Chacina da Lapa é tema de audiência da Comissão da Verdade de SP 

A Comissão Estadual da Verdade Rubens Paiva realizou nesta quinta (8) sua 60ª audiência pública, que abordou o polêmico assassinato de três dirigentes do PCdoB na ação que ficou conhecida como Chacina da Lapa –  considerada um epísódio emblemático da violência do regime militar ao Partido.

A ação aconteceu em 16 de dezembro de 1976 e foi coordenada pelo 1º Exército, do Rio de Janeiro, e o 2º, de São Paulo, com participação do Dops paulista, houve ataque a tiros à casa da rua Pio 11, 767, bairro da Lapa, capital. Sem que tivessem tempo de esboçar resistência foram mortos Ângelo Arroyo e Pedro Ventura Felipe de Araújo Pomar. 

A única sobrevivente foi Maria Trindade. Nos laudos oficiais consta que houve resistência. Foram plantadas armas e os corpos foram mexidos para montagem de cena que corroborasse os laudos.

Na véspera da ação, havia sido preso João Batista Franco Drummond, também do Comitê Central do partido que, no processo de torturas do DOI-Codi, conseguiu fugir, mas acabou morrendo ao cair de uma torre de rádio do órgão policial. No laudo oficial, está escrito que ele teria morrido atropelado ao tentar fugir do cerco no bairro de Bela Vista, também na capital paulista, quilômetros distante da Lapa.

Militante histórico

"O caso é um amontoado de mentiras", disse Pedro Estevam da Rocha Pomar, neto de Pedro Pomar, ao citar "as mentiras escandalosas dos laudos". Sobre o caso, escreveu o livro Massacre na Lapa " Como o Exército liquidou o Comitê Central do PCdoB, São Paulo, 1976.

A ação da Lapa, contou Pomar, começou no Rio de Janeiro, após a prisão do dirigente do PCdoB Jover Teles que, em troca de dinheiro e empregos, delatou a casa, onde eram realizadas reuniões partidárias. Para Pomar, não era necessário realizar o que foi descrito por testemunhas como "fuzilaria". A casa estava sendo monitorada há dias, e alguns dirigentes do PCdoB já haviam sido presos na véspera.

Também todos os presos foram barbaramente torturados, tanto em São Paulo como no Rio, para onde foram levados posteriormente, inclusive Elza Monnerat, que contava na ocasião com 63 anos de idade. Pedro Pomar destacou que a ação ocorreu em 1976, quando o general Dilermando Monteiro comandava o 2º Exército, num período já de distensão política. Foi o último ano de ação da ditadura, após as mortes de Vladimir Herzog e Manoel Fiel Filho.

Ele falou sobre a trajetória política de seu avô no Partido Comunista do Brasil , que chegou a ser deputado federal no fim dos anos 1940. Comentou ainda a militância política de Ângelo Arroyo, morto aos 48 anos, e João Batista Franco Drummond, morto aos 34 anos.

Retificação de atestados

Coordenadora da Comissão da Verdade, Maria Amélia Teles também falou sobre Pedro Ventura Felipe de Araújo Pomar, "uma figura admirável", nascido no Pará em 1913. Era um dos maiores intelectuais do partido, disse. Esta visão foi corroborada por Marília Andrade, para quem Pomar era, além de um chefe político, um orientador, um pai.

O atestado de óbito de João Batista Franco Drummond foi contestado pela sua família, que entrou com processo para retificá-lo. Pedem para que a causa mortis seja por tortura e que o local seja mudado para o DOI-Codi. Houve ganho de causa, informou Renan Quinalha, da Comissão da Verdade. Mas o Ministério Público recorreu da alteração da causa da morte, e a questão está ainda pendente.

Gustavo Reis, representante da Defensoria Pública do Estado de São Paulo, informou que em breve haverá reunião sobre os cerca de 150 casos de retificação de atestados de óbito que precisam ser resolvidos.

Fonte: Alesp