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O pré-sal da nossa floresta

A biodiversidade brasileira é propalada aos quatro cantos como a maior do mundo, com valor estimado em trilhões de dólares. Não tenho idéia de como se chega a esse valor, mas também acredito nisso, pois nossa floresta detém infinitas preciosidades a serem exploradas.

Por Luiz Pianowski (*)

Defesa da biodiversidade

Poucos se dão conta, mas assim como o tão abordado, discutido e disputado petróleo do pré-sal, nossa flora também pode gerar muita riqueza. No entanto, com potencial menos óbvio, enquanto um é tão estudado, a outra transforma-se num almoxarifado de boas idéias fechado para o uso.

E não falo aqui num consumo predatório das espécies, mas sim no potencial que estas detêm para realização de estudos, descobertas e geração de valor econômico. Falo em exploração racional e sustentável da maior fonte de biodiversidade do mundo. Estima-se que existam no planeta dezenas de milhões de espécies. Dessas, pouco mais de um milhão foram descritas pela ciência. Ou seja, ainda há muita pesquisa a fazer.

Acredito que nossa biodiversidade só vai ter seu valor precisamente estimado, quando prospectada e estudada de maneira científica e ordenada, deixando as prateleiras de trabalhos científicos da academia para adentrar em nosso cotidiano, em formatos múltiplos, como medicamentos e cosméticos, por exemplo. Mais uma vez, reforço que nunca devemos pensar em vender toneladas e toneladas de matéria prima in natura e sim produtos melhorados, no mínimo extratos padronizados com os quais aumentaremos o valor agregado. Chega de trocarmos "espelhinhos" pelas nossas riquezas. Que possamos começar um novo ciclo no Brasil, o ciclo da biodiversidade.

Mas o que falta para conseguirmos isso? Penso que o que precisamos, e com urgência, são decisões. O Brasil, país do futebol, também é pródigo em cientistas, "os atletas da ciência". Penso que precisamos principalmente que os empresários do setor farmacêutico e cosmético tomem essas decisões. Que os tomadores de decisão atentem para o valor dessa flora.

Afinal, essa ideia não é muito difundida, mas os homens mais descobrem remédios do que o inventam – um levantamento feito por pesquisadores americanos em 2007 mostrou que 60% de todos os medicamentos (moléculas isoladas, modificadas e ou inspiradas nas naturais) introduzidos no mercado nos 25 anos anteriores eram derivados de produtos naturais. É a natureza fabricando medicamentos, como no caso, por exemplo, da tão conhecida aspirina. Poucos sabem, mas ela é originada em ativo do salgueiro. O Tamiflu, descoberto e difundido no combate à gripe suína, é resultado do isolamento de moléculas do anis estrelado.

Somente com atitude e ousadia é que poderemos avançar no setor. Investimentos do setor privado na descoberta de ativos naturais estão nos levando a passos largos rumo a um tratamento inédito contra o câncer – os testes com fitomedicamento produzido a partir de ativo de planta brasileira já estão na fase II de testes em diversos hospitais. A mesma iniciativa conduziu à descoberta de anti-inflamatório e analgésico que deve entrar em estudo clínico ainda neste ano.

Em prol da biodiversidade, que se unam ecologistas, pesquisadores da saúde e empresários. Somente com a conservação das espécies é que poderemos descobri-las e, com esses estudos, nossos profissionais poderão gerar riqueza para o País, já os recursos genéticos presentes no território de cada país são pertencentes a ele e não podem ser explorados sem autorização prévia.

Sejamos otimistas. Como o pré-sal, o uso desses futuros fitomedicamentos e cosméticos só será possível depois que este precioso material jorrar das torres do conhecimento científico e for refinado pelas cabeças pensantes verde-amarelas.

(*) Luiz Francisco Pianowski é pesquisador, presidente do laboratório Kyolab e membro do Conselho Científico da Amazônia.

Fonte: Jornal da Ciência