Flip: a literatura não salva da morte, mas distrai

Intitulada "Escritas da Finitude", a primeira mesa da Flip reuniu na manhã de quinta (5) os escritores André de Leones, Altair Martins e Carlos de Brito e Mello para tratar do mais funesto dos temas: a morte.

O tema, além de ser um tabu e um mistério no imaginário humano, pode ser um ponto de partida para falar da vida sob  novas perspectivas. ]

O premiado escritor Toni C. lançou recentemente O Hip-Hop está morto! e, ao contrário do que o título sugere, a obra não só conta a história do movimento, em meio ao suspense de um romance ficcional, como demonstra que o Hip-Hop está mais vivo do que nunca. O cenário de violência e perdas que seus adeptos enfrentam é transformado em poesia e arte.

Já na Flip, os três autores que compuseram a mesa desse primeiro debate,  escolheram abordar em sua produção, direta ou indiretamente, a perspectiva do fim da vida e as consequências disso.

"Dentes Negros", mais recente romance de André de Leones, vai ainda além, e narra não apenas a morte de uma pessoa, mas de toda a espécie humana e a do próprio mundo. Um de seus livros anteriores tinha justamente o título "Hoje Está um Dia Morto".

Leones nasceu em Silvânia, interior de Goiás, cidade que, conta ele, tem um alto índice de suicídio. "Cresceu em mim a necessidade não de me matar, felizmente, mas de criar algo a partir do que eu sentia. Em vez de me matar, escrevo sobre quem se matou. A literatura não salva, mas adia o que inevitável –tudo mundo vai morrer– e nos distrai."

Resfriado e um pouco rouco, o gaúcho Altair Martins, o próximo a falar, brincou que estava na "finitude da voz". Autor de "A Parede no Escuro" (2008), pelo qual ganhou o Prêmio São Paulo de Literatura, e "Enquanto Água" (2011), ele relacionou a morte com o poder de arrebatamento da literatura. "A literatura nos mata constantemente, nos fulmina. Há livros que nos matam duas, três vezes. Há poemas do Drummond que são assassinos eternos."

De fala breve, menos de dez minutos, ele gracejou que exercitava a "finitude do tempo".

Por fim, o mineiro Carlos de Britto Melo, autor de "A Passagem Tensa dos Corpos", relembrou seus primeiros contatos com a ideia de finitude, quando ainda era garoto. Quando visitava os avós em Visconde do Rio Branco, no interior de Minas, era um costume que a morte dos habitantes fosse anunciada em carros de som que passavam pelas ruas. A simples presença desses carros já era um prenúncio de angústia.

"Por mais irônico que possa parecer, a morte não compete ao morto, mas ao vivo. Os vivos é que precisam lidar com isso."

Por Christiane Marcondes com infomações da Folha