Há mais de uma semana, protestos sacodem o Afeganistão
Milhares de afegãos manifestam-se há uma semana contra a ocupação do país. O combustível da revolta foi a queima de exemplares do alcorão numa base militar dos EUA, ato considerado vexatório pelo povo e que encaixa num contexto de miséria galopante, da qual os ocupados não vislumbram perspectivas de saída.
Publicado 01/03/2012 08:55
De acordo com dados oficiais divulgados pela Lusa, a repressão sobre a revolta popular desencadeada há cerca de uma semana e os atentados bombistas já vitimaram pelo menos 30 pessoas e deixaram um mínimo de 200 feridos.
Na terça-feira, 21, na base norte-americana Bragam, foram queimados exemplares do alcorão, livro sagrado para os crentes muçulmanos. O sucedido tornou-se público quando funcionários afegãos daquela unidade encontraram restos carbonizados em caixotes do lixo.
Protestos e incidentes violentos têm ocorrido desde então em praticamente todas as províncias do território. O Aeroporto de Jalalabad, na província de Nangarhar, no Leste do país, foi, segunda-feira, 27, alvo de um atentado com um carro-bomba que matou nove pessoas e feriu oito.
Bases militares das forças da Otan (Bagram, por exemplo), escritórios da ONU (na província de Kunduz), sedes de ministérios e departamentos do governo colaboracionista nas capitais de província, comboios de combustível da Aliança Atlântica (Khost), representações diplomáticas dos EUA (na província de Herat ou em Cabul, por exemplo) têm sido cercados e atacados por multidões furiosas, que exigem a imediata saída dos ocupantes e dos executivos afegãos ao seu serviço.
Um dos casos que melhor ilustra a dimensão dos tumultos ocorreu em Taloqan. Naquela localidade, o comando alemão foi obrigado a evacuar de emergência para uma outra base germânica na região de Kunduz, deixando todo o equipamento para trás.
Ocupantes inseguros
Entre os mortos da última semana no Afeganistão estão dois «conselheiros» norte-americanos que trabalhavam no Ministério do Interior afegão. Os militares dos EUA foram assassinados, sábado, por um oficial do exército afegão que se encontra ainda em fuga.
Segundo informações divulgadas pela AFP, o incidente aconteceu após uma acesa discussão. Enquanto visionavam os vídeos das manifestações populares em Cabul, os norte-americanos terão insultado repetidamente os afegãos e o alcorão.
O militar afegão não terá gostado da reincidência na falta de respeito e contradisse os “conselheiros”, que reiteraram os insultos gerando a fúria homicida. Oito cartuchos de bala foram encontrados junto dos corpos.
Apesar do Pentágono ter reiterado que vai manter a estratégia militar no país e que não está em causa a transferência da responsabilidade pela segurança para as forças afegãs, anunciada para 2014, a verdade é que a palavra de ordem entre os ocupantes não-militares parece ser "fugir enquanto é tempo".
Ao mesmo tempo em que o presidente títere Hamid Karzai pedia aos afegãos para regressarem à calma e à paz[!] após as legítimas demonstrações de indignação, França, Alemanha e Grã-Bretanha ordenavam a todo o pessoal civil e a todos os colaboradores para abandonarem imediatamente o território.
Os EUA encerraram mesmo a sua embaixada na capital do Afeganistão, cumprindo, aliás, as recomendações do comandante da ISAF, general John Allen.
“Mantenham-se a salvo”, escreveu, segundo a Europa Press, um responsável diplomático dos EUA na conta que a embaixada mantém numa rede social.
Miséria é pasto fértil
Os recentes escândalos e crimes cometidos por militares da Otan no território avolumaram o ambiente de crispação contra a ocupação do país, mas as carências extremas a que o povo está votado após mais de uma década de invasão são igualmente pasto fértil para a revolta.
Já depois do episódio da queima do alcorão, a Anistia Internacional (AI) veio confirmar que pelo menos meio milhão de afegãos tiveram de abandonar as suas casas devido à guerra. Milhares amontoam-se nas cidades sujeitos à fome, ao frio e às doenças sem qualquer ajuda das autoridades.
De acordo com informações divulgadas pela EFE, todos os dias outras 400 pessoas chegam aos campos de miséria, calcula ainda a AI.
Fonte: Avante!