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Quem ganha com a fusão do Pão de Açúcar com o Carrefour?

“Só fiz essa transação porque ela me permite olhar para frente e, tão longe quanto eu enxergo, me permite trabalhar aqui na CBD enquanto eu quiser.” Jean-Charles Naouri, presidente do conselho de administração do Grupo Casino, deveria ter prestado mais atenção a essa frase, proferida em maio de 2005 por seu sócio Abilio Diniz.

O empresário anunciava, à época, o recém-assinado acordo de acionistas que permitiria aos franceses aumentar paulatinamente sua participação na Companhia Brasileira de Distribuição (leia-se Grupo Pão de Açúcar) até 2012, quando, finalmente, poderia ser obrigado a entregar a gestão da companhia. Quem imaginaria que, sete anos à frente, aos 74 anos, o parceiro ainda teria fôlego para lutar pelo comando da operação?

Diniz não só desistiu da aposentadoria como também conseguiu apoio do governo federal e do maior concorrente do Casino na montagem de uma complexa engenharia financeira para fundir o Pão de Açúcar ao braço brasileiro do Carrefour. O arranjo, se vingar, não apenas vai sustentar o empresário na cabeça da operação de uma rede sem concorrentes à altura no mercado brasileiro.

Além disso, a fusão também pode içar Diniz diretamente ao centro decisório do segundo maior grupo varejista do mundo. Em que medida a manobra definirá a nacionalidade da rede e até que ponto o país tem a ganhar com isso são perguntas ainda sem uma resposta clara.

Por ora, o maior obstáculo às pretensões do empresário é o próprio Naouri, que tomou conhecimento das conversas de Diniz com o Carrefour da pior maneira, ao folhear a edição de 22 de maio do semanário francês Le Journal du Dimanche. As providências quase imediatas do presidente do Casino foram solicitar judicialmente uma busca por provas da negociação nas dependências do Carrefour e pedir arbitragem a uma câmara internacional contra o sócio brasileiro.

BNDES

O apoio do governo Dilma à operação depende de certas variantes. O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) já deixou claro que estará fora do negócio se não houver acordo entre os sócios. É uma estratégia de saída do BNDES, que vem sendo duramente criticado por ter-se comprometido a analisar um aporte de até R$ 4,5 bilhões na fusão.

O banco divulgou duas notas seguidas à imprensa, na quinta-feira e na sexta, informando que "o apoio ao projeto se baseia na premissa do entendimento amigável entre os atores privados". Uma fonte do banco confirmou que, se a premissa não for atendida, a operação não terá prosseguimento. Segundo essa fonte, desde o início, o banco já impunha a condição de uma "oferta não hostil" e um "entendimento entre os sócios".

Os dois lados envolvidos na disputa estão fazendo pressão no banco. Na sexta, em São Paulo, o presidente do BNDES, Luciano Coutinho, reuniu-se com Diniz, que preside o conselho de administração do Pão de Açúcar. Na segunda-feira, será a vez de Coutinho receber o presidente do Casino, Jean-Charles Naouri, que vem de Paris especialmente para o encontro. Coutinho vai ouvir os argumentos dos executivos e expor a posição do banco, mas não atuará como facilitador do acordo.

O banco estatal também tem sido pressionado pelo governo federal a deixar mais claro que condiciona sua participação na fusão a um acordo entre os acionistas. A própria presidente Dilma Rousseff manifestou preocupação com o fato de que a repercussão negativa da operação ter exposto o BNDES à desconfiança de estaria ajudando Diniz a vencer o Casino na disputa pelo controle da maior varejista do País.

Histórico

Operações como a pretendida fusão entre Pão de Açúcar e Carrefour são cada vez mais frequentes no Brasil. Entre 2007 e 2010, o país galgou oito posições no ranking mundial de fusões e aquisições, saindo da 14ª para a sexta no período, conforme dados compilados pela mergermarket, unidade do grupo Financial Times.

Os negócios que tinham empresas brasileiras como alvo (fossem elas compradas por companhias estrangeiras ou por suas concorrentes nacionais) somavam US$ 33 bilhões no ano anterior à crise global ou 0,9% do total movimentado no mundo. No ano passado, esse volume mais que dobrou, para US$ 79,2 bilhões ou 3,73% do total.

O avanço do Brasil no ranking só não foi maior do que o da China, que deixou o 12º lugar em 2007 (US$ 66,7 bilhões) para o terceiro lugar em 2010 (US$ 95 bilhões), uma diferença de nove posições. O apetite por empresas brasileiras superou o de empresas de diversas nações europeias, como Holanda, Espanha e França, e mesmo de países emergentes como Rússia e Índia.

Para o líder de fusões e aquisições da consultoria Ernst & Young Terco, Ricardo Reis, a atratividade das empresas brasileiras é explicada, principalmente, pela força do mercado doméstico. Além disso, diz, o pré-sal e o setor de infraestrutura têm atraído investidores.

Da Redação, com agências