A visão marxista de cidades permeia debate sobre Salvador
Habitação, mobilidade urbana, cultura e desenvolvimento econômico de Salvador, foram alguns temas que permearam as discussões do segundo encontro do ciclo de debates sobre cidades, promovido pela Fundação Maurício Grabois. O evento realizado na manhã desta quarta-feira (27/4), na Faculdade de Arquitetura da Ufba, reuniu a presidente da Sociedade Brasileira de Urbanismo, Glória Cecília Figueiredo, e o arquiteto e ex-deputado estadual Javier Alfaya para debater a cidade na ótica do Marxismo.
Publicado 27/04/2011 20:46 | Editado 04/03/2020 16:19
“Eu acho que no debate de hoje nós fomos muito mais além do que o nosso objetivo inicial que era discutir elementos conceituais e teóricos que ajudassem a pensar a formação das cidades. Temos hoje uma demanda reprimida, uma necessidade de discutirmos a nossa realidade que é Salvador. E o mais curiosos, é que conseguimos fazer isso usando a teoria”, avaliou o dirigente da Fundação Maurício Grabois, Ricardo Moreno.
“Usamos teorias conceituais para debater a situação de Salvador e acabamos discutindo a realidade. A questão da habitação, da mobilidade urbana, o papel da Prefeitura e do Estado neste processo, que é um processo de avanço do capitalismo, como ele se reflete na configuração urbana, tudo isto surgiu aqui, com exemplos muitos práticos. Porque o que estamos querendo com o ciclo de debates sobre cidades é acumular elementos para pensarmos Salvador e sairmos desta forma de pensar limitada pelos problemas cotidianos, mas pegar estas questões do cotidiano para pensar estrategicamente a cidade. O que é a cidade ? A quem serve? Para pensarmos que cidade queremos ?E a quem queremos servir? Qual o nosso papel dentro disso? Então, a exemplo do debate anterior, este também foi muito rico. Vamos saindo da teoria e chegando ao que queremos, que é discutir os problemas específicos de Salvador”, acrescentou problemas específicos de Salvador”, acrescentou Moreno.
Desenvolvimento econômico
A riqueza do debate também foi ressaltada pelo arquiteto e ex-deputado estadual Javier Alfaya (PCdoB). Para ele, a mesa juntou a reflexão teórica com a vivência militante – a observação política sobre a cidade, o que é muito importante. “Se avizinha às eleições municipais e precisamos de clareza sobre o que queremos. Eu acho que Salvador precisa de um projeto de desenvolvimento econômico e social que reavive a economia da cidade. Acho que devemos ter a presença da indústria naval, de indústrias não-poluentes, deveríamos ter um pólo de confecções para aproveitarmos a produção de algodão que a Bahia tem, que é destacada nacionalmente. Precisamos de uma política para o lazer e o turismo da Baía de Todos os Santos, de acabar com este mito, de que Salvador só pode viver do serviço e do turismo e que nós não temos espaço para a instalação de outras empresas e indústrias, o que não é verdadeiro”, explicou.
Na opinião do ex-parlamentar, Salvador precisa investir com mais força na atividade comercial e econômica, com o desenvolvimento de toda a área de economia e de cultura da cidade. “Nós somos uma cidade que se destaca pela produção musical principalmente pelas tradições, por uma atividade muito ativa na área da cultura, mas esta indústria cultural não tem uma correspondente institucional. A cidade se quer tem uma Secretaria de Cultura. Então, nós somos muito amadores para o potencial que nós mesmos temos. Isto eu acho que o PCdoB pode contribuir para resolver, com a apresentação de uma candidatura própria e de um projeto com propostas concretas para o desenvolvimento social da cidade”, concluiu Alfaya.
Mobilização social
Palestrante do evento, a professora Glória Cecília Figueiredo falou dos principais problemas da cidade e de como a maior parte deles poderia ser resolvida a partir da mobilização social e da vontade política dos governantes, para fazer valer as leis já existentes, como o Estatuto das Cidades. É o caso, por exemplo, da democratização do acesso aos espaços urbanos, que ajudaria de forma decisiva a resolver o déficit habitacional da capital baiana.
Para ela, a produção de moradia na cidade nos últimos anos já seria necessária para suprir a demanda, mas não é isto o que acontece. “Salvador, nos últimos anos produziu 25 milhões de metros quadrados construídos. Isso só a construção formal, com autorização da prefeitura. Se convertermos isto para a habitação de interesse social, que fica em torno de 70m, dá mais de 357 mil unidades, se você pudesse converter. Só a título de ilustração, o déficit da região metropolitana é de 141 mil unidades. Então, a que a gente produz dá para cobrir o déficit, a questão é a distribuição. O problema é a não aplicação dos instrumentos de democratização do acesso a terra presentes no Estatuto das Cidades, que já tem 10 anos e não está sendo aplicado”, argumenta a professora.
“Falta mobilização social e política dos movimentos sociais e, da parte do Estado, o reconhecimento destas demandas da sociedade civil. O problema da habitação não será resolvido apenas por programas como o Minha Casa, Minha Vida, que não tem como atender a toda a população. Ele precisa estar associado a outros programas e ao uso mais efetivo do Fundo de Habitação de Interesse Social, que já existe mas está meio parado. É preciso que o Estado comprometa mais recursos com um programa que subsidie moradias para uma parcela da população que não terá acesso de outra forma. A mobilização é a única forma de mudar a situação”, conclui Glória Cecília.
De Salvador,
Eliane Costa