PT insiste em manter abertura de arquivos ultrassecretos
Contrariando a decisão da presidente Dilma Rousseff e a orientação da nova ministra das Relações Institucionais, Ideli Salvatti, a bancada do PT no Senado manifestou apoio público ao projeto de lei da Câmara que acaba com o sigilo eterno de documentos oficiais. Em reunião ordinária nesta terça-feira (14), os senadores petistas reafirmaram posição favorável à medida aprovada com modificações na Câmara.
Publicado 15/06/2011 10:57
O texto limita em 50 anos o prazo máximo que documentos ultrassecretos poderiam ficar sem vir a público. “É importante que em algum momento esta geração tenha conhecimento dos fatos de gerações anteriores e da sua própria”, disse o líder do PT, senador Humberto Costa (PE).
Após a reunião, Costa recebeu telefonema da nova ministra das Relações Institucionais, Ideli Salvati. Segundo Ideli, a posição do governo mudou — o Planalto passou a defender a proposta original, enviado pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao Congresso há dois anos e analisada na Câmara.
Ao prever a possibilidade de sigilo eterno para certos documentos, o texto original reduz de 30 para 25 anos o tempo que papéis ultrassecretos podem ser mantidos em sigilo — mas permite que esse prazo seja renovado indefinidamente. No ano passado, a Câmara aprovou uma emenda ao projeto, estabelecendo que o sigilo só poderia ser renovado uma vez e limitando a 50 anos o prazo para liberação de documentos oficiais.
O governo quer restaurar o projeto original, mas o PT discorda. "O PT é contra preservar o sigilo. Depois de 50 anos não tem mais documento problemático", disse Costa, que lidera a bancada de 14 senadores petistas.
Ideli, em sua primeira visita ao Senado, deixou evidente sua divergência com o PT. Ela lembrou que Dilma, quando era ministra da Casa Civil, participou diretamente da elaboração do projeto apresentado por Lula. Dilma era a favor do fim do sigilo eterno, mas foi voto vencido nos debates internos. Pesaram na opção feita por Lula as posições do Itamaraty e do Ministério da Defesa, defensores das restrições existentes atualmente.
"Nossa vontade é restabelecer o projeto original, que foi negociado. Quem estava à frente da negociação era a presidente Dilma", diz Ideli, que se reúne com Costa nesta quarta-feira (15), antes de os petistas voltarem a discutir o assunto. “Não se trata de conflito da bancada do PT com o governo. Nossa posição é a que vinha sendo defendida pelo próprio governo. Mas vamos ouvir as razões e discutir como nos portar diante desse novo quadro”, afirmou o senador.
A decisão dos petistas também contraria a posição dos senadores e ex-presidentes da República José Sarney (PMDB-AP) e Fernando Collor (PTB-AL), que integram a base aliada ao governo no Senado. Sarney e Collor disseram aos colegas nos últimos dias que temem que a divulgação de documentos relacionados à Guerra do Paraguai e à disputa entre o Brasil e a Bolívia pelo território hoje ocupado pelo Estado do Acre crie incidentes diplomáticos.
Entidades criticam
Já as associações da Justiça e órgãos defensores da liberdade de imprensa criticaram a decisão de Dilma. Foi o caso da Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj). Em nota divulgada nesta terça-feira, o presidente da entidade, Celso Schröder, considera o sigilo indeterminado, na prática, o mesmo que "negar à sociedade o direito à informação pública".
Para a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), é "lamentável" que parte dos senadores pretenda mudar o projeto de lei. "A Abraji espera que o bom senso volte a vigorar entre a maioria dos senadores e no Palácio do Planalto e que o projeto seja aprovado tal qual veio da Câmara: com um tempo máximo de sigilo de 50 anos, prazo já por demais elástico para qualquer tipo de documento público ficar guardado", diz nota da entidade.
O presidente da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe), Gabriel Wedy, também defende que os documentos do governo tenham um prazo definido para serem mantidos em sigilo. "O sigilo não condiz com o melhor conceito de Estado de Direito e com uma sociedade democrática. O cidadão brasileiro deve ter o direito de conhecer a história do seu país, pois está previsto na nossa Constituição que o poder público tem a obrigação de dar publicidade a seus atos", afirma em nota.
O presidente da Associação dos Magistrados do Brasil (AMB), Nelson Calandra, tem opinião semelhante. “Com a passagem do tempo, tudo aquilo que era indevassável acaba de se tornando público. É bom manter em sigilo por um certo tempo, por questões estratégicas. Manter segredos eternamente me parece inadequado”, afirmou Calandra.
Da Redação, com agências