Os Diálogos Criativos discutirão o preconceito contra o Nordeste
Durante e depois das últimas eleições presidenciais, o preconceito contra as regiões Norte e Nordeste por parte de certos setores das sociedades do Sudeste e do Sul do Brasil, um fenômeno há muito tempo latente, emergiu com força inusitada – amplificado pelas redes sociais da Internet – e ganhou cada vez mais concretude a ameaça de uma legitimação política destas visões e atitudes.
Publicado 06/12/2010 10:13 | Editado 04/03/2020 17:08
Se trata de sinais preocupantes que lembram processos históricos análogos como, por exemplo, o que ocorreu na Itália em meados dos anos 1990. Naquela época o partido político Lega Nord (Liga Norte), que pregava a separação das regiões mais industrializadas do Norte do país do Sul pobre e flagelado pelo crime organizado alegando ideais de matriz nazi-fascista quais a “superioridade da raça” e canalizando pulsões, instintos e sentimentos por muitas décadas cultivados na sociedade, mas unanimemente execrados por todas as forças políticas democráticas, ganhou legitimidade política ao ser aceito como membro de uma coalizão de centro-direita que disputou e ganhou as eleições, sendo projetado improvisamente das margens do processo democrático ao governo da nação. Após esta legitimação, o partido cresceu até o ponto de ter se convertido em pouco mais de uma década em uma das principais forças políticas italianas e, além de continuar a governar o país dentro da coalizão governamental que ainda hoje está no poder, administra algumas das suas mais importantes regiões e cidades, promovendo nestas últimas políticas gritantemente discriminatórias contra imigrantes procedentes de países pobres, políticas que apesar de marcadamente anti-constitucionais não só não indignam nem espantam a maioria da população, como recebem em vários casos uma ampla aprovação.
Existe um risco análogo no Brasil? As tendências manifestadas por representantes de algumas forças políticas, que em declarações públicas ou em ambientes virtuais acataram leituras da eleição de Dilma Rousseff a Presidenta da República que atribuem ao “atraso” de regiões como o Nordeste e aos programas sociais do Governo Lula o triunfo da candidata, esquecendo ou não considerando deliberadamente dados que apontam que ela teria ganho as eleições mesmo sem os votos dos nordestinos e que mudanças sociais profundas e substanciais acontecidas nos últimos anos, bem além do tradicional “assistencialismo”, estão na raiz da popularidade dela nestas regiões, parecem justificar o temor de que aqui também possam ganhar legitimidade política e entrar de cabeça erguida no jogo democrático visões, atitudes e sentimentos explicitamente xenófobos.
Diferentemente do que se pensa, as manifestações de preconceito anti-nordestino emersas no decorrer das últimas eleições presidenciais e imediatamente depois delas não são uma novidade. Já em 2006, como mostra uma reportagem da edição de novembro e dezembro daquele ano da revista da organização-não-governamental de promoção da cidadania Ibase, a campanha contra a reeleição de Lula foi desenvolvida da mesma forma agressiva e preconceituosa. Também naquela época uma parte da campanha de oposição estabeleceu uma cisão entre “letrados” e “analfabetos”, os primeiros necessariamente contrários a Lula devido ao seu nível de “educação” e “inteligência”. Da mesma forma em que hoje a ampla vitória de Dilma Rousseff em regiões com enormes bolsões de pobreza é atribuída ao “paternalismo”, supostamente ancorado no analfabetismo e em programas como o Bolsa Família, negando a possibilidade de um voto consciente por partes dos “pobres” nordestinos.
O Brasil não corre o risco de ser dividido: já nasceu assim. Começamos nossa história com uma gigantesca fratura racial e de classe que permanece até hoje, na prática e no imaginário social: senhores brancos proprietários de grandes extensões territoriais e detentores de um imenso poder e uma enorme massa de índios e de negros importados da África, considerados subumanos e escravizados. Desde o começo da nossa história a ética predominante é a da exclusão social, que se traduz também em exclusão – e conseqüentemente discriminação – racial.
Para discutir de forma aberta como se constituiu historicamente o preconceito anti-nordestino, como evoluiu, como se manifesta e os perigos que acarreta para o futuro do Brasil, o projeto cultural Diálogos Criativos – que tem o apoio editorial da TRIBUNA DO NORTE – organizou mais um instigante encontro intitulado “Preconceito contra o Nordeste: quem quer dividir o Brasil”? O encontro, aberto a todos e com entrada franca, acontecerá na próxima quarta-feira, dia 08 de dezembro, a partir das 19:00 horas no Auditório da Livraria Siciliano, no terceiro piso do Midway Mall. Todos os participantes, como de costume, terão direito a um café expresso gourmet de cortesia oferecido pelo Café Genot, parceiro do projeto.
Para mais informações, visitem o blog http://dialogoscriativosnatal.blogspot.com ou escrevam para [email protected].
Jornal Tribuna do Norte