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O poder de uma devassa: por que associaram Sandy a uma cerveja

As ações de marketing, apesar de cada vez mais embasadas em pesquisas junto aos consumidores, continuam tendo algo de mágico. Por mais que se aumentem as fontes de informação para a tomada de decisão, ao final elas ainda se resumem a uma escolha: um caminho, normalmente sem volta, que é definido pelos estrategistas da marca.

Por Marcos Bedendo*, no m&m online

A Devassa fez mais uma dessas escolhas ao anunciar Sandy como sua garota-propaganda para o carnaval de 2011. De tão inusitada, tornou-se alvo de discussões acaloradas entre aqueles que gostaram, os que criticaram e os que admitiram simplesmente não entender.

A associação entre uma marca e um personagem, seja ele real ou fictício, é comum e muito usada para a criação de uma “personalidade de marca”. Ela constrói ou escolhe um porta-voz e incorpora as suas características à sua própria imagem.

A Nike é exemplo de empresa pioneira – não no uso de celebridades – na maneira como incorporou estes atributos à sua marca e também aos seus produtos, transformando-a em sua estratégia global. Ao aproveitar um momento único de expansão da NBA e da cultura norte-americana do basquete ao redor do mundo, a Nike se associou ao seu astro maior, Michael Jordan, um exemplo de sucesso, qualidade, superação, integridade e técnica que a marca incorporou aos seus próprios valores e produtos.

Com isso, passou a ser a empresa líder no desenvolvimento de sistemas de amortecimento e propulsão para tênis. E transformou o produto em símbolo desta união: o Nike Air Jordan, um ícone que todo adolescente e jovem adulto, mesmo aqueles que não jogavam basquete, queriam possuir.
O uso de uma personalidade para comunicar seus atributos foi a estratégia que a Devassa escolheu para o lançamento nacional da sua marca em 2010. Ao escolher Paris Hilton, a socialite americana conhecida pelo seu comportamento irresponsável, hedônico, transgressor, surpreendente e inesperado, a Devassa incorporou essas características.

A marca também escolheu o momento do carnaval para iniciar a campanha, o que por si só também incorpora valores de alegria, descontração, festividades e excessos. Ao explorar ao limite a sensualidade em seus anúncios de lançamento, a ponto de ter comunicações proibidas pelo Conar, a cerveja demonstrava que estava em sintonia com a sua personagem e com a época do ano que resolveu se apropriar.

Desta forma passou do total desconhecimento para uma personalidade distinta e facilmente reconhecida: uma cerveja transgressora, moderna, festeira, surpreendente e com atitudes inesperadas. E não seria tão inesperada para uma marca com estas características a contratação de Sandy como garota-propaganda?

“Todo mundo tem um lado devassa”, diz o texto do anúncio. Ou seja, a cerveja está aí para corromper. E quem não é passível de ser corrompido, se até a Sandy, nesta época de carnaval, pode pintar os seus cabelos, tradicionalmente morenos, para ficar “Bem Loura”? “Todo mundo tem um lado descontraído, desencanado, desinibido”, diz a propaganda. Alguma mentira aí?

A imagem de devassidão da Devassa não é tão inatingível quanto a da ex-garota-propaganda. Ela está aí, ao alcance de todos os potenciais consumidores, especialmente nesta época do ano. Neste ponto, as suas associações de marca não são refeitas, apenas reforçadas.

A Devassa parece não ter o poder de investimento suficiente para se manter em alta na mídia durante todo o ano. Mas tem conseguido se apropriar de maneira relevante do momento do carnaval. Roubou a cena das demais cervejarias no ano passado com a Paris Hilton, e o faz novamente este ano com a Sandy.

Ao que parece, a marca ainda tem muito a ganhar com toda a exposição obtida em função de sua nova garota-propaganda. A maneira com que a cerveja transforma até a Sandy em “devassa” faz com que seus valores de marca permaneçam ativos e consistentes na cabeça dos consumidores. E quem sabe, com investimentos mais intensos, a exemplo daqueles feitos pela Nike no passado, esta marca consiga romper a barreira de ser apenas uma “paixão de carnaval”.

*Marcos Bedendo é professor de gestão de marcas na graduação ESPM-SP