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Organização acusa exército mexicano de torturas e execuções

A guerra contra o narcotráfico lançada pelo presidente Felipe Calderón há cinco anos "exacerbou o clima de violência" no México — o índice de homicídios cresceu 65% entre 2005 e 2010 — e provocou "um drástico aumento das violações dos direitos humanos", segundo um relatório demolidor da organização Human Rights Watch (HRW), que documenta que nesse tempo ocorreram 170 casos comprovados de tortura, 24 execuções extrajudiciais e 39 desaparecimentos forçados causados pelas forças militares do país.

O relatório, apresentado na quarta-feira (9) na capital mexicana, é fruto de dois anos de investigações e se refere basicamente aos cinco Estados que a organização de direitos humanos considera mais violentos: Baixa Califórnia, Chihuahua, Guerrero, Nuevo León e Tabasco. O estudo se concentra na atuação do exército no combate ao crime, do qual participam mais de 50 mil soldados.

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A decisão do presidente Calderón de atribuir ao exército um papel central em sua estratégia contra os cartéis, segundo a HRW, fez com que "os soldados assumam responsabilidades próprias da polícia" ao mesmo tempo em que se "reduziu o controle civil das atuações militares".

Os casos de tortura documentados, segundo a ONG, "não constituem casos isolados". "As táticas, que em geral incluem golpes, asfixia com sacos plásticos e por afogamento, choques elétricos, tortura sexual e ameaças de morte, são empregadas por membros de todas as forças de segurança", segundo o relatório, que acrescenta que "as vítimas são mantidas muitas vezes em bases militares ou outros centros de detenção clandestinos".

Quanto aos desaparecimentos forçados, a HRW salienta que habitualmente eles são qualificados pelos funcionários do governo como sequestros cometidos pelo crime organizado, e que, apesar dos 39 casos documentados, é mais difícil determinar seu número real porque "24 dos 32 estados mexicanos não penalizam o desaparecimento forçado como crime".

A organização de direitos humanos distingue as vítimas das execuções extrajudiciais entre "civis executados por autoridades ou que morrem em consequência de torturas" e "civis que morrem em instalações militares ou durante confrontos armados quando houve uso injustificado da força letal contra eles". O relatório acrescenta que "na maioria dos casos, a cena do crime foi manipulada para apresentar falsamente as vítimas como agressores armados ou encobrir o uso excessivo da força".

Este ponto em particular é um dos cavalos de batalha do poeta Javier Sicilia e seu Movimento pela Dignidade, e um dos aspectos que geram maior indignação na sociedade mexicana. A Comissão Nacional de Direitos Humanos (CNDH) registrou um aumento notável das denúncias por violações de direitos humanos, que passaram de 691 no período 2003-2006 para 4.803 entre 2007 e 2010.

O documento também critica duramente as instituições judiciais mexicanas por permitir um escandaloso clima de impunidade no qual as autoridades envolvidas no combate ao crime organizado raramente prestam contas. A HRW salienta o hábito de qualificar as torturas como meras lesões, o abandono que sofrem os familiares dos desaparecidos, a ausência de investigações profundas e a aceitação rotineira das versões oficiais. Concretamente, aponta que "a Promotoria Geral da Justiça Militar iniciou, nos cinco Estados que são objeto do relatório, 3.671 investigações por denúncias de abusos entre 2007 e 2011 e só foram condenados 15 soldados, menos de 0,5%.

A guerra contra o narcotráfico custou 50 mil vidas nos últimos cinco anos, muitas delas no fogo cruzado das disputas dos cartéis, e seu impacto afetou toda a sociedade mexicana, desde as escolas até as pequenas empresas que sofrem extorsões do crime organizado. A HRW reconhece que a expansão do narcotráfico colocou em xeque o Estado mexicano, mas considera um fracasso a estratégia do presidente Calderón por não ter adotado ao mesmo tempo "medidas para reformar e fortalecer as instituições da segurança pública".

Tradução: Luiz Roberto Mendes Gonçalves

Fonte: El País