Valton Miranda: Natureza furiosa

Durante milênios a humanidade acreditou que fenômenos naturais como furações, trovões e terremotos eram a resposta punitiva dos deuses à insanidade, crueldade e perversões dos homens.

A erupção vulcânica que submergiu na lava fumegante a cidade de Pompéia, em 79 d.C., foi atribuída à devassidão moral dos seus habitantes como biblicamente já se atribuíra a destruição de Sodoma e Gomorra à mesma causa. Na mitologia grega as fúrias ou Erínias que penetravam na mente humana causando loucura como no caso de Orestes, famoso louco mitológico que matara a mãe adúltera, era uma das explicações para a destrutividade.

A compreensão das motivações inconscientes que veio substituir as explicações mitológicas e supersticiosas somente se consolidou com o desenvolvimento da teoria freudiana. Isso, entretanto, nunca impediu que a destrutividade do “demônio do inconsciente” continuasse suas manifestações horripilantes através dos desejos irrefreados de domínio e posse, ganância e arrogância dos homens. A razão e a loucura mantêm uma convivência dialética que o sistema capitalista do lucro e do consumo parece ter rompido em favor da segunda.

A razão se tornou narcisismo para o qual a vantagem e o lucro são mais importantes que o afeto e a consideração pelas outras pessoas. Muitos dirão que isso nada tem a ver com a tragédia japonesa, mas no fundo sabem que a sucessão de desastres naturais, o aquecimento global e a violência social que varrem o planeta têm origem no explosivo binômio loucura-lucro do capital.

O argumento simplista daqueles que pretendem negar as evidências é que as convulsões planetárias que determinaram a extinção dos dinossauros aconteceram antes do surgimento do capitalismo. É necessário acrescentar que isso ocorreu antes do aparecimento do pitecantropos erectus, portanto tal raciocínio equivale a desconhecer de um só golpe o desenvolvimento científico em troca do acaso. A tragédia nuclear japonesa teve início com o bombardeio atômico de Hiroshima e Nagazaki pelos norte-americanos, em 1945, com fito principal de determinar sua supremacia econômica, política e militar no mundo. Ao apropriar-se da linguagem a humanidade criou um novo homem e um mundo novo, mas abrigou nela sua perfídia e hipocrisia. As palavras midiaticamente iluminadas pela imagem tornaram-se instrumentos de manipulação do poder econômico e político.

Assim, “liberdade” e “democracia” são manipuladas para invadir o Iraque ou a Líbia, sendo o motivo principal o controle do rico petróleo do tipo Brent. A reflexão que cabe nesse instante é se a fúria natural que catalisa a tragédia japonesa obrigará os EUA a assinarem o protocolo de Kyoto ou o acordo de Copenhague. Será preciso que a placa tectônica sobre a qual repousa a Califórnia se aparte do continente para que a cultura capitalista pense no homem? A retórica do simpático presidente negro Barack Obama não deve enganar o Brasil, pois o objetivo principal do sistema do capital é o controle do pré-sal, passando pela operacionalização da Copa e dos Jogos Olímpicos.