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700 trabalhadores culturais ocupam Funarte e atacam pauta do MinC

Cerca de 700 trabalhadores da cultura de diferentes linguagens artísticas ocuparam na tarde desta segunda-feira (25) a sede da Funarte (Fundação Nacional de Artes), no centro de São Paulo, em protesto à política nacional do Ministério da Cultura (MinC). A Funarte, instituição de apoio e fomento, é vinculada à pasta.

O ato foi pacífico e começou às 14 horas, com discursos cantados por membros de dezenas de coletivos e movimentos organizados do país, como as Cias. Kiwi de Teatro e São Jorge de Variedades. "Trabalhadores do teatro, é hora de perder a paciência", entoavam os artistas para a multidão, ao ritmo das batidas de maracatu e samba.
 
Os manifestantes se encontram em assembleia permanente, entremeada por intensa programação cultural que conta com apresentações de músicas, poesias, intervenções e filmes. Desde o início de sua gestão, a ministra da Cultura, Ana Buarque de Hollanda, sofre críticas dos artistas por mudanças nas diretrizes do ministério.

Entre as reivindicações dos manifestantes estão o imediato descontigenciamento de 2/3 da verba para cultura (corte do orçamento anunciado pelo governo federal); e as aprovações das PEC´S 150, que garante que o mínimo de 2% ( hoje, 40 bilhões de reais) do orçamento geral da União seja destinado à Cultura, e 236, que prevê a cultura como direito social.

Eles citam como exemplo o Prêmio Teatro Brasileiro, um modelo de lei que proposto pela categoria após mais de dez anos de discussões, mas que, até hoje, tramita no Congresso. O prêmio propõe a criação de um programa de fomento nacional, que favorece núcleos artísticos teatrais com trabalho continuado, produção de espetáculos teatrais e circulação de peças ou atividades teatrais.

"A gente luta por programas de leis estáveis, como o Prêmio de Teatro Brasileiro. Há propostas, mas a escuta está fraca. E com o corte de orçamento a situação ficou patética", diz a atriz e diretora Gerorgette Fadel, referindo-se à redução da verba anual de cultura, que perdeu 2/3 do orçamento. De R$ 2,2 bilhões, passou para R$ 800 milhões. Georgette define os manifestantes de "guardiões da cultura".

"Enquanto a gente puder, vai gritar", agrega Ney Piacentini, ator da Cia. do Latão, presidente da Cooperativa Paulista de Teatro e um dos articuladores da manifestação. Ney acredita que a produção artística vive uma situação de estrangulamento, resultado da mercantilização imposta à cultura brasileira. "Por meio da renúncia fiscal, em leis como a Lei Rouanet, os governos transferiram a administração de dinheiro público destinado à produção cultural para as mãos das empresas. É dinheiro público utilizado com critérios de interesses privados", diz.
 
Já a produtora cultural Graça Cremon reclama a inconstância dos editais públicos. "Meu trabalho é inscrever projetos em editais e neste ano ainda não abriu nenhum", reclama. Para ela, o fato de a Funarte ter anunciado na semana passada R$ 100 milhões em programas de incentivo às artes é uma resposta à mobilização. "Eles souberam da manifestação e estão correndo atrás".
 
Também estavam presentes na ocupação os porta-vozes da ministra Ana de Hollanda e do presidente da Funarte, Antônio Grassi –que foram ao Uruguai, participar de uma reunião internacional de ministros. Valério Benfica, chefe de representação regional do Ministério da Cultura, e Tadeu de Souza, representante regional da Funarte, declaram ser favoráveis ao evento. "As reivindicações são justas e já foram apoiadas abertamente pela ministra e pelo presidente da Funarte", diz Souza.

Benfica concorda, mas faz questão de esclarecer que a pauta deve ser discutida no Congresso. "Tanto a aprovação do ProCultura como a do PEC 150 são assuntos parlamentares". Mesmo assim, ambos enfatizam a importância da mobilização. Segundo eles, para as reinvindicações serem atendidas a classe teatral deve transformar seu descontentamento num ato público.

Segundo Benfica, para que uma emenda passe na constituição é preciso duas aprovações da Câmara e duas no Senado, em ambos os casos com pelo menos 3/5 de votos favoráveis. "É muito difícil. A sociedade tem que ajudar, mostrando-se estar mobilizada".

Leia abaixo o manifesto do grupo.

Manifesto dos trabalhos da cultura

O Movimento de Trabalhadores da Cultura, aprofundando e reafirmando as posições defendidas desde 1999, em diversos movimentos como o Arte contra Bárbarie, torna pública sua indignação e recusa ao tratamento que vem sendo dado à cultura deste país. A arte é um elemento insubstituível para um país por registrar, difundir e refletir o imaginário de seu povo. Cultura é prioridade de Estado, por fundamentar o exercício crítico do ser-humano na construção de uma sociedade mais justa.

A produção artística vive uma situação de estrangulamento que é resultado da mercantilização imposta à cultura e à sociedade brasileiras. O Estado prioriza o capital e os governos municipais, estaduais e federal teimam em privatizar a cultura, a saúde e a educação. É esse discurso que confunde política para a agricultura com dinheiro para o agronegócio; educação pública com transferência de recursos públicos para faculdades privadas; incentivo à cultura com Imposto de Renda doado para o marketing, servindo a propaganda de grandes corporações.

Por meio da renúncia fiscal — em leis como a Lei Rouanet —, os governos transferiram a administração de dinheiro público destinado à produção cultural, para as mãos das empresas. Dinheiro público, utilizado com critérios de interesses privados. Política que não amplia o acesso aos bens culturais e principalmente não garante a produção continuada de projetos culturais.

Em 2011 a cultura sofreu mais um ataque: um corte de 2/3 de sua verba anual. De 0,2% ou 2,2 bilhões de reais, foi para 0,06% ou 800 milhões de reais do orçamento geral da União em um momento de prosperidade da economia brasileira. Esta regressão implicou na suspensão de todos os editais federais de incentivo à Cultura no país, num processo claro de destruição das poucas conquistas da categoria. Enquanto isso, a renúncia fiscal da Lei Rouanet não sofreu qualquer alteração apesar das inúmeras críticas de toda a sociedade.

Trabalhadores da Cultura, é HORA DE PERDER A PACIÊNCIA: Exigimos dinheiro público para arte pública!

Arte pública é aquela financiada por dinheiro público, oferecida gratuitamente, acessível a amplas camadas da população — arte feita para o povo. Arte pública é aquela que oferece condições para que qualquer trabalhador possa escolhê-la como seu ofício e, escolhendo-a, possa viver dela — arte feita pelo povo.

Por uma arte pública, tanto nós, trabalhadores da cultura, como toda a população em seu direito ao acesso irrestrito aos bens culturais, exigimos programas – e não programa único – estabelecidos em leis com orçamentos próprios. Exigimos programas que estruturem uma política cultural contínua e independente – como é o caso do Prêmio Teatro Brasileiro, um modelo de lei proposto pela categoria após mais de dez anos de discussões.

Por uma arte pública exigimos Fundos de Cultura, também estabelecidos em lei, com regras e orçamentos próprios a serem obedecidos pelos governos e executados por meio de editais públicos, reelaborados constantemente com a participação da sociedade civil organizada e não dentro dos gabinetes. Por uma arte pública, exigimos a imediata aprovação da PEC 236, que prevê a cultura como direito social, e também imediata aprovação da PEC 150, que garante que o mínimo de 2% (hoje, 40 bilhões de reais) do orçamento geral da União seja destinado à Cultura, para que assim tenhamos verbas que possibilitem o início de um tratamento devido à cultura brasileira.

Por uma arte pública, exigimos a imediata publicação dos editais de incentivo cultural que foram suspensos, e o descontingenciamento imediato da já pequena verba destinada à Cultura. Por uma arte pública, exigimos o fim da política de privatizações e sucateamentos dos equipamentos culturais, o fim das leis de incentivo fiscal, o fim da burocratização dos espaços públicos e das contínuas repressões e proibições que os trabalhadores da cultura têm diariamente sofrido em sua luta pela sobrevivência.

Por uma arte pública queremos ter representatividade dentro das comissões dos editais, ter representatividade nas decisões e deliberações sobre a cultura, que estão nas mãos de produtores e dos interesses do mercado. Por uma arte pública, hoje nos dirigimos a Senhora Presidenta da República, Dilma Rousseff, ao Senhor Ministro da Fazenda e às Senhoras Ministras do Planejamento e Casa Civil, já que o Ministério da Cultura, devido seu baixo orçamento encontra-se moribundo e impotente.

Exigimos a criação de uma política pública e não mercantil de cultura, uma política de investimento direto do Estado, que não pode se restringir às ações e oscilações dos governos de plantão. O Movimento de Trabalhadores da Cultura chama toda a população a se unir a nós nesta luta.
 

Da Redação, com agências