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Você sabe como funciona a sua memória?

Se compararmos nossa memória a um cômodo fechado dentro de uma casa, poderíamos dizer que a atenção é a chave que abre a porta desse cômodo e permite-nos entrar, seja para guardar ou retirar algo que nos é necessário. Sem a chave, caro leitor, a porta não se abre, você não entra e a memória falha. Não adianta chamar o chaveiro, nem pense em arrombar. É vexame na certa.

Por Marco Antônio Arruda*

memória cérebro

Um compromisso esquecido, algo perdido, um branco total. “O que eu estava falando mesmo?” “Meu Deus, esqueci de ir à padaria?” “Desculpa, não lembro o seu nome!”

Mas não se assuste, pode ser a correria do dia a dia, a dispersão, o excesso de estímulos, as multitarefas, a ansiedade ou o humor. Menos provável que já seja o general alemão a sua espreita, aquele tal de Alzheimer!

Nada melhor do que revermos algumas regras básicas da atenção e memória, baseadas no chamado modelo de Posner, segundo o qual o sistema funcionaria em três módulos distintos: rede de alerta intrínseco (detecção de estímulos ambientais, alarme para a sobrevivência), rede de orientação (conseguir mais informações sobre o estímulo que me permitam decidir o que fazer) e rede de execução (estabelecer prioridades, planejar, controlar impulsos, balancear ações e avaliar os resultados).

Entre tantas evidências científicas, seis medidas práticas podem potencializar nossa atenção e, consequentemente, nossa memória: 1º) As emoções ancoram a atenção; 2º) O significado sempre vem antes dos detalhes; 3º) Evite multitarefas; 4º) Faça pausas, seu cérebro agradece; 5º) Repita para lembrar (memória de curto prazo); e 6º) Lembre para repetir (memória de longo prazo).

As emoções ancoram a atenção, por isso, determinados eventos ocorridos ao longo da nossa existência, ficam para sempre guardados em nossa memória: o primeiro beijo, a queda da bicicleta, o gol do título, a torta da mamãe, aquela música e o perfume de uma flor. Estes estímulos emocionalmente competentes, de várias ordens (tácteis, dolorosos, visuais, gustativos, sonoros e olfativos), quando atraem a atenção pela emoção, ganham lugar definitivo em nossa memória.

Se você precisa se lembrar de alguma coisa, mesmo que corriqueira ou enfadonha, atribua-lhe algum valor emocional. Quer um exemplo? Pois bem, para não esquecer que hoje é seu dia de buscar o pão na padaria, lembre-se que seu filho adora aquele cachorro-quente no pãozinho francês crocante que só você sabe preparar.

Priorizar conceitos

A segunda regra é priorizarmos conceitos, idéias centrais e significados, e só depois nos preocuparmos com os detalhes.

Comece por um teste, leia a sequência seguinte de treze palavras e números, feche os olhos e repita. Está pronto? Então vamos lá: poltrona, pontos, quatro, tapete, doze, óculos, dezessete, coelho, surpresa, cabeça, vermelho, direção e cachimbo.

Difícil? Quantas palavras você se lembrou?

Agora tente novamente, mas com o auxílio da imaginação e de uma cena que associa conceitos e imagens: em dezessete de abril (17 e 04), qual não foi a minha surpresa ao ver aquele coelho sentado confortavelmente na minha poltrona, fumando um cachimbo e usando os meus óculos. Corri em sua direção, tropecei no tapete vermelho e levei doze pontos na cabeça. Memorize essa cena insólita, feche os olhos e repita todas as palavras e números.

E agora? Aposto como seu desempenho melhorou.

Outra técnica é memorizar elementos por contigüidade visual. Explico. Procure visualizar objetos colocados um sobre os outros. Raquete de tênis, cebola, lápis, batata, limão, macarrão e molho de tomate. Imagine a cebola sobre a raquete de tênis, com uma extremidade do lápis sinta espetar a cebola e com a outra uma batata, sobre a batata esprema o limão e por cima de tudo jogue o macarrão e despeje o molho de tomate.

Que delícia, hein?!

Faça o teste, você verá que a visualização dessa sequência ilógica ajuda a criar um todo, uma imagem, uma cadeia de conceitos que é mais facilmente recordada que as partes isoladas.

John Bransford, Professor de Psicologia e Educação da Universidade de Washington em Seattle e nomeado como uma das cem personalidades mais influentes da área de Educação no século XX, em seus estudos destaca a importância da priorização dos conceitos centrais sobre os periféricos nas práticas pedagógicas. Para ele, mais importante do que o estudante saber fórmulas ou listas de fatos relevantes para determinado assunto, é organizar esses conhecimentos em torno de conceitos centrais que irão guiar seu pensamento e instigar a curiosidade, permitindo a expressão livre da sua criatividade.

Comentando sobre a Educação no século XXI, o professor Bransford diz: “Eu acredito que o futuro da Educação é brilhante! Nós estamos começando a desvendar os mistérios do cérebro e como se processa o aprendizado. Nós, hoje, podemos capacitar os professores a utilizar esses conhecimentos para acelerar o processo de aprendizagem tornando essa profissão uma combinação de ciência e arte na criação de um mundo melhor para a humanidade”.

*é médico neurologista e membro da Academia Brasileira de Neurologia.

Fonte: Saúde em Pauta