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Emir Sader: Obama e Lula

A perda rápida de prestígio de Obama revela duas coisas: a primeira é que se pode ganhar eleição centrado no marketing, mas não se pode governar centrado no marketing. A segunda é que não se muda a mentalidade conservadora, forjada durante décadas, em uma campanha eleitoral, embora se possa avançar nessa direção, contanto que esses avanços sejam consolidados por politicas governamentais.

Blog do Emir Sader, em Carta Maior

Apesar do enorme apoio popular e mesmo dos meios de comunicação e do apoio irrisório com que contava Bush no momento das eleições, Obama venceu por uma margem pequena de votos – 4%. O que refletia a enorme virada conservadora que os EUA tinham sofrido várias décadas antes – desde a vitória de Nixon, em 1968, apelando para a chamada “maioria silenciosa”.

Não apenas a opinião publica deu uma virada conservadora, como as estruturas de poder – da Justiça à educação – que passaram, por sua vez, a consolidar um pensamento de direita no conjunto da sociedade.

Na presidência, Obama não se mostrou à altura das suas promessas. Salvou o sistema bancário, com a ilusão de que este salvaria o país e deixou abandonadas as vítimas principais da crise: os desempregados e os devedores das hipotecas bancárias. Na política externa, mudou a linguagem, mas não os pontos essenciais da estratégia imperial: Cuba, Guantanamo, Iraque, Afeganistão.

Foi penalizado, à esquerda – com a abstenção e a desilusão – e à direita – com forte mobilização conservadora – e perdeu a maioria eleitoral, ficou em minoria na Câmara, terminando penosamente sua lua-de-mel com o eleitorado.

O marketing tinha possibilitado sua vitória, mas ela não se consolidou com política que se enfrentasse à hegemonia conservadora na sociedade, mesmo dispondo da crise social para demonstrar políticas distintas de enfrentamento da crise.

No Brasil, ao contrário, o marketing eleitoral foi positivo, porque se assentava em um governo enraizado fortemente nas camadas majoritárias da população, beneficiárias das politicas sociais.

A comparação entre os governos FHC e Lula era inquestionavelmente favorável a este, em todos os níveis. Daí que a oposição buscou um atalho para chegar a setores da população através da exploração de preconceitos de caráter religioso. A retomada da esfera politica como essencial, determinou finalmente a vitória de Dilma.

A diferença entre Lula e Obama é que, com o primeiro, o marketing está apoiado em medidas concretas de um governo de caráter popular, cujas políticas defenderam os direitos da população durante a crise e estendem esses direitos com seu modelo econômico e social.

Por isso Lula saiu vitorioso e Obama foi derrotado. Lula fortaleceu os bancos públicos para combater a crise, enquanto Obama confiou em que a recuperação dos bancos privados em crise alavancaria a recuperação da economia, se equivocou e foi derrotado.

Uma imagem eleitoral pode ser construída tecnicamente, porém só se sustenta se estiver apoiada em um governo e em uma liderança sólida e coerente politicamente.

Emir Sader, sociólogo e cientista, mestre em filosofia política e doutor em ciência política pela USP – Universidade de São Paulo.