Angel Guerra Cabrera: O voo do condor e as ideias revolucionárias

A batalha de ideias adquire uma importância decisiva diante do assalto do grande capital contra as conquistas históricas dos povos e as condições de reprodução da vida no planeta.

Por Angel Guerra Cabrera*

Na América Latina e no Caribe se reflete muito nítidamente como em nenhma outra parte do mundo no século 21 que as lutas sociais fizeram surgir um bloco de líderes e governos que em distintos graus se opõem ao neoliberalismo e fizeram reviver o ideal bolivariano e martiano de unidade latino-americana e caribenha. Estes acontecimentos, catalisados depois da irrupção de Hugo Chávez na cena política (1992), posicionaram nossa região como um interlocutor internacional crescentemente autônomo e influente. Também elevaram a consciência política popular de um modo em que o capital cada vez pode exercer menos a dominação cultural pelos meios tradicionais, como se observa claramente na Venezuela.

Aqui o impacto nos revolucionários do desaparecimento físico do chefe histórico da Revolução jogou por terra os prognósticos da máfia midiática. Longe de espalhar o desalento e a divisão, reforçou-se a unidade e a combatividade do chavismo, que se volta para o objetivo de conquistar para seu candidato Nicolás Maduro uma acachapante vitória na eleição presidencial de 14 de abril. Para o império não resta outro caminho que a desestabilização. Esta foi a análise feita no 10º Encontro de Intelectuais, Artistas e Lutadores Sociais em Defesa da Humanidade que nos días 25 e 16 de março debateu em Caracas o pensamento e a ação de Chávez.

Neste contexto cobra grande atualidade o libro Cuba: revolução ou reforma? (Havana, 2012), livro do ensaísta e jornalista cubano Enrique Ubieta, já que, tendo como eixo o debate cultural em torno da Revolução cubana, a argumentação empregada transcende os límites da Ilha. A cultura contrarrevolucionária – diz o autor – só pode ser entendida a partir de um enfoque global”.

Ubieta desnuda e demole os estereótipos neoconservadores e “pós-modernos”, mostrando a enorme pobreza intelectual, moral e espiritual que abrigam. A partir de uma discussão exaustiva das afirmações do pensamento contrarrevolucionário cubano e internacional, o autor desmonta suas armadilhas, eufemismos e emboscadas semânticas e retóricas. Como explica nas “Palavras iniciais”, não é um livro para objetar pessoas concretas; a polêmica segue o fio condutor da proposta cultural que tenta restaurar o capitalismo em Cuba e os argumentos de seus principais expositores.

Na primeira seção do volume, “O voo do condor: revolucionários versus reformistas”, Ubieta aborda um tema decisivo para compreender a tradição revolucionária cubana: a coincidência entre o necessário e o útil. Explica-nos que o primeiro ato útil depois da independência foi inevitavelmente de justiça: a libertação dos escravos. Nas condições de Cuba, se se queria alcançar a independencia era necessário mobilizar a maioria da população por ese objetivo, o que por sua vez exigia a abolição da escravidão.

As necessidades vitais da população só podiam ser alcançadas a partir de pressupostos éticos, afirma o autor, um princípio que se manteve invariavelmente ao longo da história cubana. Ali reside um antagonismo de primeira ordem com o pensamento da direita nacional, particularmente com a versão atual, mais pragmática e cínica que suas antecessoras, embandeirada da contrarrevolução, nos textos de autores como Rafael Rojas e Carlos Alberto Montaner, para mencionar dois dos mais conhecidos.

Ubieta argumenta como o apego dos ideólogos contrarrevolucionários ao dever ser teleológico se opõe ao ideal martiano de poder ser, a “utilidade da virtude”, que não reduz a verdade ao meramente visível. Este é o “voo do condor”, que pede sacrifício, mas é indispensável ao interesse da pátria. O outro é insectear, vocábulo criado por Martí para qualificar o culto positivista pelos meros dados sem alma e sem horizonte. Insectear conduz inevitavelmente à subordinação aos Estados Unidos pois se se analisa isto a partir do racionalismo frio, como poderia o povo sustentar a independêcia frente a um poder tão formidável?

O novo livro de Ubieta chega em bom momento, quando nossos povos querem voar como o condor e as oligarquias se submetem a fazer isso como insetos.

*Jornalista cubano residente no México

Cubadebate

Tradução: Blog da Resistência www.zereinaldo.blog.br