Ângelo Alves: Egito; embaralhar e dar de novo…

No fim de semana, enquanto as atenções se voltavam para a Europa, mais a Sul, no Norte de África, outros acontecimentos demonstraram que, tal como na Grécia, o grande capital e o imperialismo usam todos os meios para tentar condicionar e até esmagar a vontade popular. O Egito foi a votos para eleger um presidente.

Por Ângelo Alves*, no Jornal Avante!

Os resultados conhecidos até o momento indicam a vantagem do candidato da irmandade muçulmana (Mohammed Mursi) sobre Ahmed Shafiq, o ex-primeiro-ministro de Hosni Mubarak.

Se já é estranho o fato de um dos autores dos massacres na Praça Tahrir poder ser candidato a presidente, os acontecimentos recentes demonstram bem até onde vai a estratégia do imperialismo de dar uma aparência democrática às manobras para manter o seu poder no Egito e na região. Por um lado promoveu-se até à exaustão, e desde o início, a irmandade muçulmana como a “alternativa” ao antigo regime. É, mais uma vez na história, a jogada pelos EUA da cartada islâmica, apostando agora no chamado “islamismo moderado”. Por outro geriu-se todo o processo político de modo a manter o exército egípcio – testa de ferro dos EUA e o verdadeiro “coração” do antigo regime – no “comando das operações”.

A prova desta estratégia que faltava surgiu nos últimos dias. O poder militar tratou de “reequilibrar” o poder e, por via do Tribunal Supremo, invalidou as eleições legislativas e dissolveu a Assembleia Nacional. O Conselho Superior das Forças Armadas chamou a si o poder legislativo, de gestão do Orçamento do Estado e de condução do processo de redação da nova Constituição. O presidente eleito ver-se-á privado de qualquer poder de decisão sobre as forças armadas. Estamos perante um real golpe de Estado comandando à distância por Washington. A Casa Branca tenta disfarçar “exigindo” aos militares que entreguem o poder ao presidente. Mas essa atitude acaba por denunciar a sua estratégia de apostar na divisão de poderes entre a irmandade muçulmana e o exército para continuar a reinar no Egito. Uma coisa é certa. Há setores, entre os quais o PCdoEgito, que não irão aceitar a farsa democrática, como aliás o prova o fato de terem boicotado as eleições presidenciais e a participação eleitoral se ter ficado pelos 49%.

* Ângelo Alves é membro da Comissão Política do PCP