Sem categoria

Celac: agonia da OEA e segunda morte da Doutrina Monroe e da Alca

Antecedentes: são tempos do lulismo na América Latina. Desde 2002, havia previsto o que, na minha opinião representa(va) o lulismo: “Salvação do Brasil e da América Latina”. (Revista Vértigo, 8/12/02).

Por Alfredo Jalife-Rahme

Frente ao triangulado golpe de Estado supostamente promovido pelos Estados Unidos em Honduras, com o propósito perverso de naufragar a Aliança Bolivariana para os Povos da Nossa América (Alba) — agora constituído por oito países dos 33 da América Latina — Washington parece ser mais tolerante com a onda lulismo na região, frente à ordem multipolar incipiente.

A abrangência do lulismo

Uma ex-guerrilheira, Dilma Rousseff, governa o principal pólo de poder da América Latina, enquanto o presidente peruano nacionalista-socialista, Ollanta Humala (ollanta em quechua significa: “o guerreiro que desde sua torre tudo vê”) confessou ter como referente Lula: “se algum modelo tem êxito é o brasileiro”, (larepublica.pe, 26/4/11).

Há um mês estive em Bogotá, onde vivi a inesperada ascensão de um ex-guerrilheiro, Gustavo Petro, como prefeito da capital colombiana e presenciar a débâcle do modelo neoliberal-fascistóide do ex-presidente colombiano Álvaro Uribe (sósia de Felipe Calderón do México).

No Paraguai, o presidente Fernando Lugo não se encontra distante do lulismo assim como a assombrosa presidente da Argentina, Cristina Kirchner, é uma das suas principais aliadas geoeconômicas.

Em entrevista recente ao confiável apresentador de televisão e rádio nos Estados Unidos, Rubén Luengas, me atrevi a formular que Andrés Manuel López Obrador (AMLO) representa o estereótipo feliz do “Lula mexicano”.

O lulismo se impôs como uma das correntes principais da América Latina — quando os Estados Unidos fizeram o impossível tanto pela via militar como pelo método subversivo (que inclui a propaganda negativa) para deter o crescimento da Alba —, não serei cruel em fazer lenha das árvores caídas da Área de Livre Comércio das Américas (Alca) nem do defunto Plano Puebla-Panamá, o demente plano bushiano-foxiano-castañedista.

A criação da Celac

Fatos: o presidente da Venezuela, Hugo Chávez — que expõe uma força titânica apesar de sua quarta sessão de quimioterapia devido à sua lamentável doença — convocou uma reunião para criar a Comunidade dos Estados latino-americanos e Caribenhos (Celac), que contou com a presença de alguns “latinófobos” “cavalos de Tróia”, que preferem ser escravos dos Estados Unidos e Canadá, ao invés de estarem na primera fila do futuro agradável que se revê para a América Latina como um dos principais pólos da incipiente ordem multipolar.

Chávez, gostemos ou não — talvez devido à sua formação militar estratégica — possui um profundo conhecimento da geopolítica, assegurou que a cúpula de fundação da Celac representou “em 100 anos o que de mais importante aconteceu neste continente”. Chávez entendeu perfeitamente que a Celac “não teria sido possível” de “não ter mudado o mapa geopolítico na região” e prevê que “é o tempo da América Latina e do Caribe” para construir “um espaço geopolítico tal qual era o projeto de Bolívar”.

Chávez parece ter tomado conhecimento das minhas prudentes advertências durante a conferência que proferi em Caracas, de não seguir o modelo monetarista e fiscalista da União Europeia (UE), hoje em desassossego: “A Celac nunca (sic) vai caminhar para o rumo da UE, que não teve lideranças capazes (sic) nem forças populares (sic) que obrigassem a mudanças profundas” (La Jornada, 9/12/11). Altos funcionários do governo venezuelano comentaram que, do hospital, Chávez esteve atento à minha exposição.

Foi aprovada a histórica Declaração de Caracas e, em forma de esportes e sem ideologia, a presidência pro tempore ficou com o chileno Sebastián Piñera, que manifestou ter um enfoque geoeconómico mais que alinhado com Pinochet. De maneira lúcida, Piñera convidou a “olhar apra o futuro” (elmundo.es, 9/12/11). Fica totalmente derrotada a infeliz fase dos estéreis eixos opostos no hemisfério que impulsionou a dupla bushiana de Fox-Castañeda.

A transversalidade da Celac é desconcertante quando Cuba, expulsa da OEA em 1962 por culpa dos Estados Unidos, acolherá sua próxima cúpula no ano que vem. A custódia do tesouro promisor da Celac está nas mãos de uma troica: Venezuela, Chile e Cuba.

A Celac une aos 33 países da América Latina e nasce com o legado político do Grupo do Río e da Cúpula da América Latina e do Caribe sobre Integração e Desenvolvimento (CALC). De maneira significativa e por razões culturais evidentes, Estados Unidos e Canadá, dois países da esfera anglo com poderosas minorias “latinas”, não fazem parte do novo bloco.

O presidente equatoriano, Rafael Correa, apontou o dedo sobre o papel entreguista da OEA à agenda unilateral da Estados Unidos: “É claro que precisamos de um novo sistema latino-americano. Seus viéses e atavismos acumulados a fazem ineficiente e pouco confiável para os novos tempos” (Yahoo, 9/12/11). De acordo!

A Doutrina Monroe de 1823 — que não era “América para os americanos”, mas “América para os Estados Unidos” — provocou a demolição da integração sul americana de Simón Bolívar, morto sete anos mais tarde. A expulsão da ALCA, enterrada em Mar del Plata em 2005, significou a primeira morte da Doutrina Monroe. Hoje a ressurreição do sonho bolivariano da Celac aniquila pela segunda vez a anexação unilateral da Doutrina Monroe.

Não encontrei nota relevante alguma na imprensa pró anglo-saxã sobre a gênese da Celac, salvo notas de seus criados regionais (lanación.com (8/12/11)) que critica a Celac como “outro projeto isolacionista”. Como doeu!

Não faltam análises relevantes que não se esquivam de prejudicar os interesses hegemônicos dos Estados Unidos e da Grã Bretanha (vide a briga pelas Malvinas e o boicote a Cuba).

É interessante contemplar a percepção tanto da China — que saudou a criação da Celac, à diferença do estrondoso silêncio da esfera anglo, Otan e União Europeia — como da Rússia, um de seus órgãos, Russia Today (4/12/11) avalia sua louvável assunção em meio aos desafios “à sua unidade e integração”.

Russia Today destaca a opinião de “políticos, analistas e pesquisadores internacionais” que consideram que a Celac “poderia substituir a obsoleta OEA da qual fazem parte Estados Unidos e Canadá”. A OEA, cuja sede está localizada em Washington, “é incurável porque sofre de metástase imperial”. Olé!

Perigo iminente

Conclusión: existe o perigo dos Estados Unidos sabote e balcanize o novo bloco (que tem em seu seio vários cavalos de Troia). Espera-se que o golpe Se espera que a ação dos EUA e da Inglaterra contra a Celac seja brutal, como de costume.

A OEA, instrumento da caduca ordem unipolar, opera em sentido contrario à Celac — joia da incipiente multipolaridade — e hoje são incompatíveis e mutuamente excludentes.

Fonte: CubaDebate
Tradução: Da redação do Vermelho,
Vanessa Silva