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EUA admitem que bombardearam região por meio de controle remoto

O presidente Obama confirmou que os Estados Unidos atacaram a região tribal do nordeste do Paquistão com aviões não tripulados, os ANTs (www.bbc.co.uk, 31/01/12).

Por Juan Gelman, no Página 12

Não é uma novidade desde que essa forma de intervenção militar começou a ser usada em 2004, mas é a primeira admissão oficial da sua existência. Inclusive, os bombardeios com ANT se quadruplicaram no governo estadunidense atual em relação com a era W. Bush. O Pentágono está desenvolvendo um novo tipo de guerra para evitar futuras invasões.

Os ANT são relativamente baratos, especialmente se compararmos seu custo com o do caça F35, o mais avançado até agora produzido pela Lockheed Martin: cerca de 300 milhões de dólares cada unidade. Podem voar longas distâncias e cruzar qualquer fronteira sem perigo para a tripulação, porque não tem, e pode permanecer no ar por muito tempo. São guiados eletronicamente por militares comodamente sentados nas bases que, às vezes, estão muito longe do objetivo, como por exemplo em Nevada, nos Estados Unidos. São capazes de decolar e aterrissar em um porta-aviões e estão desenvolvendo um modelo que possa aterrissar sem o controle humano. Não é por acaso que ocupam um lugar especial nos orçamentos de guerra estadunidenses, apesar dos cortes anunciados.

O Pentágono destinou algumas bases para os ANT em boa parte do mundo: estima-se que são 60 até agora, e sabe-se que algumas funcionam em Djibuti, nos Emirados Árabes Unidos, no Afeganistão e nas Ilhas Seychelles. O que foi capturado no Irã prova que também são utilizados em missões de espionagem. São ideais para violar espaços aéreos alheios e, além dos paquistaneses, também estão violando o espaço aéreo iemenita.

Obama se apressou em afirmar que a maioria das vítimas causadas pelos ANT no Paquistão figuravam em "uma lista de terroristas" e que as baixas civis "não são grandes". Como, salvo exceções, não se sabem suas identidades, pode ser que sim, pode ser que não. John Brennan, assessor principal do chefe em matéria de contra-terrorismo, chegou a afirmar no ano passado que o número de mortes de civis era igual a zero. (www.latyimes.com, 29/06/11). Há informações que o contradizem rotundamente.

O escritório de jornalismo de investigação da Universidade de Londres alertou, no ano passado, que pelo menos 175 crianças figuravam entre as mais de duas mil vítimas dos ANT até agora. (www.thebureauinvestigates.com, 10/08/11). A instituição – que durante quatro meses realizou um trabalho de campo no Waziristão, a região fronteiriça com o Afeganistão que, sobretudo, padece das intervenções programadas a milhares de quilômetros de distância – destaca em seus estudos mais recentes que os ataques se dirigem aos que procuram resgatar os feridos, as reuniões tribais, aos funerais e casamentos. (04/02/12). Amnesty questionou a legalidade dessas intervenções que violam a soberania nacional do Paquistão. A Casa Branca as justifica com sua habitual desenvoltura: "… de acordo com o direito internacional, temos a autoridade para agir contra a Al Qaeda e suas forças associadas", disse Brennan (www.nytimes.com, 17/09/11). "As forças associadas" são as mesmas que treinaram e financiaram a CIA para expulsar os soviéticos do Afeganistão.

Há mais de três anos, Noor Behrman, nativo do Waziristão, documenta fotograficamente o impacto dos mísseis dos ANT. "Às vezes ele chega ao lugar pouco minutos depois da explosão, deixa a câmara de um lado e se ocupa de revisar os escombros em busca de sobreviventes. Um trabalho perigoso e desagradável. Os ANT costumam atacar de novo minutos depois. Então, mexer nos escombros para ver se existem feridos é arriscado", registra o The Guardian (17/07/11). As conclusões de Behram são categóricas: "Por cada 10 ou 15 pessoas mortas, talvez abatam um militante. Não conto quantos talibãs caíram. Conto quantas crianças, mulheres, gente inocente, caíram".

Washington ensaia outro artefato de guerra à distância que confere aos bombardeios aéreos da Primeira Guerra Mundial a qualidade de infantil. Este novo robô é o "Veículo 2 de tecnologia hipersônica", um projétil capaz de alcançar um objetivo em qualquer ponto do planeta em menos de uma hora: estará dotado de uma velocidade oito vezes superior à do som e poderá voar 21 mil km em 60 minutos (www.wired.com, 17/11/12). Para que desperdiçar marinheiros na ocupação de países alheios?

As operações clandestinas das forças especiais têm esse objetivo, 60 mil efetivos distribuídos em 120 nações, ou seja, quase dois terços dos países da Terra (www.tomdispatch.com, 05/02/12), que também se dedicam a vulnerar soberanias nacionais transformando-as em um papel usado, inútil, sem lugar.

Fonte: Diário Liberdade, original em Página/12