Privataria Tucana e Resquícios da Guerra Fria*

Se você esta selecionando leituras para as férias de verão,as obras “A Privataria Tucana”, do jornalista Amaury Ribeiro Jr. e “Os últimos soldados da Guerra Fria”, do também jornalista Fernando Morais, são nossas sugestões. O primeiro, é o resultado de 12 anos de investigação jornalística sobre a chamada “Era das Privatizações”, ocorrida no governo de Fernando Henrique Cardoso, sob o comando do então ministro do Planejamento José Serra, ex-governador de São Paulo.

Elio Gaspari foi o criador da expressão que deu origem ao livro, “privataria”, fazendo menção a suposta nebulosidade que envolvia as operações de privatizações e ligando o termo a pirataria.O livro é riquíssimo em documentos sobre um bilionário esquema de fraudes que teria ocorrido no processo de privatizações comandado na década de 1990 durante o governo do ex-presidente FHC. Ribeiro Jr. traz documentos e informações que sugerem que o ex-caixa de campanha do PSDB e ex-diretor da área internacional do Banco do Brasil, Ricardo Sérgio de Oliveira, agiu como “artesão” da construção de consórcios de privatização em troca de propinas. Parentes e pessoas próximas ao ex-governador de São Paulo e ex-ministro do Planejamento, José Serra, também são citadas.

O livro é uma reportagem investigativa de 200 páginas de texto, apoiada em mais de 140 páginas de facmiles de documentos comprobatórios, todos oficiais, solicitados por ele em juntas comerciais, cartórios, Ministério Público e na Justiça, autenticados e com firma reconhecida. Passo a passo, a trajetória que o dinheiro ilícito fez, das empresas offshores a empresas de fachadas no Brasil, é descrito no livro e, também, sua comprovação, com a apresentação de documentos, através dos quais foram praticados negócios financeiros vultosos envolvendo grandes corporações financeiras, durante o processo de privatizações. O dinheiro seguia para o paraíso fiscal nas Ilhas Virgens, e, retornava ao Brasil, “lavado” como “investimento estrangeiro”. Foi durante a disputa entre Aécio Neves e José Serra pela indicação tucana para concorrer à presidência que a idéia do livro surgiu em 2009.

O jornalista começou a investigar uma rede de espionagem estimulada por Serra, para desacreditar seu rival no PSDB, o ex-governador mineiro Aécio Neves. Desse fio, Amaury Ribeiro Jr. descobrirá um novelo vastíssimo de corrupção, prepotência e manipulação ilícita de dinheiro público. Após seu lançamento, o livro teve uma grande repercussão em blogs, identificados com a esquerda e nas redes sociais. A grande imprensa o ignorou. A Rede Globo, a Editora Abril, a Folha de São Paulo, O Estado de São Paulo, etc. A Veja, por exemplo, notoriamente direitista, enganou seus leitores com um absoluto silêncio sobre o livro de Ribeiro Jr., mantendo o livro “Guia Politicamente Incorreto da História do Brasil” – um amontoado de baboseiras – de Leandro Narloch, no lugar em que, segundo as livrarias, estava a Privataria Tucana.

Somente agora o livro de Ribeiro Jr. aparece entre os dez mais vendidos entre os de não-ficção da “isenta” Veja. E isto que no livro, o autor aproveita para visitar os bastidores da campanha do PT e averiguar os vazamentos de informações que perturbaram a candidatura presidencial em 2010. Ele sustenta que, na luta por ocupar espaço a qualquer preço, companheiros abriram fogo amigo contra companheiros, traficando intrigas para adversários políticos incrustados na mídia mais hostil a então candidata Dilma Rousseff. São tramas de dar inveja a Maquiavel. Já “Os últimos soldados da guerra fria”, narra a incrível aventura dos espiões cubanos em território americano e revela os tentáculos de uma rede terrorista com sede na Flórida e ramificações na América Central, e que conta com o apoio tácito dos Estados Unidos de membros do Poder Legislativo e com certa complacência do Executivo e do Judiciário. Fernando Moraes revela que no início da década de 1990, Cuba criou a Rede Vespa, um grupo de doze homens e duas mulheres que se infiltrou nos EUA e cujo objetivo era espionar alguns dos 47 grupos anticastristas sediados na Flórida. O motivo dessa operação temerária era colher informações com o intuito de evitar ataques terroristas ao território cubano.

De fato, algumas dessas organizações ditas “humanitárias” se dedicavam a atividades como jogar pragas nas lavouras cubanas, interferir nas transmissões da torre de controle do aeroporto de Havana, executar atentados a bomba em seus melhores hotéis e até disparar rajadas de metralhadoras contra navios de passageiros em suas águas territoriais e contra turistas estrangeiros em suas praias. É um livro que traz histórias de heróis e de canalhas e, que o diretor Oliver Stone, deverá transformar em um filme brevemente. Boa leitura e Feliz 2012.

*Por José Ernani de Almeida, Mestre em História e Professor