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Desastres naturais no Japão devem repercutir na economia da Ásia

As paralisações na economia japonesa após o terremoto e o tsunami devem repercutir pela Ásia nas próximas semanas, tornando o cenário econômico região ainda mais imprevisível num momento em que seus países já enfrentam a alta do petróleo e dos alimentos.

A Ásia ainda deve ter crescimento vigoroso este ano, com estimativas de expansão do PIB de 7,5% a 8%, sem contar o Japão. Mas o crescimento vai diminuir em relação a 2010, quando a expansão do PIB regional superou 9%, numa forte recuperação da crise financeira em que os bancos centrais tiveram até de aumentar os juros para forçar as pessoas a conter os gastos e assim combater a inflação.

As catástrofes naturais no Japão adicionam mais incerteza a esse cenário, ao menos no curto prazo. O terremoto de sexta-feira dizimou a infraestrutura vital de partes do Japão e pode deixar muitas fábricas sem fontes confiáveis de eletricidade por semanas, prejudicando a cadeia de suprimentos de alguns dos maiores exportadores da Ásia. Entre as fábricas fechadas estão instalações que produzem aço, papel e componentes eletrônicos.

"Os portos estão fechados e as remessas foram afetadas, especialmente na indústria de produtos elétricos – os contêineres estão parados nos portos", disse Fu Wing Hoong, presidente da Associação de Eletroeletrônicos da Malásia, importante produtora de componentes eletrônicos, incluindo alguns que dependem de peças feitas no Japão. "Qualquer paralisação no setor eletrônico do Japão certamente terá um impacto."

Recuperação

Economistas disseram que a boa notícia é que os fortes gastos com a reconstrução ajudarão a recuperar a economia do Japão, o que pode resultar numa expansão da demanda de alguns produtos asiáticos como madeira e outras commodities. Mas a expectativa é que qualquer recuperação só ocorra mais para o fim do ano, enquanto que para os próximos dois trimestres a previsão é de desaceleração severa e talvez até contração.

O comércio entre o Japão e outros países asiáticos pode cair fortemente no curto prazo, disse Tim Condon, economista focado em Ásia do ING em Cingapura. Juntamente com outros problemas como a alta inflação, isso significará que "a próxima rodada de revisões das expectativas de crescimento da Ásia será para baixo", disse ele.

Economia regional

O Japão segue sendo parte crucial da economia regional, apesar de recentemente ter perdido para a China o posto de segunda maior economia do mundo, atrás dos EUA. O país é a maior fonte de investimento estrangeiro direto em partes da Ásia e importante gerador de receita turística, especialmente em países como a Tailândia, que recebe cerca de 1 milhão de turistas japoneses por ano. O Japão também é uma fonte importante de remessas de recursos para as Filipinas, que tem mais de 200 mil cidadãos trabalhando no Japão, inclusive nas áreas mais atingidas.

O Japão é ainda um dos parceiros comerciais mais importantes dos países da Ásia e Oceania, comprando boa parte do minério de ferro, carvão, gás natural e outras commodities produzidas pela Indonésia, Austrália e outros países, recebendo assim 10% das exportações da Ásia, diz Condon, da ING.

Economia mundial

Num relatório para clientes, o J.P. Morgan argumentou que o terremoto "se somou à série crescente de choques que estão atingindo a economia mundial no início de 2011", como a alta do petróleo e dos alimentos e o forte inverno nos EUA e na Europa. O banco diminuiu na sexta-feira (11), pela segunda vez em duas semanas, a sua previsão de crescimento dos EUA no primeiro semestre e informou que pode rebaixar ainda mais as previsões "de outros países nos próximos dias", embora tenha enfatizado que muitas das suas preocupações podem se provar efêmeras.

Os problemas no Japão "vão atingir a economia mundial e repercutir na gente", disse o ministro das Relações Exteriores de Cingapura, George Yeo, em reunião regional no fim de semana. Juntamente com as incertezas no Oriente Médio, "acho que o mundo está entrando numa nova fase. Temos de estar muito alertas e não podemos ser confiantes demais e tirar conclusões levianamente", disse.

Bolsa

A Bolsa de Tóquio teve nesta segunda-feira (14) a maior queda em mais de dois anos, e caíram também os índices de Austrália e Taiwan. Mas as bolsas da China, de Hong Kong e da Coreia do Sul subiram. Ações de algumas empresas de metais e materiais de construção subiram, na expectativa de que se beneficiarão dos gastos com a reconstrução.

As ações de mineradoras australianas de urânio caíram com o temor de que a demanda por energia nuclear vá diminuir depois do desastre de sexta-feira. Na China, autoridades e analistas disseram acreditar que a economia do país será afetada apenas marginalmente pelas consequências do terremoto. Mas eles alertaram que a incerteza do mercado pode levar o governo a adiar mais medidas de aperto monetário e qualquer crise prolongada no Japão pode gerar problemas maiores.

China

As economias da China e do Japão são interligadas em tudo, de automóveis à produção de eletrônicos, do turismo ao comércio de aço. A China tem se tornado nos últimos anos um centro de montagem de eletrônicos japoneses, já que as empresas japonesas começaram a buscar os menores custos de produção do país para se manterem competitivas. A China é o país que mais recebe exportações japonesas, e o Japão é o terceiro maior destino das exportações da China, segundo um relatório do Bank of America Merrill Lynch.

A China também pode ser suscetível a flutuações no mercado de petróleo, especialmente porque o Japão e outros países podem impulsionar a demanda por combustíveis fósseis nos próximos meses diante das dúvidas crescentes sobre a energia nuclear, motivadas por uma série de problemas em usinas japonesas danificadas pelo tsunami.

"O Japão terá de usar mais combustíveis fósseis como petróleo e carvão, o que vai impulsionar o preço dos combustíveis fósseis no curto prazo", disse Gao Shixian, do Centro de Pesquisa de Energia da Comissão Nacional de Desenvolvimento e Reforma, a principal agência de planejamento econômico da China.

Reconstrução

Alguns países temem a possibilidade de os recursos investidos pelo Japão no desenvolvimento de outros países serem atrasados ou cancelados. Há muito tempo que esses recursos são uma fonte importante de capital para projetos de infraestrutura nos países mais pobres da região. O Japão está ajudando a pagar a construção de um sistema de transporte público em Jacarta, bem como usinas geotermais e termelétricas, entre outros projetos. O presidente do Senado das Filipinas, Juan Ponce Enrile, disse numa entrevista no rádio durante o fim de semana que teme atrasos no recebimento de recursos de desenvolvimento do Japão por causa do desastre. "Eles vão usar o dinheiro na reconstrução, então o compromisso com a gente vai demorar mais, atrasando portanto nossos projetos de desenvolvimento", disse ele.

Os analistas notaram também que algumas empresas podem ser chamadas para fornecer mais produtos para o Japão, como mineradoras de carvão, produtoras de madeira, siderúrgicas e talvez até algumas empresas de gás natural.

Fonte: Valor Econômico