Sem categoria

Theófilo Rodrigues: Caminhos da reforma política

A reforma política parece querer protagonizar o início das discussões deste novo Congresso. A própria presidenta Dilma Rousseff, em sua mensagem ao Congresso apresentou sua disposição em ajudar a aprovação da reforma política ainda neste ano. O mesmo havia sido feito pelo presidente Lula quando afirmou no fim do ano passado que a sua prioridade em 2011 seria a aprovação da reforma política (1).

*Por Theófilo Rodrigues

Com seu faro agudo para grandes oportunidades políticas, o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), acaba de criar uma comissão presidida pelo senador Francisco Dornelles (PP-RJ) que deverá apresentar em 45 dias uma proposta de reforma política. Sarney parece seguir aquela máxima: “faça a revolução antes que algum aventureiro lance mão”.

Além de Dornelles participarão desta comissão os seguintes senadores: Fernando Collor (PTB-AL), Itamar Franco (PPS-MG), Roberto Requião (PMDB-PR), Aécio Neves (PSDB-MG), Jorge Viana (PT-AC), Luiz Henrique da Silveira (PMDB-SC), José Wellington Barroso de Araújo Dias (PT-PI), Eduardo Braga (PMDB-AM), Demóstenes Torres (DEM-GO), Antônio Carlos Valadares (PSB-SE), Pedro Taques (PDT-MT), Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM), Lúcia Vânia (PSDB-GO) e Ana Rita Esgario (PT-ES).

A reforma política é ampla, envolvendo diversos temas como financiamento de campanhas, reeleição, suplência de senadores, obrigatoriedade do voto, troca de legendas, entre outros temas. Apresento abaixo apenas as possibilidades que envolvem uma parte da reforma política: a reforma eleitoral.

A reforma eleitoral trata prioritariamente de alterar a forma como elegemos nossos representantes. Existem duas grandes formas de sistemas eleitorais: o voto proporcional e o voto majoritário. O voto proporcional pode ser dividido em 3 modelos : lista fechada; lista aberta; e lista flexível. O voto majoritário também pode ser dividido em 3 modelos: distrital uninominal; distrital plurinominal; e distritão. Existem ainda os sistemas mistos, que casam formas diferentes em um mesmo modelo.

Voto em lista aberta

O voto em lista aberta é o modelo atual do sistema eleitoral brasileiro. Foi implementado no Brasil nas eleições de 1945. Neste modelo cabe apenas ao eleitor definir o nome dos candidatos que serão eleitos. A conseqüência acaba sendo a “personalização” da política, já que cada partido é obrigado a ter nomes de personalidades famosas para “puxar” votos. Em todo o mundo, apenas 4 países adotam este sistema: Brasil, Chile, Finlândia e Polônia.

Voto em lista fechada

Outra forma de voto proporcional se dá através do voto em lista fechada. Segundo o professor Jairo Nicolau, “a lista fechada é o sistema mais usado entre as novas democracias que optaram pela representação proporcional: Argentina, Bulgária, Portugal, Moçambique, Espanha, Turquia, Uruguai, Colômbia, Costa Rica, África do Sul e Paraguai”.
Neste modelo cada partido apresenta uma lista com a ordem dos candidatos que assumirão de acordo com a quantidade de votos que o partido receber. Alguns dizem que com o voto em lista fechada o eleitor não tem como decidir quem é o melhor candidato, o que é um argumento falso. A lista fechada deve ser decidida em prévias partidárias, ou seja, todos os filiados votam para definir a ordem da lista. A lista, portanto, não é definida pelas elites de cada partido, mas sim pelo conjunto dos filiados de cada partido.

A Lista fechada pode permitir ainda que haja uma grande diversidade entre os eleitos. Com a lista pode haver cotas para mulheres, jovens, negros etc. O movimento feminista, por exemplo, pretende colocar, caso a lista fechada seja aprovada, um rodízio entre homens e mulheres na ordem da lista. O professor Nicolau nos mostra, por exemplo, que na África do Sul “a lista fechada garantiu a eleição de um legislativo diversificado em termos étnicos”. Outra vantagem do sistema de voto em lista fechada é que apenas com ele é possível haver o financiamento público de campanha. O voto em lista fechada é defendido por PT, PCdoB, PSOL e DEM.

Voto em lista flexível

O voto em lista flexível é um modelo adotado em diversos países, mas que não encontra muitos defensores no Brasil. Neste modelo o partido apresenta uma lista, mas esta lista pode ser alterada durante a votação. Em “Sistemas eleitorais”, o cientista político Jairo Nicolau nos ensina que existem duas formas do eleitor alterar a lista: “assinalando o nome da lista (Bélgica, Holanda, Dinamarca e Grécia); ou reordenando a lista segundo suas preferências (Áustria, Noruega e Suécia).

Voto Distrital Uninominal

O voto distrital é defendido no Brasil com veemência pelo PSDB. No voto distrital, cada estado é dividido em uma certa quantidade de distritos. Cada distrito elege através do voto majoritário o seu representante. Os defensores do voto distrital afirmam que esse modelo aproxima os eleitores dos eleitos. Entretanto, com o voto distrital apenas a maioria de cada distrito será representada. O voto distrital acaba, portanto, com a representação das minorias no Congresso.

Voto Distrital Plurinominal

Outra modalidade de voto distrital é o plurinominal. Neste modelo, cada distrito possui uma certa quantidade de vagas. Estas vagas são preenchidas pelos mais votados. Alguns consideram este modelo de voto distrital plurinominal como o modelo majoritário mais próximo da proporcionalidade.

Voto Distritão

O chamado “voto distritão”, invenção institucional proposta pelo senador Francisco Dornelles (PP-RJ) e apoiado pelo vice-presidente Michel Temer, é um modelo que se for aprovado só existirá no Brasil. O “distritão” mantém a forma como votamos atualmente. A diferença é que serão eleitos os mais votados, ou seja, acaba com a proporcionalidade do voto. Favorece, portanto, os famosos “puxadores de votos”, o voto personalista e os grandes partidos. Tendem a apoiar esta proposta o PMDB e o PP.

Voto misto

O sistema misto é aquele que utiliza em uma mesma eleição duas formas para eleger os representantes. Uma parte é eleita através de alguma forma de voto proporcional e a outra parte é eleita por alguma forma de voto majoritário. As possibilidades são as mais diversas combinações. Os dois maiores exemplos de países que utilizam sistemas mistos são a Alemanha e o México. O sistema misto pode ser uma forma encontrada pelo Congresso para não desagradar nenhum dos partidos políticos.

Conclusão

Ao que tudo indica a maior parte dos parlamentares parece estar disposta a aprovar alguma forma de voto majoritário. Um caminho que favorece apenas às grandes legendas e os votos personalistas. Um caminho que acabará com a necessária diversidade do parlamento. A ideia de que qualquer reforma política será melhor do que manter tudo do jeito que está é equivocada. Uma reforma política que acabe com a pluralidade de ideias é o pior dos caminhos. Ou seja, é melhor não ter reforma política do que ter esta reforma que introduza o voto majoritário no Brasil.

Nota:

(1) Referência utilizada para a construção deste artigo:
NICOLAU, Jairo. Sistemas Eleitorais. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2004.

* Theófilo Rodrigues é mestrando em ciência política pela UFF.

Fonte: Blog Fatos Sociais