Sem categoria

Defensoria relata 32 denúncias contra PM em ação na cracolândia

A Defensoria Pública do Estado de São Paulo recebeu 32 denúncias de ações irregulares na chamada Operação Sufoco da Polícia Militar (PM), com apoio da Guarda Civl Metropolitana, na região da Luz, centro de São Paulo, para retirada de usuários de crack. O dado foi divulgado pelo defensor Carlos Weis, durante reunião das Comissões de Direitos Humanos da Câmara de São Paulo e da Assembleia Legislativa do Estado (Alesp), presidida pelo vereador Jamil Murad (PCdoB).

As denúncias foram feitas no posto volante da Defensoria, órgão independente, instalado na região da Luz, por usuários de drogas, moradores de ruas e dos prédios, que testemunharam do alto violações de direitos humanos.

Veja também:
 Para autoridades, "Operação Cracolândia" é um desastre (vídeo)

 

"Estamos distribuindo material aos moradores de rua sobre quais são seus direitos e dando assistência jurídica gratuita, garantida pela Constituição. Não se pode enquadrar alguém só por ser suspeito de ser suspeito, por exemplo", declarou Weis, referindo-se ao fato de que nenhum grande traficante foi preso na operação.

O vereador Jamil Murad abriu a atividade lembrando que a abordagem aos usuários de droga vai contra não somente ao que é mais indicado atualmente pela medicina moderna, de uma aproximação mais pacífica, mais humana, de sensibilização do usuário, que é uma pessoa doente, que precisa de tratamento, mais também fere os princípios de respeito e direitos humanos.

“Estamos aqui para discutir uma proposta mais adequada para a solução do centro de São Paulo do que a que está sendo colocada em prática, que é absolutamente inadequada”, afirmou Jamil Murad. Para ele, que é médico há 44 anos, trata-se de uma questão de saúde pública e não de polícia.

Em seguida, o presidente da Câmara, vereador Police Neto, propôs a mudança do local da reunião para uma sala maior, por conta da quantidade de pessoas que compareceram, aproximadamente 300, o que acabou ocorrendo.

Há vagas para tratamento?

O deputado Adriano Diogo, presidente da Comissão de Direitos Humanos da Alesp, que compôs a mesa de discussão, reforçou a necessidade de uma mudança na abordagem e alertou para a quantidade de vagas existentes para o tratamento de dependência química na cidade. Segundo material divulgado na grande imprensa, nesta quarta-feira (11), o município só teria 27 vagas para tratamento de dependentes químicos. O único serviço de Atenção Integral ao Dependente, no Hospital Heliópolis, tem 80 vagas, e que, em janeiro, 25 estavam disponíveis, ontem (10) eram 19. Outras quatro instituições têm 25 vagas disponíveis.

“Não tenho visto com bons olhos a maneira como isso está sendo conduzido. Tenho acompanhado na Assembleia as ações e as respostas sobre a operação. Não tem nada que justifique essa ação tresloucada, fora de padrão, a impressão que eu tenho, é que eles tentaram implantar na Santa Efigênia, que eu me nego a chamar de cracolândia, uma UPP (Unidade Pacificadora de Polícia). Uma atitude teatral, muito nos moldes daquelas ações televisivas de grande repercussão na mídia, que são as ocupações dos morros no Rio de Janeiro”, declarou o deputado Adriano Diogo.

Ele ironizou o fato de que o primeiro escalão não estaria sabendo da operação, realizada desde o dia 3 de janeiro pela PM, e responsabilizou os governos municipal, estadual e federal. Por isso, para ele, a socidade civil precisa se manifestar.

“Não tem porta-voz (a PM). Imagine você, meu irmão Jamil Murad, estava saindo da Assembleia, e a Polícia Militar da Assembleia ligou para ver se eu participaria desta reunião e saber qual seria a nossa posição. Cadê o comando da Polícia Militar, onde está a área de direitos humanos da PM, cadê o secretário da Segurança Pública? Estamos diante de uma ausência de Estado, de poder público e para concluir vou dizer que ninguém conduziu bem. O Ministério da Saúde politizou de maneira errada, de uma forma eleitoral rebaixada, e os órgãos estaduais e municipais entraram na orquestração”, disparou Diogo.

Jamil lembrou que a Comissão da Câmara vem discutindo o assunto em reuniões e seminários e citou a participação de autoridades como juízes, desembargadores e também vereadores, que estão visitando a região há alguns meses para contribuir na busca de soluções. “Estive voluntariamente em um atendimento, durante um sábado, onde tinha assistente sociais, setor da saúde, da segurança, da sociedade civil, do judiciário, promotor, juiz, o próprio Malheiros [desembargador Malheiros] estava lá.”

O vereador do PCdoB elencou os pilares mais importantes para o atendimento aos usuários: assistência social, saúde e judiciário. Este, para obrigar o poder público a cumprir ações e medidas para atender à população. “Hoje (11), estive na região e constatei a presença ostensiva da Polícia na região. Ora, eles afirmam que a operação é para capturar traficante. Mas, como já havia declarado Ariel [de Castro Alves, vice-presidente da Comissão Nacional da Criança e do Adolescente da OAB, também presente]: para pegar traficante a ação é de inteligência, de investigação, e não dessa forma”.

O padre Júlio Lancelotti, defensor dos moradores de rua, que integrou a mesa, fez críticas sobre a o nome batizado da operação, Sufoco. “Sufoca a esperança. Uma pessoa acuada ataca. Tenho estado com eles (usuários de crack) diariamente e percebo que, ao contrário do que afirmam autoridades, eles têm sim discernimento. Eles não são sem noção. Por mais que eles esteja entorpecidos, nós estamos mais. Tratá-los com crueldade é a nossa falência”, declarou Lancelotti.
Ele e um grupo de católicos têm distribuído panfletos orientando os usuários e moradores de ruas sobre seus direitos.

Também estiveram presentes representantes do Conselho de Defesa da Pessoa Humana, da Secretaria Estadual de Saúde e da Associação Juízes da Democracia, Movimento Nacional da População de Rua, entre outras entidades.

Ao final, o presidente da Câmara, o vereador Police Neto, declarou que a Casa vai cobrar das entidades e órgãos de governo que se prontificaram a contibuir para a situação dos usuários.   

Outro lado

O governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), proibiu pela manhã o uso de balas de borracha e bombas de efeito moral pelos policiais militares que atuam na Ação Integrada Centro Legal, como foi rebatizada a ação na região conhecida como Cracolândia. Na terça (10), o governo dobrou o número de policiais que atuam na região.

O prefeito Gilberto Kassab (PSD) minimizou o fato de a operação policial deflagrada na Cracolândia não ter aguardado a inauguração de um equipamento da administração municipal na Rua Prates, que deve encaminhar dependentes a um acompanhamento especializado. Para ele, “são coisas distintas: uma coisa são os equipamentos de saúde, sociais, que são responsáveis pelo tratamento das pessoas no campo da saúde. Outra questão é a ação da polícia”.

De São Paulo
Deborah Moreira