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Projeto do marco legal da ciência está parado no Congresso

Apesar da grande expectativa no meio acadêmico, está parado nas duas casas do Congresso Nacional o projeto de lei que cria o Código Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação, proposto por 17 entidades científicas ligadas ao fomento da pesquisa – entre elas a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), a Academia Brasileira de Ciências (ABC) e o Conselho Nacional de Secretários Estaduais para Assuntos de CT&I (Consecti).

No Senado, a proposta foi encampada e assinada pelo senador Eduardo Braga (PMDB-AM), presidente da Comissão de Ciência, Tecnologia, Inovação, Comunicação e Informática (CCT). Desde 16 de outubro do ano passado, o Projeto de Lei 619 aguarda designação de relator na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ).

Na Câmara dos Deputados, onde ganhou nova numeração, o projeto foi subscrito por dez deputados, mas, desde 27 de setembro do ano passado, aguarda a formação da comissão especial que fará a análise da proposta. A indicação dos participantes é feita pelos líderes partidários. Segundo o deputado Sibá Machado (PT-AC), candidato a relator da matéria, “não há polêmica sobre o mérito da proposta. O projeto não andou por causa da agenda do Congresso no fim do ano passado”. Ele acredita que após o carnaval será definida a composição da comissão.

Segundo a assessoria da presidência da Câmara, a composição da comissão especial depende da distribuição de todas as comissões permanentes e temporárias da Casa, ainda não definida por falta de acordo político sobre como o PSD indicará seus membros. Conforme o regimento interno da Câmara, parlamentares que trocam de partido, como foi o caso de todos os integrantes do PSD na Casa, perdem assento nas comissões.

“A comissão especial foi uma faca de dois gumes. Ela evita passar em três comissões [como prevê o regimento da Câmara], mas, para montar a comissão especial, os partidos têm que indicar os membros da comissão. Foi aí que travou”, resume Mario Neto Borges, presidente do Conselho Nacional das Fundações de Amparo à Pesquisa (Confap) – uma das entidades que aguardam a aprovação da proposta.

Consenso

O projeto é considerado por muitos parlamentares consensual. A mesma opinião tem o petista Sibá Machado, que lembra que a proposta foi discutida pela primeira vez em 2010, ainda no governo Lula, em audiência que o então presidente concedeu à SBPC, à época presidida por Marco Antônio Raupp, atual ministro da Ciência, Tecnologia e Inovação.

Sibá Machado defende que o PL vire medida provisória (MP), o que faria com que a medida tivesse aplicação imediata. Ele acredita que “se o ministro emitir parecer favorável para a Casa Civil é possível transformar o projeto em MP”. Sibá disse ainda que tem trabalhado para que os líderes partidários na Câmara façam as indicações dos membros da comissão especial.

Apesar do interesse acadêmico, de setores do governo e de parlamentares da base, o líder do governo na Câmara, Cândido Vaccarezza (PT-SP), informou à Agência Brasil que não recebeu “nenhuma orientação” do Palácio do Planalto sobre a tramitação do projeto. Ele lembra que, quando há interesse do governo por alguma proposta em pauta, é pedida urgência na apreciação da matéria.

Defesa

Cientistas lutam há mais de um ano pela aprovação do código – que cria mecanismos para estimular a aproximação entre centros de pesquisa e empresas privadas na concepção de novos produtos e processos produtivos.

“É hora de o Brasil – que já tem Código de Trânsito, Código Penal, Código Florestal – ter também um código para a ciência, tecnologia e inovação. Isso vai ajudar o país a acelerar o seu desenvolvimento científico e tecnológico”, avalia o presidente do Conselho Nacional das Fundações de Amparo à Pesquisa (Confap), Mario Neto Borges. Em sua opinião, o código, que tramita simultaneamente na Câmara dos Deputados e no Senado, pode permitir maior inserção internacional da ciência feita no Brasil e aprimorar a fiscalização dos órgãos de controle.

Além do desenvolvimento científico, há perspectivas de ganhos econômicos. O projeto de lei cria mecanismos para estimular a aproximação entre centros de pesquisa e empresas privadas, para que, juntos, promovam a inovação.

Entre esses mecanismos, está o compartilhamento, com empresas privadas, de laboratórios, equipamentos, instrumentos e materiais hoje disponíveis nas chamadas entidades de ciência, tecnologia e inovação (ECTI) públicas (como as universidades e as unidades de pesquisa do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI). De acordo com o projeto, as ECTI poderão ser remuneradas, bonificar os pesquisadores e celebrar contratos de transferência tecnológica.

O projeto de lei ainda autoriza a União, os estados, municípios e as agências de fomento a fazer “concessão de recursos financeiros, humanos, materiais ou de infraestrutura” a ECTIs privadas com fins lucrativos. Empresas inovadoras poderão ser beneficiadas com subvenção econômica, financiamento, participação societária do Estado e encomendas para o desenvolvimento de tecnologia.

A flexibilização dos mecanismos de apoio e a parceria entre Estado e iniciativa privada são propostas bem vistas no meio empresarial e poderão ser decisivas para reverter a tendência de diminuição da importância econômica da atividade industrial. “A inovação é uma saída para a chamada desindustrialização”, opina Célio Cabral, gerente de Inovação do Instituto Euvaldo Lodi (IEL) – vinculado à Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg).

Segundo ele, o país sofre processo prematuro de desindustrialização em função da invasão de produtos manufaturados importados a baixo custo, e a inovação pode reverter esse cenário, com redução de custo e diferenciação de produtos. “A inovação mostra-se como imperativo. Fazendo um paralelo, é como a qualidade total nas décadas de 1980 e 1990”, pondera Cabral. “É preciso gestão de inovação nas empresas. Temos que tratar a inovação de forma sistêmica e perene para que não seja uma iniciativa isolada”.

Estrutura legal

Ao tomar posse no mês passado, o ministro da Ciência, Tecnologia e Inovação, Marco Antonio Raupp, defendeu o novo marco legal para o setor. “É necessária uma estrutura legal que possibilite a interação público-privada. Precisamos também aperfeiçoar o marco legal e incrementar os mecanismos de incentivo à inovação para que mais empresas passem a realizar atividades de pesquisa e desenvolvimento de modo crescente e contínuo”.

A presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), Helena Nader, tem avaliação semelhante e considera o código importante para melhor inserção econômica do país. “Ou mudamos as leis ou fica inviável competir”, apontou.

Há também a expectativa de que o código facilite a realização de contratos nas ECTIs públicas e a importação de insumos para a pesquisa, e assegure o acesso de cientistas brasileiros e de empresas nacionais ao patrimônio genético da biodiversidade no território brasileiro, tanto em pesquisas básicas quanto em estudos com finalidade industrial.

Fonte: Agência Brasil