Carlos Lopes: O imperialismo ameaça o Congo
Os países da África Austral decidiram enviar tropas para o Leste da República Democrática do Congo (RDC), visando estabilizar a região do Kivu, onde grupos armados têm levado a cabo ações militares. A força africana, designada Força Internacional Neutra (FIN), será comandada pela Tanzânia e constituída por soldados daquele país e da África do Sul.
Por Carlos Lopes no jornal Avante!
Publicado 15/12/2012 21:53
A decisão foi tomada no sábado, (8), em Dar-es-Salam, pela cimeira extraordinária de chefes de Estado e de governo da Comunidade para o Desenvolvimento da África Austral (SADC), convocada pelo seu presidente, Armando Guebuza, de Moçambique.
No Leste do Congo já se encontra uma força das Nações Unidas, a Monusco, mas a SADC considera que ela apenas garante atividades humanitárias, numa zona em que são reportadas diariamente “mortes, violações e pilhagens, entre outros crimes praticados por grupos armados”. E pede à ONU que altere o mandato desta força, conferindo-lhe “poderes de reação armada direta em caso de ataque”.
A cimeira de Dar-es-Salam reafirmou “a indivisibilidade e o respeito da soberania e da integridade territorial” da RDC, manifestou profunda preocupação em relação à deterioração da situação de segurança e humanitária no Leste do país e “condenou veementemente o grupo M23 e os seus ataques contra as populações civis, as forças de manutenção da paz da ONU e as agências humanitárias, entre outros males”.
O presidente Guebuza afirmou no final da cimeira que “estamos abertos ao diálogo, mas não estamos dispostos a continuar a assistir a pessoas indefesas serem mortas”.
Guebuza revelou que a SADC vai trabalhar em conjunto com a Conferência Internacional dos Grandes Lagos (CIEPD), com a União Africana e a própria ONU em busca de apoios para o êxito da força militar africana.
Por seu turno, o presidente do CIEPD, Yoweri Museveni, de Uganda, considerou que os quase 20 mil efetivos destacados no Congo sob a bandeira da ONU estão a promover uma espécie de “turismo militar”, já que mesmo com a sua presença a RDC continua a ser desestabilizada.
No mesmo dia em que se realizou em Dar-es-Salam a cimeira da SADC, representantes do governo da RDC e do Movimento 23 de Março – o grupo “rebelde” responsável pelas ações de guerra no Kivu Norte – reuniram-se em Kampala, capital ugandesa, para negociar a paz no Leste congolês.
Potências ocidentais apoiam agressão à RDC
Sobre a situação na RDC, a República de Angola, sua vizinha, tem posições claras, que ajudam a compreender melhor o que se passa num dos maiores e potencialmente mais ricos países africanos.
“A situação no Leste da RDC está a ser apresentada pelos agressores como sendo um ataque de ‘rebeldes’. Na verdade é uma invasão externa com fortes apoios nas potências ocidentais, as mesmas que deram força a Uganda e Ruanda. Os grupos armados levam uma bandeira criada à pressa porque parecia mal içarem as bandeiras dos que apoiam a agressão”, escreveu há dias o Jornal de Angola.
Num editorial intitulado “Depois do Sudão, o Congo”, o diário acusa não só os governos ugandês e ruandês mas também “os países ocidentais que apoiam o regime de Paul Kagame” de pretenderem fazer “chegar a Kinshasa” os “rebeldes” e de ameaçarem a paz na região dos Grandes Lagos e até na África Austral.
“Na Líbia foi dada luz verde à Otan para depor o presidente de um país soberano. Na República Democrática do Congo os grupos armados podem derrubar um governo legitimado pelo voto popular e não há problema nenhum. Pelos vistos só interessam os recursos mineiros do Kivu, que de resto andam a ser pilhados há décadas pelos países ocidentais que estão por detrás da atual agressão”, considera o Jornal de Angola.
O jornal denuncia que “o objetivo dos fabricantes de armas é provocar uma guerra nos Grandes Lagos que leve ao desmembramento da República Democrática do Congo”. Acusa a ONU e a Otan, ao fomentar uma nova guerra no Congo, de pretenderem “criar nos Grandes Lagos o exemplo que justifica futuros ataques à soberania de cada estado africano, até apagarem o mapa de África desenhado na Conferência de Berlim”. E defende que “manter as fronteiras herdadas do colonialismo”, ao contrário do que aconteceu recentemente com a divisão do Sudão, “é um compromisso de honra, inviolável e inegociável”.
As novas ameaças que pairam sobre a pátria de Patrice Lumumba evidenciam como o imperialismo continua a dividir para dominar. E a utilizar todos os meios, incluindo a guerra, para recolonizar a África – com a conivência de aliados indígenas – e prosseguir a exploração das suas riquezas e dos seus povos.