Greve dos servidores da Saúde do estado de SP ganha força

Cerca de 2 mil servidores da rede estadual de Saúde de São Paulo decidiram manter a greve decretada há nove dias. Em assembleia realizada na manhã desta sexta-feira (10), na Quadra dos Bancários, região central da capital, os trabalhadores denunciaram a política de desmonte do estado adotada nos últimos 20 anos de governo do PSDB.

Por Deborah Moreira, da redação do Vermelho


Quadra dos Bancários, no Centro de S. Paulo, foi tomada pelos servidores estaduais da Saúde/fotos: Deborah Moreira

“A lógica do governo do estado de São Paulo é sucatear, estrangular, deixar o povo em situação precária para justificar a entrega do serviço público à iniciativa privada, transformando o trabalhador público em vilão”, denunciou o delegado sindical de base Ivan Lima de Santana, técnico de farmácia do Hospital do Servidor Público Estadual (HSPE), presente na assembleia.

Os funcionários do Hospital do Servidor decidiram aderir ao movimento grevista desde a terça-feira (7). Ainda de acordo com o delegado sindical, a mobilização no hospital foi responsável pelo fim dos rumores de privatização do local.

“Houve uma tentativa de privatização, a partir de uma PPP[Parceria Público Privada] onde entregariam o hospital e parte do terreno para a iniciativa privada, com uma concessão de 30 anos. O equipamento foi erguido e é mantido majoritariamente pelos servidores, que contribuem mensalmente. Falta investimentos o que demonstra que há a intenção de sucatear o equipamento para depois anunciar a privatização como solução. Mas a mobilização foi forte e o governo recuou, pelo menos temporariamente”, completou Ivan Lima.



Ivan Lima de Santana durante assembleia

Os dados de investimentos que foram feitos desde 2004 que é possível constatar que o governo investe muito pouco na assistência médica da saúde pública, na administração direta, investe mais nas iniciativas privadas, terceirizações e organizações sociais,

De acordo com dados apontados pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), entre 2004 e 2013, sobre a aplicação da Lei Orgânica de Assistência Social (Loas) o investimento na administração direta da assistência médica teve uma variação de 198%, enquanto que nesse mesmo período, a variação do investimento do governo nas organizações sociais foi de 530%.

Segundo avaliação do Sindicato dos Trabalhadores Público da Saúde no Estado de São Paulo (SindSaúde-SP), a greve aumenta a cada dia. O presidente da entidade sindical, Gervásio Foganholi, estimou que entre 50% e 70% dos trabalhadores de 30 equipamentos públicos já aderiram. “A gente acredita que a greve deve chegar ao ápice na próxima semana, com pelo menos 40 equipamentos paralisados”, declarou Gervásio.


Gervásio Foganholi durante assembleia desta sexta (9)

Estão em greve Hospital de Guaianazes, Hospital de Casa Branca, em Araraquara, Hospital Estadual de Presidente Prudente, Hospital Perola Byton, Hospital Brigadeiro, Instituto Emílio Ribas, Hospital Ipiranga, Heliópolis, Hospital de Ferraz e o Hospital de Osasco, entre outros. Tdos os locais mantêm os serviços de urgência e emergência funcionando. As cirurgias eletivas estão sendo remarcadas.

Presentes na assembleia, auxiliares de enfermagem do Hospital Geral Vila Penteado, na Zona Leste da capital, contaram ao Vermelho que vivem em "estado de ditadura". "Ainda existe a ditadura. Pelo menos é o que a gente vive lá no hospital. Eles transferem a gente de lugar se nós contrariarmos o que eles querem, não deixam o sindicato subir no hospital para conversar com os trabalhadores, sem contar que não temos plano de carreira. Tem gente que entra depois de nós que estamos há muito tempo e já ganha mais", desabafou uma delas que pediu para não ser identificada com medo de represália.

Segundo Gervásio, o único aceno do governo é que haveria um estudo sobre o que poderia ser feito com o prêmio de incentivo, que é pago todo dia 25 de cada mês, a partir de verba repassada do governo federal para o governo estadual. O estado pode usar parte dessa verba para complementação salarial. Mas, para a maior parte dos trabalhadores receber é preciso realizar uma avaliação. “Nós exigimos transparência na aplicação dessa verba, que tem sido usada como instrumento de assédio aos trabalhadores. As pessoas que ocupam altos cargos no governo chegam a receber R$ 7 mil em prêmio, enquanto que a maioria recebe míseros R$ 230 e ainda são submetidos a essa avaliação”, explicou o presidente do SindSaúde.

Pauta de Reivindicação

Os trabalhadores reivindicam 32,2% de perdas salariais desde 2008, segundo dados do Dieese, além de vale-refeição de R$ 26,22, quea tualmente é de R$ 8; e outros pontos de anos anteriores como a regulamentação da jornada de trabalho de 34 mil servidores da área administrativa, que desde 1997 têm garantido a redução de 40 para 30 horas semanais, mas, mesmo assim, continuam cumprindo 40 horas. Desde o final de 2012, quando foram implantados os pontos digitais biométricos nos locais de trabalho, para o controle de horas, os trabalhadores estão ainda mais revoltados.

Um exemplo dessa situação é o Complexo Hospitalar do Juquery, que teve todas as áreas desativadas em 2008 só permanecendo o setor da psiquiatria. Dos cerca de 3 mil trabalhadores atualmente somente 300 permanecem no local na área administrativa. "Foi retirada a maternidade, a pediatria e ortopedia, agora só funciona a área psiquiátrica, que é dirigida por uma organização social, ou seja, foi terceirizado. Quem precisar de maternidade, por exemplo, só em Caieiras", explicou a dirigente sindical Jacilene Maria da Silva, de Franco da Rocha.
 
Atualmente a Organização Social de Saúde sob administração da Irmandade Santa Casa de Misericórdia de São Paulo é quem administra o Juquery.

Outro item da pauta é a reestruturação da carreira que, desde 2008, vem sendo discutida e exigida pelo sindicato da categoria. Segundo acordo entre as partes, as alterações para promover melhorias nas carreiras só ocorreu com parte da folha de pagamento. Segundo SindSaúde deveria ter acontecido até julho de 2012.


Holerite de trabalhador da saúde da rede estadual de SP com salário base de R$ 338,40

A auxiliar de enfermagem Rosilene Farias dos Santos da Silva, que há 16 anos trabalha no centro cirúrgico do Hosptal do Servidor, aguarda pela reestruturação. Para poder ter um rendimento compatível com seus gastos, ela acumula muitos plantões por semana. "Eu passo nove horas do dia em casa, por semana. Vivo em função dos plantões. Nosso salário não chega a R$ 1.200 se não fizer plantões. Por isso esperamos pelo aumento de salário e não de plantões e uma perspectiva de subir na carreira", contou Rosilene, que tem curso superior e mora com a filha na Vila Natal, extremo da Zona Sul.

Próxima assembleia

Depois da assembleia desta sexta, que terminou por volta das 13h30, os trabalhadores iniciaram uma passeata que saiu da rua Tabatinguera rumo à Praça da Sé. A marcha foi votada e decidida durante o encontro, que também votou e aprovou a realização de uma nova assembleia, na sexta (17), em frente ao Palácio dos Bandeirantes, no Morumbi.

“Ao contrário do que o governo diz na mídia, ele não está negociando com os trabalhadores. O que existe é uma mesa de enrolação e não de negociação. Estamos sentando para negociar com o terceiro escalão e não há avanços”, lamentou Gervásio.