Capistrano: Abdias Nascimento: Memória Negra

O Brasil é um país que possui grandes figuras que se dedicaram às lutas populares, mas, a nossa historiografia e os meios de comunicação de massa teimam em escondê-las.

Abdias do Nascimento
É o famoso ocultismo da nossa elite. Entre muitas dessas personalidades, que a historiografia e os meios de comunicação tentam ocultar, está a impoluta figura de Abdias Nascimento, um ícone das lutas dos negros.

Garanto que se fizermos uma pesquisa com os alunos e professores de qualquer curso das nossas universidades e perguntarmos quem foi Abdias Nascimento, a maioria dos alunos e grande parte dos professores desconhecem essa extraordinária figura da luta dos negros e dos oprimidos de todo o mundo. Abdias foi um verdadeiro revolucionário, um guerrilheiro na defesa de suas causas, dos seus ideais. Desde muito jovem iniciou o combate contra a discriminação, o racismo e a exclusão social, foi um militante, inteligente e criativo, da luta em defesa da sua raça.

Abdias nasceu no dia 24 de março de 1914 e morreu, aos 97 anos, no dia 25 de maio de 2011. Foram mais de setenta anos dedicados às lutas populares no Brasil e no mundo. Podemos compara-lo aos grandes lideres da causa negra: Luther King, Mandela, Lumumba, Zumbi, Samora Machel, Agostinho Neto, entre outros.

Recentemente foi lançado um belíssimo documentário, intitulado “Abdias Nascimento: Memória Negra”, direção e roteiro de Antonio Olavo. Este documentário retrata a vida dessa grande figura que se confunde, no século 20, com as lutas dos negros e dos excluídos do nosso país. Documentário que no dia 20 de novembro, Dia Nacional da Consciência Negra, deveria ser exibido em todas as escolas, faculdades, sindicatos e nas principais redes de televisão do nosso país. História é cidadania.

Portando, 20 de novembro, é o Dia Nacional da Consciência Negra, data pouco comemorada, dada a importância do negro na nossa história. Essa é uma das mais importantes datas do nosso calendário histórico.

Faço o registro dessa significativa data, lembrando Abdias Nascimento, figura marcante da história do nosso povo. Ele é considerado uma das personalidades importante da luta do povo africano e dos afrodescendentes, aqui no Brasil. Faço, nesse pequeno lembrete, um registro do trabalho de um homem que desde o final dos anos 20 do século passado participou ativamente dos movimentos dos negros em diversas frentes de luta, dando uma grande contribuição, como intelectual, jornalista, poeta, dramaturgo, político, enfim como um grande militante na luta em defesa de um mundo sem discriminação, de um mundo com justiça social e, realmente democrático.

Tenho alguns livros de Abdias Nascimento, mas, peguei como fonte de pesquisa, para esse registro, o belo trabalho de outro grande afrodescendente, Nei Lopes, advogado, sambista e intelectual, um militante da causa negra. Nei Lopes escreveu a “Enciclopédia Brasileira da Diáspora Africana”, livro com 715 páginas, publicada pelo Selo Negro – SP, 2004. É nessa fonte onde fui buscar os dados biográficos do ícone da luta dos negros no Brasil. Na página 468 da Enciclopédia está registrado: Abdias Nascimento, nascido em Franca – SP em maio de 1914, político, artista e escritor. Em 1944 fundou, no Rio, o Teatro Experimental do Negro e no ano seguinte o Comitê Democrático Afro-Brasileiro. Organizou no Rio de Janeiro e em São Paulo a Conferência Nacional do Negro e o 10º Congresso Nacional do Negro Brasileiro, isto em 1948-50. Fundou e dirigiu o jornal Quilombo (1949-50) e o Museu de Arte (1968).

No exílio, nos anos de 1970, foi professor na Universidade do Estado de Nova Iorque em Buffalo, onde fundou a cadeira de Cultura Africana no Novo Mundo e foi diretor do Programa de Estudos Porto-riquenho. Também, foi professor visitante nas universidades de Yale e Woleyano, bem como no Departamento de Língua e Literatura da Universidade de Ifé, na Nigéria, de 1976 a 1977. A partir dessa década, tornou-se presença constante em congressos e fóruns de debates anti-racistas nos Estados Unidos, na África e no Caribe, constituindo-se na primeira voz brasileira a ecoar no cenário pan-africanismo. Em 1980 fundou o Instituto de Pesquisa e Estudos Afro-Brasileiro. Em 1952 coordenou o Terceiro Congresso de Cultua Negra das Américas, foi ainda, deputado federal pelo Rio de Janeiro e suplente de senador do PDT, com a morte de Darcy Ribeiro, em 1997 assumiu a cadeira de senador como titular.

Além de militante político, Abdias escreveu diversos livros que fazem parte de uma importante bibliografia existente sobre a questão do negro, entre os seus escritos podemos citar: Sortilégio (mistério negro), publicado pelo Teatro Experimental do Negro, Rio de Janeiro, 1960; Dramas para negros e prólogos para brancos – antologia de teatro negro-brasileiro, publicado pelo TEN, Rio de Janeiro, 1961; Teatro Experimental do Negro – Testemunhos (organizador do volume), publicado pelo TEN Rio de Janeiro, 1966; O negro revoltado, ed. GRD, Rio de Janeiro, 1968; e o excelente estudo, “O Genocídio do Negro Brasileiro: Processo de um Racismo Mascarado”, editora Paz e Terra, 1978, com prefacio do mestre Florestan Fernandes.

A biografia de Abdias enaltece a sua trajetória de vida. As perseguições e as muitas prisões não lhe tiraram o ânimo, muito pelo contrario, fortaleceram as suas convicções. Portanto, essa história não pode e nem deve ser esquecida, como também, a morte de Zumbi, líder do Quilombo dos Palmares, fato ocorrido em 20 de novembro de 1695 e só recentemente a data do assassinato do líder do Quilombo dos Palmares transformado no Dia Nacional da Consciência Negra, a data do assassinato do líder negro do Quilombo dos Palmares.
 

Antonio Capistrano – ex-reitor da Uern, filiado ao PCdoB