PC paraguaio: direita tenta unificar projeto de dominação
Neste domingo (22), o golpe que depôs o presidente Fernando Lugo no Paraguai completa seu primeiro mês. O atual governo, comandado pelo ex-vice-presidente, Federico Franco, está isolado internacionalmente, já que somente Vaticano, Taiwan, Alemanha e Canadá o reconheceram. Para o secretário Geral do Partido Comunista Paraguaio, Najeeb Amado, trata-se de um golpe de classe, perpetrado para unificar a direita do país.
Por Vanessa Silva, para o Portal Vermelho
Publicado 20/07/2012 19:18
O Partido Comunista Paraguaio foi fundado em 19 de fevereiro de 1928. Durante todo esse tempo esteve na ilegalidade, exceto durante os seis meses em que o país viveu sua primavera democrática em 1946. O maior período de desenvolvimento comunista se deu na década de 1940, quando dirigiu a maior parte dos sindicatos operários do país.
De acordo com Najeeb, o Partido vem crescendo no Paraguai nos últimos anos. Ele atribui isso à “linha bastante clara” do Partido com relação ao processo de mudança que teve início no país com a chegada de Lugo ao poder em 2008. O dirigente comunista esclarece que não identifica “o processo de mudança com o governo Lugo”, mas entende que é um percurso “muito mais rico no âmbito dos movimentos sociais e de tomada de consciência popular”.
Portal Vermelho: O Partido Comunista teve uma postura crítica ao governo Lugo porque defendia um aprofundamento da democracia. E considera que o governo dele foi débil com relação a isso…
Najeeb Amado: O Partido Comunista teve uma posição de apoio crítico a Lugo sobre três grandes eixos: a) Defesa da soberania em todos os termos: alimentar, energética, financeira, econômica, política, nacional; b) aprofundamento da democracia; c) reforma agrária com participação popular. (…) Tivemos um apoio crítico a este governo sem abandonar a Frente Guazú. Para nós, o aprofundamento da democracia tem relação com uma ênfase maior na inclusão dos movimentos populares e entendemos que o governo Lugo se posicionou no terreno institucional de um Estado que é oligárquico. (…) Considerávamos que era preciso confrontar a ditadura parlamentar com o movimento popular e o movimento popular foi se distanciando do governo e se desmobilizando por uma série de questões. (…) Há um detalhe importante que é diferente do que ocorreu em outros países sul-americanos. O triunfo eleitoral de 20 de abril de 2008 se deu em um momento de refluxo do movimento popular. Não foi resultado de um processo de acumulação e de unidade por causa do esgotamento do modelo oligárquico e do gerenciamento exercido pelo Partido Colorado…
Portal Vermelho: Então quando Lugo chega ao poder ele já não tinha apoio popular?
Najeeb Amado: Ele nunca foi um líder popular, ele é um bispo que tinha um trabalho próximo aos movimentos populares, sobretudo no [departamento] de São Pedro. Ele é um bispo considerado popular, mediador. (…) Ele era identificado como um elemento de conciliação para avançar um modelo. Para a direita, era para modernizar a gestão de capital, para a esquerda, e setores populares, para comandar uma ruptura com o modelo neoliberal e a possibilidade de uma construção democrático-participativa.
Portal Vermelho: Esse foi um golpe diferente. Como você o caracterizaria?
Najeeb Amado: Foi um golpe orquestrado desde a embaixada norte-americana aliada ao capital transnacional com uma perspectiva preventiva e a intenção de retirar o oxigênio do projeto popular democrático progressista [que vinha sendo implantado] e tentar uma restauração de caráter unitário para seu projeto de dominação. Desde a queda de [Alfredo] Strossner [1954-1989], a direita não conseguiu unificar seu projeto de dominação. E desde 1989 em diante a direita não teve consenso em um processo de dominação que pudesse agrupar toda a burguesia local. Esta é uma tentativa nova, mas que não superou a crise, profunda, que os partidos tradicionais têm enfrentado nos conflitos intra-classes. Daqui a pouco teremos conflitos nas esferas de poder entre as facções da direita.
Portal Vermelho: Se é uma questão de classe, como está a correlação de forças entre os trabalhadores? Algumas pessoas consideram que uma serventia deste golpe seria reunificar os movimentos que estavam fragmentados. O próprio Lugo declarou que este pode ser o melhor momento da esquerda paraguaia…
Najeeb Amado: Esse é o grande desafio: o reagrupamento dos movimentos sociais, dos partidos populares, da esquerda e da militância. A base dos Partidos Colorado, Liberal, Oviedista, Pátria Querida… sente vergonha da forma como foi efetuado [esse golpe]. Essa situação pode ser aproveitada pelo movimento popular para avançar em um projeto de uma nova maioria, trabalhadora, patriótica em um projeto democrático nacional. Esse é o desafio dessa Frente pela Defesa da Democracia: juntar todos os setores descontentes com este modelo republicano que sofre de uma impotência civilizatória na hora de melhorar as condições de vida do povo paraguaio.
Portal Vermelho: E a população está esclarecida de tudo que está acontecendo?
Najeeb Amado: Acho que sim. Nós dizíamos, na sexta [22 de junho] do julgamento político, que o mundo está assistindo a duas realidades no Paraguai: de um lado a que mostra um Congresso Nacional como algo vergonhoso, sem clareza, medíocre. Com uma mostra clara de que eles defendem seus interesses individuais e corporativos. A outra é a mobilização do povo, a intervenção de líderes sociais e políticos de todo o país, explicando com clareza que este é um golpe à democracia e que ser ou não ser luguista não é a discussão, a questão é entender quem esses congressistas, parlamentares representam. A meu ver, ainda falta que esse processo deixe raízes mais profundas, ainda não está totalmente arraigado. Então esse é o desafio que temos.
Portal Vermelho: Nesta conjuntura, como restabelecer a ordem democrática?
Najeeb Amado: A luta em defesa da democracia é a grande plataforma da política em seu sentido mais integral, mais profundo. Se não conseguirmos a restituição de Lugo, temos que continuar a luta contra o golpismo e trabalhar no fortalecimento do projeto democrático popular.
Portal Vermelho: E o Partido Comunista vai concorrer em 2013?
Najeeb Amado: Sim. O Partido Comunista vai apresentar candidaturas a deputados e senadores como parte de uma lista única dentro da Frente Guazú [a eleição de parlamentares no país é feita pelo sistema de listas fechadas].