Obama autoriza suporte da inteligência dos EUA contra Síria
A Agência Reuters demorou a receber autorização para noticiar que o presidente Barack Obama dos EUA aprovou documento de inteligência [1] liberando a CIA para soltar a mão no apoio que dá aos ‘rebeldes’ armados que lutam pela mudança de regime na Síria.
Por Pepe Escobar*, no Asia Times Online
Publicado 15/08/2012 16:53
Agora, qualquer pescador em Fiji já sabe sobre esse “segredo” (para nem falar que todos e mais os vizinhos, na América Latina, também descobriram umas coisinhas sobre as aventuras de mudança de regime da CIA). A Reuters, cautelosamente, apresenta o apoio como “circunscrito”. É palavra-código para “comando por trás dos panos”.
Sempre que a CIA quer vazar alguma coisa, usa escriba de confiança, como David Ignatius do Washington Post. Já desde 187 Ignatius reproduzia seu briefing, [2] segundo o qual “a CIA está trabalhando com a oposição síria há várias semanas, sob orientação não letal (…) Legiões de agentes da inteligência de Israel também operam ao longo da fronteira da Síria, embora guardando máxima discrição."
Que lindo. Quanto de “máxima discrição” alguém consegue manter ao longo das fronteiras da Síria? Instagram de um bando de caminhoneiros sorridentes?
E sobre “máxima discrição” em matéria de Mossad, dizem os especialistas em Telavive que Israel consegue “controlar” o enxame de jihadistas wahhabistas e salafistas linha duríssima que infestam a Síria. Apesar da evidente total piração, um ponto altamente sumário aparece aí bem claro: Israel já se amancebou e anda metida nos panos com islamistas de estilo al-Qaeda.
Isso significa que o Exército-Nada-Livre-Sírio, infestado de Irmãos da Fraternidade “Duro de Matar” Muçulmana e infiltrado por jihadistas salafistas, segue agora não apenas a agenda de seus financiadores e vendedores/doadores de armas – a Casa de Saud e o Qatar – mas, também, a agenda de Telavive, mancomunada com Washington e seus poodles marca-registrada Londres & Paris. Quer dizer: já não se trata de guerra por procuração: agora se trata de guerra por procuração múltipla e concêntrica.
Conheçam o triângulo da morte
A agenda de Telavive é clara: governo sírio enfraquecido; exército desorganizado tipo entra-quem-quer; ódio sectário distribuído a mancheias; e incontido deslizamento rumo à balcanização. A meta geral final: além de Libanização, também a Somalização da Síria e arredores.
A agenda da Turquia permanece inacreditavelmente obscura – exceto pelo delírio desejante de ver a Síria pós-Assad converter-se em versão civilizada edulcorada (o que nunca acontecerá) do reinado do partido AKP em Ankara.
Como o Asia Times Online tem noticiado há meses, a Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) até há pouco tempo dirigia um centro de controle e comando em Iskenderun, na província de Hathay. Recentemente, vazou afinal para a Reuters a notícia de que há uma base “secreta” conjunta turco-qatari-saudita em Adana, a 100 quilômetros da fronteira síria. Adana é onde vive o monstro Incirlik – imensa base da Otan. Fonte local do Asia Times Online tem informado sobre frenético movimento de cargas em Incirlik.
Foi o próprio vice-ministro de Relações Exteriores da Arábia Saudita Abdulaziz bin Abdullah al-Saud quem exigiu, pessoalmente, que a base fosse instalada ali, para delícia de Ankara.
Ankara-Riad-Doha – aí está o triângulo da morte. Mas vem do Qatar, mais uma vez, a conversa que mais decisivamente está “comandando por baixo dos panos”. A Turquia carrega o piano militar: a CIA mantém-se em posição de “não estamos aqui”; e o Qatar só faz tirar fotos de paisagens, como turista inocente (ao mesmo tempo em que comanda operações usando os próprios serviços militares de inteligência). Quem sua a camisa, mesmo, são “intermediários” não identificados.
Obama não autorizou – ainda – a guerra de drones; e a CIA talvez não esteja armando os “rebeldes”; é o negócio do “triângulo da morte”. Inflação de granadas lançadas de foguetes russos compradas no mercado negro é a causa de recentes mega ataques dos “rebeldes” em Damasco e Aleppo. Agora, já se espera inflação de mísseis portáteis antitanque (o atirador apoia a arma no ombro e dispara o míssil). A NBC News já noticiou um “presente” que chegou ao Exército Sírio (Nada) Livre, de quase duas dúzias de mísseis terra-ar, entregues lá por especial obséquio da – e de quem mais seria? – Turquia.
O Qatar e a Arábia Saudita não estão interessados em fazer prisioneiros. Ninguém em Washington parece dar qualquer atenção às lições do Afeganistão pós-Jihad, antes de tomar decisões. Por falar nisso, sim, aí está a Jihad afegã dos anos 1980, tudo outra vez – com Arábia Saudita e Qatar fazendo o papel do Paquistão; o Exército Sírio Livre, no papel dos gloriosos mujahideen (“combatentes da liberdade”); e Obama no papel de Ronald Reagan. Só falta Obama aprovar “memorando de notificação” que autorize Washington a armar os combatentes da liberdade e, em seguida, mandar para lá um enxame de drones.
Aí está receita perfeita para Hollywood criar mais um filme arrasa-quarteirão, para 2013.
Riad, por sua vez, está forçando o rei-de-Playstation da Jordânia a implantar uma zona neutra em seu território para abrigar as mais de 100 gangues de que é composto o FSA – como revelou o jornal al-Quds al-Arabi mantido pelos sauditas. E adivinhem quem era o lacaio que trabalhava para forçar o negócio? Ninguém menos que o evanescido chefe da inteligência saudita príncipe Bandar – que não se sabe se morreu ou não morreu em atentado à bomba há duas semanas (“Where is Prince Bandar?”, Asia Times Online, 2/8/2012, http://www.atimes.com/atimes/Middle_East/NH02Ak03.html).
A Ceifadora Sinistra vence
Vale a pena repetir até que a Ceifadora Sinistra apareça para recolher os restos: vê-se ao largo, chegando, um espetacular tiro gigante pela culatra.
O prolongado sítio de Aleppo, aí, chegando. A “base secreta do CCGOTAN (Conselho de Cooperação do Golfo/Organização do Tratado do Atlântico Norte) na Turquia, armamento pesado, a mancheias para jovens sunitas sírios desempregados, semianalfabetos, nascidos e criados sectários do tipo que vive de matar desertores do exército, criminosos de várias cepas e jihadistas salafistas multinacionais. O vídeo que se vê [3] mostra tudo que é preciso saber sobre o que é e faz o Exército Sírio Livre. E outro vídeo [4] mostra o tipo de “democracia” que querem ter por lá.
Os wahhabistas sauditas querem uma Síria islamista sunita linha duríssima – preenchida com cristãos, alawitas, druzos e curdos na figuração, como cidadãos de terceira classe (ou candidatos privilegiados à degola). Os qataris querem ali um protetorado da Fraternidade Muçulmana.
Os políticos e ‘especialistas’ que constroem as políticas externas do governo Obama devem estar cheirados ou fumados, cheios de crack barato. Só porque se meteram em guerra sem fim nem limites contra, não só o Irã, mas todos os xiitas que vivem por lá… O quê?! O que mais?! Resolveram também apostar tudo numa Somalização da Síria, que inflará a intolerância wahhabista? A Ceifadora Sinistra espera, dentes à mostra, nas coxias.
Notas:
1. 1/8/2012, “Exclusive: Obama authorizes secret US support for Syrian rebels”, Reuters
http://www.reuters.com/article/2012/08/01/us-usa-syria-obama-order-idUSBRE8701OK20120801
2. 19/7/2012, “Looking for a Syrian endgame”, Washington Post, http://www.washingtonpost.com/opinions/david-ignatius-syria-approaches-the-tipping-point/2012/07/18/gJQAFoCvtW_story.html
3. Vê-se em http://www.youtube.com/watch?v=5Pjk1sYEjuU&feature=share&oref=http%3A%2F%2Fwww.atimes.com%2Fatimes%2FMiddle_East%2FNH03Ak04.html&has_verified=1 .
4. 30/7/2012, “Free Syrian Army issues military-led transition plan”, AFP, em http://english.ahram.org.eg/NewsContent/2/8/49062/World/Region/Free-Syrian-Army-issues-militaryled-transition-pla.aspx
*Pepe Escobar é jornalista investigativo
Tradução: Vila Vudu