Albano Nunes: Hiroshima; um crime friamente calculado e dirigido

Ao lançar a bomba atômica sobre as populações das cidades japonesas de Hiroshima, a 6 de agosto de 1945, e de Nagasaki, três dias depois, o imperialismo norte-americano cometeu um dos maiores crimes que a história regista. Trata-se de uma tragédia que não pode cair no esquecimento.

Por Albano Nunes*, no Jornal Avante!

Particularmente quando, perante a crise estrutural profunda em que o capitalismo se debate, vivemos tempos em que avança velozmente o militarismo, se agudizam as contradições entre as grandes potências, se manifesta de modo cada vez mais inquietante a natureza agressiva do imperialismo.

Mas será que, como é frequentemente considerado mesmo entre combatentes da paz, se tratou ‘apenas’ de um ‘crime de guerra gratuito’ dado que, como está historicamente estabelecido, o Japão já estava militarmente derrotado? Pensamos que não. Tratou-se sim de um crime friamente calculado e dirigido, não contra o militarismo japonês, mas contra as forças antifascistas e progressistas de todo o mundo para afirmar os EUA, então o único país detentor da arma atômica, como potência hegemônica no plano mundial. Essa a principal razão da entrada dos EUA na 2ª Guerra Mundial ao lado da URSS. Estava declarada a ‘guerra fria’ mesmo antes de formalmente anunciada por Churchill no seu célebre discurso de Fulton em 6 de março do ano seguinte.

Mas esta monstruosa demonstração de força – a que se seguiram múltiplos planos e ameaças de novo recurso à arma atômica – não conseguiu impedir o fluxo revolucionário que acompanhou (e teve também expressão em Portugal) a derrota do projeto nazi de domínio mundial que o imperialismo norte-americano agora chamava a si. Não impediu o avanço impetuoso da luta libertadora em toda a Ásia, de que o triunfo da revolução chinesa quatro anos depois, em 1 de outubro de 1949, é a principal realização. Não impediu o nascimento de uma nova ordem jurídica internacional assente na Carta da ONU pacífica e antifascista, ordem que tem vindo a ser afrontada e destruída, com a ambição de a substituir por uma outra, totalitária e hegemonizada pelos EUA mas que a luta dos trabalhadores, dos povos e dos países progressistas tem impedido de concretizar em toda a sua extensão. Não impediu o avanço do campo dos países socialistas, avanço que ulteriores derrotas não podem fazer esquecer, e que chegou a estender-se a um terço da população mundial e a alcançar realizações de dimensão histórica. Não conseguiu sequer impedir que a União Soviética, devastada e sangrada por mais de 20 milhões de mortes, se reerguesse a um ritmo vertiginoso e se dotasse ela também da arma atômica, feito de alcance histórico a juntar a tantos outros, que obrigou os EUA a encolher as garras agressivas e abriu espaço ao avanço universal da luta libertadora dos trabalhadores e dos povos.

É certo que o imperialismo conseguiu sobreviver à derrota dos seus círculos mais reacionários e agressivos e que, depois de décadas de grandes avanços das forças do progresso social em que a revolução portuguesa se insere, conseguiu, com as dramáticas derrotas do socialismo, recuperar posições e retomar temporariamente a iniciativa, colocando de novo a Humanidade perante a ameaça de terríveis catástrofes. Ameaça que, embora inscrita na própria natureza do imperialismo, é possível afastar pela ação unida de todas as forças anti-imperialistas e amantes da paz. Mas para isso é necessário vencer primeiro a batalha da memória e contra o revisionismo histórico, batalha decisiva que se encontra hoje no primeiro plano do combate das ideias e da luta de classes.

* Albano Nunes é membro do secretariado do CC do Partido Comunista Português