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Alejandro Nadal: O estrepitoso fracasso do G-20

A reunião do G-20 na Coreia concluiu num estrepitoso fracasso. O comunicado superficial está cheio de erros e promessas falsas. É um mau presságio do que virá.

Por Alejandro Nadal, no La Jornada

Para começar, não se chegou a nenhum acordo sobre os problemas mais importantes que afetam a economia mundial, nem sequer no que se refere à chamada guerra de divisas. No seu comunicado final, os líderes do G-20 acordaram fortalecer a flexibilidade nos tipos de cãmbio para que reflictam de forma mais precisa os traços fundamentais das economias, e deixaram claro que procurarão que as forças do mercado determinem as paridades.

Há dois problemas com estas ideias. Primeiro, os fluxos de capital e as políticas de esterilização fazem com que a ideia de um mercado no qual se fixa de forma mais certeira a paridade cambial seja uma quimera. Não existe tal mercado no qual se chega a determinar algo como um tipo de câmbio de equilíbrio. O que sim existe é um espaço econômico apto para dar renda solta à especulação.

Segundo, a flexibilidade cambial não serve como indicador sobre o estado de saúde de uma economia. Mostra disso é precisamente a economia mexicana, na qual os fluxos de capital permitiram manter um peso "forte" no contexto de uma economia doente. A razão é que, com uma liberalização financeira absoluta, os fluxos de capital respondem mais aos diferenciais de rendimentos reais entre economias que a outra coisa. A sua preferência pela nossa não é mais que um reflexo dos baixíssimos (ou nulos) rendimentos reais noutros países.

A verdade é que aquelas linhas foram inseridas no comunicado final por insistência dos Estados Unidos e estavam dirigidas à China, país que regularmente intervém para manter a sua moeda subvalorizada. Mas Pequim insiste em que a sua política cambial se orienta no sentido indicado pelo comunicado final.

Por outro lado, os líderes do G-20 condenaram solenemente levar a cabo desvalorizações competitivas das suas divisas. Esta passagem é incluída para recordar aos Estados Unidos que muitos países não vêem com bons olhos a sua política monetária hiperflexível e, em particular, a injeção de liquidez recentemente anunciada pela Reserva Federal. Diz-se que a delegação estadunidense quis mudar a palavra "desvalorização" por "subvalorização". Isso era algo mais que um refinamento semântico, pois o que procurava era desviar o ônus da mensagem para Pequim.

A realidade é que praticamente a única medida construtiva para contrariar a recessão é precisamente a flexibilização quantitativa da Fed. Talvez não seja o melhor no contexto atual nos Estados Unidos, mas, como dizem muitos experimentados analistas (incluindo Nouriel Roubini e Chris Whalen), tendo em conta que não haverá outro estímulo fiscal, é já quase a única coisa que se pode tentar.

Claro, a flexibilização quantitativa faz com que se reduza o valor do dólar e se apreciem o euro e o iuane. E no G-20 deixou-se notar o mal-estar. No entanto, as coisas piorariam se a economia estadunidense contraísse ainda mais, porque as exportações do resto do mundo sofreriam. Não se pode deixar todo o mundo contente ao mesmo tempo.

Antes da reunião, o presidente do Banco Mundial, Robert Zoellick, publicou um artigo na primeira página do Financial Times fazendo um apelo para introduzir um novo sistema monetário mundial baseado num padrão ouro modificado e num papel menos importante para o dólar. Neste artigo reconhece que o sistema monetário que emergiu da conferência de Bretton Woods deixou de ser viável. O novo sistema monetário estaria baseado em relações de cooperação e deveria incorporar o euro, o iene, a libra esterlina e o iuane, juntamente com o dólar, como as moedas de reserva internacional. As regras da nova ordem continuariam a estar baseadas na liberalização financeira e o ouro seria a referência para as expectativas sobre inflação e deflação, bem como para a paridade real dessas moedas.

Zoellick argumenta que a sua proposta está baseada no reconhecimento do papel das potências emergentes e dos rivais do dólar na economia mundial. Mas não diz nada sobre as verdadeiras causas da decadência do dólar como a principal ou dominante moeda de reserva internacional. Em particular, não toma em conta o fato fundamental de que a utilização destas unidades como referentes das transações e pagamentos internacionais é uma forma de perpetuar a contradição que acarreta usar moedas nacionais como reserva internacional. É o que o G-20 não pode reconhecer.

A verdade é que assistimos à desintegração de um sistema monetário mundial. A experiência histórica diz-nos que as transições para novos sistemas monetários internacionais têm estado associadas com guerras de grandes dimensões. O fracasso do G-20 está na sua incapacidade para reconhecer a necessidade de transitar de forma pacífica para um novo esquema de relações monetárias internacionais.

Fonte: Informação Alternativa