Alberto Figueiredo, o Luis Fernandes, a deputada reeleita Jandira Feghali e o Prof. Dr. Carlos Walter Porto-Gonçalves (UFF), além de um conjunto de outras pessoas.

Enfim, penso que esse Seminário será um marco no processo de preparação, para essa discussão, das fundações, dos partidos políticos e dos movimentos sociais. Com isso a Fundação Grabois dá sua contribuição para avançar nesse debate sob uma ótica de classe, exatamente como já fizemos nas lutas pela igualdade racial e pela igualdade de gênero.

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