Canadá: Restrição migratória, luta estudantil e corrupção em 2012

O Canadá se despede de 2012 com um panorama sociopolítico marcado pela promoção de medidas que dificultam a chegada ou permanência de estrangeiros, casos de corrupção em altos servidores públicos e intensos protestos estudantis em Quebec contra medidas de corte neoliberal.

Durante este ano, o governo conservador do primeiro-ministro Stephen Harper apertou ainda mais as porcas na esfera migratória com o fim de só atrair e deixar no país quem realmente se ajuste a seus requisitos e objetivos traçados sob o argumento de desenvolver a economia.

O ministro do ramo, Jason Kenney, foi alvo das críticas de defensores de direitos humanos, ativistas sociais e especialistas no tema depois de adotar reformas consideradas discriminatórias porque lhe outorgam demasiado poder até para deportar ou negar a entrada a pessoas que, no seu julgamento, não cumprem com as exigências de Ottawa.

As censuras resvalaram no fim das solicitações de residência a pais e avôs de imigrantes e a entrada em vigor da chamada supervisa, um passo visto por muitos como um obstáculo à reunificação familiar e também o começo do fechamento das portas do Canadá.

Esse último documento autoriza várias viagens ao estado do norte durante um período de 10 anos, mas deve ser renovado a cada dois.

No entanto, para ter a permissão os beneficiários devem demonstrar que têm estabilidade financeira em seus países de origem, regressarão quando expire o prazo concedido, pagarão um seguro sanitário de até seis mil dólares e realizarão uma revisão médica sem ter garantias.

Um artigo do jornal canadense O Popular denunciou que a medida faz parte de uma estratégia escondida e gradual das autoridades federais iniciada em 2006 e encaminhada a penalizar a cidadãos de outras nações.

Também neste ano, o Canadá modificou a lei de refúgios e agora o ministro Kenney ou servidores públicos de seu despacho decidem até quando alguém precisa asilo, ainda que tenha residência.

O titular apresentou ao Parlamento uma controvertida legislação para deportar ou frear a chegada de cidadãos estrangeiros com antecedentes penais, apesar das críticas da oposição e de especialistas porque a iniciativa outorga demasiados poderes ao ministro de Imigração.

A Lei para a Rápida Expulsão de Criminosos Estrangeiros acelerará as repatriações de presos sentenciados a mais de seis meses de prisão, elimina os recursos que interpõem os imigrantes acusados supostamente de crimes graves para evitar sua expulsao e aumenta as penas para os que não cumpram as leis.

Além disso, Ottawa exige desde 1 de novembro um exame obrigatório do manejo adequado de inglês ou francês para medir a fluidez oral dos indivíduos que peçam a naturalização.

Os solicitantes devem apresentar antecipadamente provas evidentes de seu conhecimento nas duas línguas oficiais e, se for insatisfatório, estão obrigados a entrevistar um juiz de cidadania para avaliar seu caso.

Para Debbie Douglas, diretora executiva do Conselho de Agências de Serviço ao Imigrante de Ontário, a ferramenta poderia discriminar a pessoas procedentes de países não anglófonos.

Ao mesmo tempo, Naomi Alboim, ex-vice-ministra de Imigração, considerou a proposta contraproducente e previu que trará como consequência a exclusão de uma massa importante de trabalhadores que podem impulsionar a economia nacional com um pouco de assistência federal.

Esses e outros projetos discordam com as supostas facilidades que o Canadá outorga aos imigrantes para enfrentar o acelerado envelhecimento de sua população.

A cada ano, o país recebe ao menos 250 mil estrangeiros em procura de oportunidades trabalhistas e esse setor será responsável por 80% do incremento demográfico em 2031, segundo um recente estudo das empresas Ipsos Reid e Postmedia News.

Outro fato significativo neste ano no Canadá foram os intensos protestos de estudantes de Quebec contra o aumento em 1.625 dólares das matrículas universitárias e a controversa Lei 78, aprovada no dia 18 de maio pelo legislativo provincial e que estabelece restrições para os atos públicos organizados.

Essa última medida obriga a comunicar às autoridades, com ao menos oito de horas de antecedência, a rota das manifestações que incluam mais de 50 pessoas, com risco de fortes multas para os infratores.

Durante vários meses, mais de 170 mil jovens paralisaram essa província com greves diárias, bloqueios de pontes e estradas em rejeição a ambas iniciativas do governo liberal do premiê Jean Charest.

A greve estudantil, a mais longa na história de Quebec, sustentou-se em assembleias de massas frequentes e debates, bem como em mobilizações fora das casas de altos estudos.

A greve teve eco no continente americano e também na Europa. A repressão policial contra o movimento pacífico e as detenções de centenas de escolares com a consequente imputação de cargos criminosos, acordaram a solidariedade da cidadania.

Segundo o site Global Research, milhares de canadenses criticaram a posição das autoridades quebequenses em programas de entrevistas e cartas a vários jornais.

O conflito com os universitários, junto com fortes problemas de corrupção, implicou a derrota dos liberais nas eleições parlamentares do dia 4 de setembro frente ao independentista Partido Quebequés (PQ).

Com uma década no poder, Charest adiantou as eleições no verão com a esperança de reeleger-se, mas seus cálculos fracassaram e a população deu a vitória a Pauline Marois, primeira mulher que chega ao governo do território francófono.

O PQ regressou ao Executivo quebequense justo quando altos servidores públicos da província figuram entre os principais implicados em vários escândalos por corrupção e colaboração com os grupos mafiosos italianos conhecidos como Hells Angels, os clãs Calabresa e Cosa Nostra.

A comissão Charbonneau indaga desde finais de 2011 como essas organizações criminosas conseguiram incursionar e infiltrar-se na indústria da construção de cidades como Laval e Montreal, esta última com fama de ser uma das melhores do mundo por sua qualidade de vida e multiculturalismo.

Sob essa premissa, o comitê entrevistou dirigentes sindicais, engenheiros, advogados, pesquisadores, empresários, políticos e até agentes infiltrados para descobrir contratos ilícitos na construção de calçadas, esgotos e o asfaltado dessas metrópoles.

Ademais procura trazer à luz os financiamentos ilegais feitos a partidos em troca de favores, depois que um ex-chefe da unidade anticorrupção do território declarou que 70% do dinheiro arrecadado por organizações políticas era "sujo".

As pesquisas revelaram a participação do ex-prefeito de Montreal, Gerald Tremblay, em reuniões arranjadas com empresas de construção a fim de pactuar donativos ilegais para seu partido desde 2008, bem como a contabilidade dupla, uma oficial e outra oficiosa, desse agrupamento. Tremblay renunciou de seu cargo e à política em novembro, depois de admitir a responsabilidade total pelos resultados da investigação.

O edil de Laval, Gilles Vaillancourt, seguiu-lhe os passos e demitiu também depois das entradas em suas duas casas, escritório e intervenções em suas contas bancárias como parte da operação anti-corrupção.

Os integrantes da comissão Charbonneau confiscaram vários documentos confidenciais da prefeitura vinculados com o servidor público, com 23 anos no posto. Suas investigações devem concluir no final do ano 2013 e se ficam inconclusas, então deverão ser prolongadas.

*Jornalista da redação América do Norte da Prensa Latina.