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Grécia: Papandreou anuncia a formação de um novo governo

Acuado por uma nova greve geral e vigorosas manifestações de protestos em Atenas nesta quarta (15), o primeiro-ministro da Grécia, George Papandreou, anunciou que formará um novo governo na quinta (16), e que vai se submeter a um voto de confiança no Parlamento. Houve confronto entre populares e policiais no centro da capital. O país vive um sério impasse político e mesmo entre os seus ricos credores não há consenso acerca das alternativas para a crise.

Por Umberto Martins

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"Amanhã formarei um novo governo e pedirei imediatamente um voto de confiança do Parlamento, afirmou o primeiro-ministro durante pronunciamento transmitido pela TV. Ele pretende atrair parte da oposição para a nova administração, mas parece pouco provável que continue à frente do gabinete.

Situação crítica

O governo grego precisa levantar 54 bilhões de euros ou cerca de US$ 75 bilhões ainda este ano para fazer frente ao pagamento dos serviços da sua dívida externa e evitar uma moratória que tende a aliviar a pressão recessiva sobre a economia, mas também pode precipitar uma nova crise financeira no continente europeu e comprometer a reputação e o futuro do euro.

Notemos que a Grécia já foi contemplada pelo “socorro” da trinca da austeridade (FMI, Banco Central Europeu e União Europeia). O primeiro pacote foi fechado em maio do ano passado no valor de 110 bilhões de euros. Mas a situação não melhorou e agora a economia, precipitada ao pântano da recessão, está mais frágil e dependente de novos financiamentos.

O problema é que a suposta ajuda do Fundo Monetário Internacional vem acompanhada de pacotes com conteúdos amargos para a classe trabalhadora e venenosos para a economia e a soberania nacional, incluindo cortes no valor dos salários e das aposentadorias, redução de direitos e do nível de emprego, aumento de impostos e transferência de patrimônio público à iniciativa privada (incluindo, no caso, as famosas ilhas gregas).

Recessão sem fim

A produção está em queda e a taxa de desemprego subiu de 12% em maio do ano passado (quando a percepção da crise induziu a intervenção do FMI) para 16,2% em março deste ano.

Entre os jovens (com idade de 15 a 24 anos), a taxa de ociosidade (forçada) alcança 42,5%. No ano passado eram 29,8%. As mulheres também são relativamente mais prejudicadas: 19,5% estavam desempregadas em março. Estima-se que o PIB deve ter uma nova queda, de 2,6%, em 2011 e não se divisa um período de recuperação em curto prazo. O declínio da produção, que já dura três longos anos, deve prevalecer até 2017.

Luta de classes

Em meio à crise econômica, as contradições sociais explodiram, impulsionando a luta de classes. Em 2010 ocorreram mais de uma dezena de greves gerais no país contra o arrocho imposto pela trinca (FMI, BCE e UE). A paralisação desta quarta-feira, apoiada por todas as centrais sindicais, já é a terceira do ano.

O legislativo analisa novas medidas contra os trabalhadores, mas o governo social-democrata, liderado pelo primeiro-ministro George Papandreou, enfrenta crescentes tensões e resistências entre os parlamentares de sua base.

Divergências

Também entre os credores da Grécia não há consenso sobre o caminho a seguir. Integrantes do governo alemão sugerem que credores privados aceitem de bom grado um plano de reestruturação da dívida do país, mas a ideia é rechaçada pelos banqueiros e pelo Banco Central Europeu (BCE).

A agência de classificação de risco S&P rebaixou a nota do país para CCC, a pior do mundo, usada para quem está à beira da moratória. "A nosso ver, é cada vez mais provável que a Grécia reestruture sua dívida de tal maneira que, sob as condições de qualquer pacote de financiamento adicional fornecido pelos credores oficiais do país, resultaria em uma moratória, segundo nossos critérios", disse a agência.

Agiotagem

Embora seja preciso ressalvar que os critérios dessas agências são mais políticos que econômicos, não há como negar a gravidade da situação. Tudo indica que novos pacotes de salvamento não evitarão o recurso à moratória, que tanto pode vir por decisão política como técnica, ou seja, por absoluta impossibilidade de realizar os pagamentos.

Avançando como abutres sobre a carniça, os credores tiram proveito da situação elevando as taxas de juros a pretexto de prevenir o risco-país, ampliado nesta semana pela reclassificação da S&P. Os juros da dívida grega com vencimento em 10 anos estão em torno de 17% a.a, configurando uma revoltante agiotagem.

Crise do capitalismo europeu

A tragédia da Grécia não pode ser desvinculada do contexto global em que transcorre. Emergiu no primeiro semestre do ano passado na sequencia da crise financeira mundial, detonada pelos EUA, e integra um cenário de decadência do chamado velho continente e crescentes dificuldades da chamada zona euro.

A expansão da dívida grega aconteceu por obra e graça dos banqueiros no momento de farta liquidez no sistema financeiro internacional. Explodiu em decorrência da crise mundial e das intervenções do Estado para resgatar os bancos, a exemplo do que ocorreu em outros países.

Alternativa

É uma situação parecida com a vivida pelo Brasil e outros países da América Latina no início dos anos 1980 por ocasião da chamada crise da dívida externa. Nosso país caiu nas garras do FMI e viveu pelo menos duas décadas perdidas. A receita (neoliberal) da controvertida instituição, naquele tempo e atualmente, tem um só objetivo: forçar a geração de um excedente econômico para bancar o pagamento de juros, evitando a qualquer custo a moratória. Isto se faz com drásticos cortes no orçamento público, acompanhados de recessão e liquidação de direitos sociais, privatizações e outras medidas contra o povo e a soberania nacional.

A alternativa ao veneno da trinca da austeridade não é pacífica. Os gregos teriam de decretar a moratória da dívida externa, defenestrar o FMI e abandonar o euro para recuperar a soberania perdida sobre a política econômica (nas áreas monetária, cambial e fiscal). Mas não é só a Grécia que estacionou numa encruzilhada histórica. Irlanda e Portugal também vivem dilemas parecidos. É a crise do capitalismo europeu, que nos promete novos e fascinantes capítulos.

A solução não virá pelas mãos do FMI, BCE ou EU. É um desafio para a classe trabalhadora.