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Renúncia de governadora expõe crise na direita chilena

Menos de um mês depois de completar seu primeiro aniversário no poder, o presidente chileno, Sebastián Piñera, está tendo de administrar uma das mais graves crises de corrupção em seu governo, além de uma encarniçada troca de acusações no círculo de partidos que compõem a aliança governista de direita.

No caso mais recente, a governadora da Região de Bíobio, Jacqueline van Rysselberghe, que havia sido nomeada por Piñera para reconstruir a zona mais duramente afetada pelo terremoto seguido de tsunami de 27 de fevereiro do ano passado, apresentou no domingo (03) sua demissão, sob ameaça de investigação do Ministério Público por corrupção.

Sem saber que estava sendo gravada, Van Rysselberghe admitiu ter aprovado o uso de verbas da reconstrução para favorecer currais eleitorais da direita na Região de Bíobio. "Nós usamos o terremoto a favor de vocês. Entre vocês [moradores] há 60% de pessoas que não foram afetadas pelo terremoto, mas que serão beneficiadas pelo projeto. Enfim, inventamos uma história", diz a ex-governadora na gravação.

O escândalo ganhou força depois de Piñera ter admitido que cumpriu apenas “50% da tarefa de reconstruir o país”, um ano depois da tragédia que deixou 524 mortos e 31 desaparecidos. No Chile, as intendências regionais são ocupadas por políticos indicados pelo presidente da República. O cargo é equivalente ao dos governadores dos estados no Brasil. Van Rysselberghe era, portanto, braço direito de Piñera no epicentro do terremoto.

“Eles querem vender o ato da renúncia como um gesto de grandeza, mas não é bem assim. Ela renunciou por ter cometido atos que estão contra a lei e a Constituição”, disse o porta-voz da Concertação, José Antonio Gomez, garantindo que os parlamentares manterão as investigações sobre os “ilícitos penais que ela tenha cometido”.

O caso já se converteu numa das maiores fissuras no governo Piñera e promete se arrastar durante meses no Parlamento. Acuado, o governo pediu para “virar a página” e elogiou as qualidades “administrativas” da governadora.

Além dos ataques da oposição – que, desde que perdeu o poder, há um ano, patinava em encontrar um mote de ataque a Piñera – a direita também se viu dividida internamente. Os partidos conservadores que compõem a aliança governista protagonizaram uma guerra fratricida para decidir sobre a imolação política de Van Rysselberghe e chegaram a acusar-se mutuamente de minar a aliança em nome de uma pretendida hegemonia no interior do bloco.

Pressionado por aliados e opositores, Piñera – conhecido por seu talento como megaempresário e pouca experiência em cargos públicos – recorreu a um ditado popular para tentar mudar a agenda. “Ela [Van Rysselberghe] renunciou, nós aceitamos a renúncia e, portanto, como dizem meus filhos: ‘a outra cosa, mariposa’.”

O vice-presidente do partido governista Renovação Nacional, Manuel José Ossandón, reconheceu que o casso Van Rysselberghe “foi uma bomba de fragmentação que deixou feridos de todos os lados”.

Com a renúncia – depois de dois meses de desgaste político – a ex-governadora tenta impedir um processo longo no Parlamento, que poderia terminar com sua ineligibilidade.

Fonte: Opera Mundi